Folha de S. Paulo


Mancha perdeu a ideologia com a chegada de pessoas ruins, diz Serdan

Luciano Amarante - 13.fev.2015/Folhapress
SAO PAULO, SP, BRASIL, 13/02/2015: ESPORTE - Paulo Serdan, presidente da Escola de Samba Mancha Verde, é eleito conselheiro da Sociedade Esportiva Palmeiras. (Foto: Luciano Amarante/Folhapress) *** EXCLUSIVO FOLHA***
Presidente de honra da escolha de samba Mancha Verde, Paulo Serdan, em conselho do Palmeiras em 2015

Presidente de honra da escola de samba Mancha Verde e ex-presidente (1992-2005) da torcida organizada Mancha Alvi Verde, Paulo Serdan diz que o clima violento que envolve a torcida atualmente se deve a uma "perda de ideologia". Durante o velório de Moacir Bianchi, 49, um dos fundadores da organizada que foi assassinado com 22 tiros nesta quinta-feira (2), o ambiente era tenso, com diversas "rodinhas" de conversa que não se relacionavam.

"Não tem como negar [que existe uma briga entre facções da organizada]. Os áudios estão circulando, existem os comentários na internet. O que aconteceu foi que a entidade perdeu a ideologia. Já faz alguns anos que pessoas ruins, de má índole, se aproximaram de pessoas da diretoria, e isso foi afastando as pessoas boas", disse à Folha Serdan, que tinha relação próxima com Bianchi.

Ele disse que o amigo estava "ansioso" com reunião que aconteceria na sede da Mancha na quarta (1º) e que trataria dos conflitos na entidade.

"Falava com ele todos os dias. Ele queria levar a paz, queria juntar os diferentes grupos, mas não conseguiu, não deu tempo", completou.

Áudio de Bianchi

Em áudio gravado por Bianchi na segunda-feira (27), ele fala sobre o tema.

"Quero dizer que ninguém quer guerra, queremos nossa torcida de volta. As coisas estão todas erradas, não dão ouvidos para ninguém, não pode falar um 'A' contra que os caras criticam, esculacham, ninguém pode falar um 'A'. Quer dizer que é ditatorial o negócio?", diz.

"Tudo tem conversa. Quero fazer o melhor para não ter uma encrenca. Para que brigar entre nós? Entre próprios palmeirenses? Para, isso não existe, cara. Teve problema [entre faccões da] ZS [zona sul], ZL [zona leste], vamos engolir seco tudo isso aí e começar uma coisa nova", finaliza.

Nesse trecho, Bianchi se refere a uma briga que teria acontecido entre membros da organizada em 12 de fevereiro, na sede do grupo. Alguns pertenciam à sub-sede da zona sul, outros à da zona leste.

Membros da organizada que estavam presentes no velório de Bianchi e não quiseram se identificar falaram de suposto desentendimento da vítima com integrantes da facção criminosa PCC (Primeiro Comando da Capital). Segundo eles, Bianchi queria impedir que eles participassem mais ativamente das decisões da organizada.

No entanto, a Polícia Civil trabalha com duas outras linhas de investigação, deixando uma suposta participação do crime organizado como hipótese menos concreta.

Uma delas é a de que o assassinato pode estar ligado à disputa pelo comando da organizada. Na noite desta sexta, a polícia realizou uma operação de busca e apreensão na sede da Mancha.

Reprodução/Facebook
Mancha anuncia em rede social fim de atividades após morte de seu fundador. Após a morte de Moacir Bianchi, um dos fundadores da Mancha Alviverde, nesta quinta-feira (2), a torcida organizada do Palmeiras anunciou o encerramento de suas atividades por tempo indeterminado.
Moacir Bianchi, um dos fundadores da Mancha Alvi Verde, foi encontrado morto nesta quinta

Outra possibilidade investigada é a de um acerto de contas envolvendo a vida empresarial de Bianchi, ligado a bares e casas noturnas.

À Folha, Serdan ressaltou que seria leviano relacionar as brigas internas ao assassinato de Bianchi. "Não dá para bater o martelo".

Sobre a suspensão das atividades da organizada por tempo indeterminado, ele disse que "se for para continuar do jeito que está, melhor nem voltar, mesmo".

O velório de Bianchi foi realizado no Cemitério Parque Jaraguá, na zona norte de São Paulo, e foi marcado pela solidariedade de rivais e por um clima tenso entre torcedores.

Seus familiares receberam uma coroa de flores de Adamastor, membro histórico da organizada Independente, do São Paulo. Um membro da Gaviões da Fiel também prestou sua solidariedade.

Um membro da Mancha foi expulso do local por outros integrantes que se incomodaram por ele ter atendido a imprensa. Segundo um funcionário do local, o torcedor chegou a ser agarrado pelo pescoço.

Próximo ao horário do enterro, marcado para as 13h, os jornalistas foram informados de que teriam que sair do local a pedido da família.

Bianchi foi enterrado em um jazigo pertencente à torcida organizada.

Mancha Verde

HISTÓRICO

Em 1983, Bianchi fundou a Mancha na companhia de 14 outros palmeirenses. Entre eles estava um de seus melhores amigos, Cleofas Sóstenes Dantas da Silva, mais conhecido como Cléo, morto a tiros em 1988 aos 22 anos diante da sede da organizada.

Em entrevista dada ao portal R7 em 2013, Bianchi enumera dezenas de brigas de que participou. Segundo ele, a Mancha ganhou fama por causa dessa violência.

Ele fez parte de alguns dos momentos mais tensos de atividade da organizada: em 1990, quando torcedores destruíram a sala de troféus do clube após eliminação no Paulista; e em 1995, no Pacaembu, quando torcedores do Palmeiras e do São Paulo se enfrentaram na final da Supercopa de Juniores, deixando 102 feridos e um morto.

Bianchi foi presidente da Mancha entre 1989 e 1990.


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