Folha de S. Paulo


'Le Monde' revela suspeitas de corrupção na eleição da Rio-2016

Um empresário brasileiro teria pago cerca de US$ 1,5 milhão ao filho de um integrante do COI (Comitê Olímpico Internacional) durante o processo de escolha do Rio de Janeiro como sede dos Jogos Olímpicos de 2016. A suspeita de corrupção foi revelada nesta sexta-feira (3) pelo jornal francês "Le Monde".

De acordo com o jornal, a Justiça francesa tem "elementos concretos" que colocariam em questão a integridade do processo de atribuição da sede dos Jogos Olímpicos à capital fluminense. "O Rio teria trapaceado", diz a reportagem do jornal francês.

O jornalista Yann Bouchez, autor da reportagem, afirma que a holding Matlock Capital Group, nas Ilhas Virgens britânicas, que gerenciaria alguns negócios do empresário brasileiro Arthur Cesar de Menezes Soares Filho, teria depositado no dia 29 de setembro de 2009 –três dias antes da eleição do Rio como sede da Olimpíada de 2016–, US$ 1,5 milhão ao filho de Lamine Diack. Na época, ressalta a reportagem, Diack era presidente da IAAF (Associação Internacional das Federações de Atletismo) e membro do COI.

"A Justiça francesa suspeita de manobras destinadas a comprar votos dos membros do COI. Na França, uma investigação preliminar foi aberta em dezembro de 2015 pelo Ministério Público francês, que trabalhava, há alguns meses, sobre suspeitas de corrupção na cúpula na FIA", diz o texto.

MADRI ERA A FAVORITA A SER SEDE

O jornal recapitula todas as votações que levaram o Rio à liderança na corrida pela sede. Madri era a favorita no início do processo, mas, no terceiro turno da eleição, após a eliminação de Tóquio, a capital fluminense bateu a concorrente espanhola por 66 votos contra 32.

Amargurado com a eliminação, o governador de Tóquio, Shintaro Ishihara, chegou a denunciar "uma lógica invisível colocada em prática para atribuir a sede dos Jogos Olímpicos ao Rio". A reportagem aponta ainda que, na época, Ishihara mencionou que o então presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, teria ido a Copenhague, onde a eleição foi realizada, e feito promessas "ousadas" a membros africanos do COI.

"Mais que uma lógica invisível ou promessas ousadas, são duas importantes movimentações financeiras que permitem, anos mais tarde, pensar em irregularidades no processo de eleição", salienta o jornal francês.

Segundo a reportagem, na vasta investigação sobre as suspeitas de corrupção na IAAF, aberta pelo Ministério Público francês em 2015, a análise das várias contas bancárias do filho de Diack, Papa Massata Diack, e de suas empresas, mostrou-se bem-sucedida.

ELEIÇÃO DO RIO COMO SEDE

Documentos transmitidos pelo Fisco americano à Justiça francesa mostraram que no dia 29 de setembro de 2009, três dias antes do voto crucial em Copenhague, a empresa Matlock Capital Group transferiu, de Miami, US$ 1,5 milhão à sociedade Pamozi Consulting, de Papa Massata Diack, em Dakar, no Senegal. No mesmo período, uma transferência de US$ 500 mil, também proveniente de Matlock Capital Group, foi efetuada para uma conta de Diack na Rússia.

A reportagem revela ainda que os investigadores puderam estabelecer que a Matlock Capital Group, holding nas Ilhas Virgens britânicas, gerenciava negócios de Arthur Cesar de Menezes Soares Filho. O jornal salienta que o empresário possui residência em Miami, de onde foram feitas as transferências da Matlock Capital Group.

Proprietário na época do Grupo Facility, que vendeu em 2014, o bilionário brasileiro tinha "excelentes relações", segundo "Le Monde", com Sérgio Cabral, governador do Rio de 2007 a 2014.

"Arthur Soares e Sérgio Cabral se conhecem bem: os dois homens tinham o hábito de se hospedar em suas luxuosas vilas de Mangaratiba, cidade balneária no oeste do Rio", aponta a reportagem, reiterando que ambos estão na mira da Justiça brasileira e que Cabral foi preso em novembro de 2016 pela Operação Lava Jato.

Contatado pelo jornalista Yann Bouchez, Papa Massata Diack apenas respondeu "boa sorte com sua reportagem". O repórter também não conseguiu falar com Arthur Soares.

Já o diretor de Comunicações da Rio-2016, Mario Andrada, respondeu: "A eleição do Rio foi clara: 66 votos contra 32. Foi uma vitória clara. Estamos 200% tranquilos sobre o fato que não fizemos nada fora das regras".


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