Folha de S. Paulo


Presidente da Chape se diz surpreso com apoio e planeja processar a LaMia

Avener Prado/Folhapress
CHAPECÓ, SC, BRASIL, 07-12-2016: Ivan Tozzo, presidente da Chapecoense durante entrevista exclusiva a Folha. Setenta e uma pessoas morreram após a queda de um avião que levava a equipe da Chapecoense, na Colômbia, na madrugada dessa terça-feira (29). (Foto: Avener Prado/Folhapress, COTIDIANO) Código do Fotógrafo: 20516 ***EXCLUSIVO FOLHA***
Ivan Tozzo, presidente da Chapecoense, durante entrevista à Folha

Ivan Tozzo, 62, tornou-se presidente da Chapecoense de forma inesperada e da pior maneira possível.

O empresário assumiu o cargo após a morte de Sandro Pallaoro, 50, que estava no avião que caiu e vitimou 71 pessoas, incluindo 19 atletas e 24 membros da delegação da equipe catarinense.

Com semblante cansado e sem conseguir esconder as noites mal dormidas desde o dia 29 de novembro, o dirigente recebeu a Folha.

Contou que desistiu da viagem dois dias antes do embarque para a Colômbia. "Meu nome estava na relação, mas no sábado avisei que não iria mais. Não tive pressentimento. Apenas não estava me sentindo bem."

O dirigente afirmou que o clube vai processar a LaMia, empresa boliviana que transportava a delegação para a Colômbia. Ele pretende concorrer à presidência na eleição marcada para o dia 20.

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Folha - Como estão sendo esses dias após a tragédia de Medellín?
Ivan Tozzo - Muito difícil. Ainda não fui na minha empresa. Fiquei aqui na sede resolvendo problemas. Eu e meus companheiros de diretoria estamos trabalhando bastante. Tivemos muitas coisas para resolver. E para ser sincero ninguém está preparado para resolver tantas questões e tantos problemas que aconteceram neste período. A gente não tinha ideia, não sabia como tinha que fazer a cerimônia, mas várias pessoas nos ajudaram. Tínhamos uma família aqui que era impressionante. Na terça-feira, quando fizemos a primeira reunião após o acidente, você só via as cadeiras vazias. Dói demais.

Onde o senhor estava no dia do acidente? Como recebeu a notícia?
Eu estava em casa dormindo e recebi a notícia por volta das 3h20. Recebi a ligação da nossa funcionária da sede, que me ligou apavorada. Deu um branco, fiquei paralisado, parecia que eu estava sonhando. Corremos para a sede e decidimos abrir o estádio, o vestiário e chamar as pessoas. Os familiares começaram a chegar por volta das 6h30, 7h. Foi um desespero.

Por que o senhor não viajou?
Tínhamos combinado de viajar para ver a final. Desde o primeiro jogo contra o San Lorenzo [semifinal], acertamos isso. Fizemos uma grande festa na Argentina e queríamos repetir na Colômbia. Tenho certeza de que iríamos ganhar o jogo. Nosso time estava muito focado. A comissão técnica, a diretoria e a torcida. Meu nome estava na relação, mas no sábado avisei que não iria mais.
Não tive pressentimento. Apenas não estava me sentindo bem. Liguei para a minha mulher [Rosana] e avisei que ia passar o final de semana com a família. Deus está levando estas pessoas porque são vencedores. Estamos ficando aqui para cumprir a nossa missão.

Como está acompanhando o caso da LaMia, que é investigada por suposta responsabilidade no acidente do avião e pode até decretar falência?
Nós fizemos um contrato baseado na lei e obrigando eles [LaMia] a fazerem um seguro também para viagem, que foi constatado no contrato. O contrato é de até U$$ 50 milhões de dólares. O voo foi contratado dia 24 ou dia 25 e a viagem estava programada para o dia 28. Não tivemos ainda a oportunidade de checar se eles fizeram o pagamento desta apólice, deste contrato. O nosso contrato tem essa cláusula.
Agora, ficamos preocupados com essa possibilidade de eles estarem falidos e não terem pago esta apólice. Temos uma equipe de procuradores federais para tratar desta parte jurídica. Eles vão fazer essa investigação toda. Temos o contrato assinado e tudo documentado.
Temos essa preocupação, mas nosso clube está bem organizado, foi tudo bem feito na questão da apólice de seguro. Vamos processar eles [LaMia] com certeza.

O senhor tinha o sonho de assumir a presidência da Chapecoense? Pretende continuar?
Nunca tive a pretensão de ser presidente. Tive várias oportunidades, mas nunca quis por conta do meu trabalho. Tenho empresa familiar e sempre procurei priorizar nossas empresas. Sempre ajudei a Chapecoense, mas nunca sendo a principal peça por causa do tempo.
Fui patrocinador do clube em 2009 na Série D, patrocinador na Série C, depois na Série B. Quando chegamos na Série A as partes de valores ficaram mais sérias e tivemos patrocinadores maiores, como a Caixa Econômica, a Aurora.
Se os meus colegas me aceitarem, eu continuo. Existe uma eleição e temos 200 conselheiros. Se fechar com o que eu penso, vamos ficar com a meta por mais dois anos.

Quais as maiores dificuldades que o senhor acha que o clube vai encontrar?
Passamos pelas maiores dificuldades já. Agora, a tendência é diminuir um pouco. Não podemos errar na comissão técnica, quem vamos contratar. Temos que acertar para continuar com o time forte que Chapecó merece. Temos uma responsabilidade muito grande em acertar.

Como está sendo feita a reestruturação da equipe?
Estamos formando agora a comissão técnica, o departamento de futebol. Aí sim vamos tentar formar o time de novo. O Nivaldo [ex-goleiro do clube] está certo. Ele vai trabalhar como diretor de futebol sendo a segunda pessoa deste departamento. O Levir Culpi se prontificou para ser o treinador. Temos quatro, cinco nomes que estamos analisando. A definição ocorrerá até sexta-feira (9).

Como o senhor vê a solidariedade dos clubes para ajudar a Chapecoense?
Se for desta maneira que a CBF afirmou, dos clubes emprestarem os jogadores sem custo, acho uma atitude fantástica. Vamos analisar a lista porque pode ter cinco laterais e vamos precisar de apenas dois. Desde já agradecemos à CBF e aos clubes por essa solidariedade com a gente.

A Chapecoense vai aceitar imunidade contra o rebaixamento no Brasileiro que foi proposta pelos clubes?
Não. O objetivo de não aceitar é porque a disputa esportiva não é uma luta fora do campo. Não seria adequado moralmente exigir que os clubes mantivessem a gente sem disputa. Não se trata de arrogância. É uma forma de reconhecemos que as outras equipes não têm obrigação de deixar a gente na Série A. Não precisam fazer esse favor. Se a gente perder, vamos cair. Se a gente ganhar, vamos ganhar e seguir.
O que precisamos agora é de apoio financeiro. A disputa esportiva é sadia e não uma luta de vida e morte. Se perdermos, não tem sentido a gente ficar na Série A do Campeonato Brasileiro. A vaga tem que ser conquistada dentro de campo.

Esperava essa solidariedade mundial em torno da Chapecoense?
Não imaginávamos, não esperávamos. Não tínhamos essa dimensão do tamanho da Chapecoense no Brasil e no mundo. O povo hoje é solidário e está nos ajudando bastante. Se prontificando a ajudar. Se pudéssemos agradecer todas essas pessoas eu faria. O povo colombiano foi nosso irmão. A Colômbia é irmã do povo brasileiro e de Chapecó.

Com que receitas o clube pretende trabalhar em 2017?
O projeto nosso sempre foi de ser mais forte. Vamos ter mais receita em virtude dos campeonatos que vamos disputar. Imaginamos que vamos fazer um belo contrato com Rede Globo [atualmente é de R$ 28 milhões por ano] ou ter um reajuste. Na realidade, precisamos que todos os patrocinadores nos ajudem para formar um time porque perdemos todos os nossos valores em negociações a que tínhamos direito. Desse grupo que perdemos, vários jogadores estavam apalavrados com outros clubes e teríamos uma fonte de receita importante.
Para continuarmos como time da Série A vamos precisar de dinheiro. Nós somos um time grande. Somos um time novo e grande. Tem os times grandes antigos. Precisamos que eles [Globo] nos olhem melhor porque temos retorno. A Chapecoense vai crescer bastante em termos de mídia. Muita gente está olhando para a gente.

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RAIO-X Ivan Tozzo

Nascimento: 24.out.1954 (62 anos), em Chapecó (SC)

Profissão: Empresário. É proprietário de concessionárias de revenda de automóveis e do Grupo Tozzo, empresa de atacado distribuidor no ramo de alimentos, bebidas, higiene pessoal e agropecuária

Outros cargos no clube:
> Tesoureiro (2008-2011)
> Vice-presidente (2012-2016)

Acidente em voo da Chapecoense


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