Folha de S. Paulo


Arena das Dunas é um dos 10 estádios da Copa com suspeita de corrupção

Se o "7 a 1" virou sinônimo de humilhação no país após a derrota da seleção brasileira para a Alemanha na Copa de 2014, políticos e empreiteiras também se esforçam para deixar legado no mesmo sentido.

Construídos ou reformados para o evento por cifras por vezes bilionárias, os estádios utilizados no Mundial têm aparecido recorrentemente em investigações como instrumentos de que os envolvidos nas obras teriam lançado mão para favorecimento próprio, seja sob a forma de sobrepreços, propinas ou caixa dois.

A denúncia de sobrepreço e pagamento de propina na construção da Arena das Dunas é apenas a mais recente de uma série de investigações que envolvem os estádios do Mundial de 2014.

Dos 12 estádios pelos quais desfilaram times do mundo todo entre junho e julho de 2014, dez já apareceram em investigações recentes de corrupção. As exceções são a Arena da Baixada, do Atlético-PR, e o Beira-Rio, do Internacional.

A Operação Lava Jato encontrou evidências de corrupção em nove dos estádios. Em sua maioria, as suspeitas fundamentaram-se em delações premiadas e materiais entregues por ex-executivos de empreiteiras relacionadas às obras. Na Arena Pantanal, no Mato Grosso, a denúncia partiu do Ministério Público do Estado.

Os valores de supostas propinas e esquemas de superfaturamento variam de R$ 50 mil a quase R$ 1 bilhão, e explicitam que a empolgação em trazer o megaevento para o Brasil nem sempre teve a ver com a alegria popular.

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MARACANÃ (RJ)

Daniel Marenco/Folhapress
Vista aérea do Maracanã, no Rio de Janeiro
Vista aérea do Maracanã, no Rio de Janeiro

Valor inicial: R$ 600 mi
Valor final: R$ 1,2 bi
Suposto valor de propina: no mínimo R$ 30 milhões

Em delações, ex-executivos da Andrade Gutierrez e da Odebrecht falaram em pagamento de propina de 5% do valor da reforma do estádio para o ex-governador do Rio Sérgio Cabral (PMDB). Membros do Tribunal de Contas do Estado também teriam recebido pagamentos ilegais para aprovar o edital de concessão do estádio. Cabral encontra-se preso por denúncias de corrupção, lavagem de dinheiro e outros crimes. Cinco integrantes do TCE e um ex-conselheiro também foram presos, mas já foram soltos

Outro Lado: Cabral diz que manteve "relações institucionais" com a Odebrecht e que manifesta "repúdio ao envolvimento de seu nome com qualquer ilicitude". A Folha não localizou as defesas dos conselheiros do TCE.

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ITAQUERÃO (SP)

Ernesto Rodrigues/Folhapress
Estádio do Corinthians, em Itaquera, na zona leste de São Paulo
Estádio do Corinthians, em Itaquera, na zona leste de São Paulo

Valor inicial: R$ 820 mi
Valor final: R$ 1,08 bi*
Suposto valor de caixa 2 e propina: R$ 3,05 milhões

*Corinthians e construtora divergem sobre o estágio atual de conclusão da obra

Em planilhas, ex-executivos da Odebrecht registraram o pagamento de R$ 3 milhões por meio de caixa 2 para o deputado Andrés Sanchez (PT-SP). Também afirmaram em delação da Lava Jato que R$ 50 mil em propinas teriam sido pagos ao deputado Vicente Cândido (PT-SP) para obter apoio em financiamento do estádio

Outro Lado: Sanchez (PT-SP) e Cândido negam quaisquer irregularidades.

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ARENA DA AMAZÔNIA (AM)

Bruno Kelly/Folhapress
Vista geral da área externa da Arena da Amazônia, localizada em Manaus (AM)
Vista geral da área externa da Arena da Amazônia, localizada em Manaus (AM)

Valor inicial: R$ 515 mi
Valor final: R$ 660 mi
Suposto valor de propina: no mínimo R$ 77,5 mi

Ex-executivos da Andrade Gutierrez dizem ter pago propinas para os ex-governadores do Amazonas Eduardo Braga (PMDB) e Osmar Aziz (PSD). Braga teria recebido 10% do valor investido, e Aziz teria recebido 5%

Outro Lado: Na ocasião, Braga classificou a denúncia de "absurda". Aziz disse sofrer "retaliação" da AG por reprovar aditivos de "mais de R$ 1 bilhão".

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ARENA DAS DUNAS (RN)

Gustavo Dantas/Brazil Photo Press/Folhapress
Vista da Arena das Dunas, em Natal (RN)
Vista da Arena das Dunas, em Natal (RN)

Valor inicial: R$ 350 mi
Valor final: R$ 417 mi
Suposto valor de propina: R$ 7,65 milhões

Investigações da Polícia Federal e do Ministério Público apontam que houve sobrepreço de R$ 77 milhões nas obras da arena potiguar. Segundo a acusação, o ex-ministro do Turismo e ex-presidente da Câmara Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN) e o ex-deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) teriam sido favorecidos com o pagamento de propina disfarçada em doações eleitorais oficiais, entre 2012 e 2014. Alves é suspeito de ter recebido R$ 7,15 milhões em propinas, diretamente ou por meio do diretório Estadual do PMDB do Rio Grande do Norte. Há indícios de ação constante de Alves para dificultar a apuração de irregularidades na obra.

Delatores da OAS também disseram ter pago propina para o senador Agripino Maia (DEM) para que ele ajudasse na liberação de financiamento do BNDES. A OAS teria doado R$ 500 mil ao DEM.

Outro Lado: "Eu, como opositor do PT, que força teria para conseguir liberação do BNDES? Nunca tive acesso ao BNDES (...) [As doações] foram legais e registradas", disse Maia à época.

A defesa de Henrique Alves informou que não vai se manifestar até o momento por não ter informações sobre a operação que envolve seu cliente.

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ARENA PERNAMBUCO (PE)

AFP
Imagem de satélite mostra o estádio Arena Pernambuco, em São Lourenço da Mata (PE)
Imagem de satélite mostra o estádio Arena Pernambuco, em São Lourenço da Mata (PE)

Valor inicial: R$ 529,5 mi
Valor final: R$ 533 mi

Cartel teria acertado que a Odebrecht ficaria com a obra. A operação "Fair Play" da PF também investiga possível superfaturamento. Em 2015, a vice-governadoria do Estado disse que o custo final teria sido de R$ 533 mi. A PF, no entanto, suspeita de superfaturamento de R$ 43 milhões em 2011 –que hoje passariam de R$ 80 mi. Com aditivos pedidos pela construtora, o valor final pode ter sido de R$ 796 milhões –negado pelo governo.

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FONTE NOVA (BA)

Jefferson Bernardes/AFP
Vista do estádio Arena Fonte Nova, em Salvador (BA)
Vista do estádio Arena Fonte Nova, em Salvador (BA)

Valor inicial: R$ 591,7 mi
Valor final: R$ 689,4 mi

Relatório do TCE-BA (Tribunal de Contas do Estado da Bahia) apontou em 2015 a existência de sobrepreço na PPP (Parceria Público-Privada) para reconstrução do estádio. O pagamento de R$ 107 milhões anuais do governo da Bahia ao consórcio foi considerado excessivo. Além disso, ex-executivos da Andrade Gutierrez disseram que a obra ficou com o consórcio da Odebrecht com a OAS devido a combinação entre as empresas no "cartel da Copa".

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ARENA CASTELÃO (CE)

Evaristo Sá/AFP
Vista aérea do estádio Arena Castelão, em Fortaleza (CE)
Vista aérea do estádio Arena Castelão, em Fortaleza (CE)

Valor inicial: R$ 623 mi
Valor final: R$ 518, 6 mi

Segundo o ex-diretor da Odebrecht Benedicto Barbosa da Silva Júnior, a empresa teria pré-acordo para que a empresa Carioca Engenharia ganhasse a licitação do estádio. Além disso, a Andrade Gutierrez informou ao Cade em acordo de leniência que houve formação de cartel nas obras do Castelão. Essas combinações ficaram conhecidas como "cartel da Copa", e teriam ajudado empreiteiras a conseguirem condições mais vantajosas nos projetos

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ARENA PANTANAL (MT)

Joel Silva/Folhapress
Operários durante obras no estádio Arena Pantanal (MT)
Operários durante obras no estádio Arena Pantanal (MT)

Valor inicial: R$ 454,2 mi
Valor final: R$ 646 mi
Suposto valor de propina: R$ 5 milhões

O ex-secretário da Copa Eder Moraes disse ao Ministério Público do Mato Grosso que o ex-governador Silval Barbosa (PMDB) lhe ofereceu R$ 5 milhões para acelerar o processo de contratação da obra -dinheiro que ele diz não ter recebido. Barbosa está preso desde 2015 por investigações de desvios de verbas públicas

Outro Lado: Por meio do advogado Delio Lins Júnior, Barbosa negou a acusação.

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MANÉ GARRINCHA (DF)

Joel Rodrigues/Folhapress
Vista geral do estádio Mané Garrincha, em Brasília, antes de jogo da Copa do Mundo, em 2014
Vista geral do estádio Mané Garrincha, em Brasília, antes de jogo da Copa do Mundo, em 2014

Valor inicial: R$ 745 mi
Valor final: R$ 1,6 bilhão
Suposto valor de propina: no mínimo R$ 32 milhões

Ex-executivos da Andrade Gutierrez afirmam ter pago 1% do valor da obra para os ex-governadores José Arruda (ex-DEM) e Agnelo Queiroz (PT). Eles e o ex-assessor do presidente Temer, Tadeu Fillipelli, foram presos na Operação Panathenaico, que investiga desvios de quase R$ 1 bi nas obras. Eles foram soltos na quarta (31)

Outro Lado: Arruda nega as acusações. Em nota, Queiroz disse que "as afirmações (...) são falsas". A Folha não teve resposta do advogado de Fillipelli.

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MINEIRÃO (MG)

Renato Pizzutto/Xinhua
Imagem aérea do estádio Mineirão, em Belo Horizonte (MG)
Imagem aérea do estádio Mineirão, em Belo Horizonte (MG)

Valor inicial: R$ 426 mi
Valor final: R$ 695 mi
Suposto valor de propina: cerca de R$ 30 milhões

Em delação, Joesley Batista, proprietário da JBS, disse que teria sido orientado pelo governador Fernando Pimentel (PT) em 2014 a comprar 3% das ações do estádio da HAP Engenharia, que integrava o consórcio Minas Arena, que controla o estádio. Segundo Joesley, esse dinheiro seria repassado a Pimentel

Outro Lado: A assessoria de Pimentel classificou a acusação de "leviana e mentirosa" e sem "suporte em provas".


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