Folha de S. Paulo


Idosos, crianças, bebê: palmeirenses se aproximam de fim do jejum de 22 anos

O título que o Palmeiras pode conquistar neste domingo (27) representará mais do que o fim do intervalo de 22 anos sem levantar o troféu do Brasileiro.

Para o palmeirense, significará o término de duas décadas de angústia, ao longo das quais seus rivais paulistas ganharam pelo menos duas vezes o torneio.

Tanto tempo de jejum afetou os milhões de torcedores de diferentes formas.

Os mais velhos, como Mário Perricci, 71, italiano da comuna de Monopoli, no sul do país, e morador de São Paulo desde 1954, viverão o reencontro com as glórias. Perricci verá o clube do coração erguer uma taça do Brasileiro pela nona vez na vida. Ele testemunhou os dois títulos da Taça Brasil (1960 e 1967) e dois do Torneio Roberto Gomes Pedrosa (1967 e 1969), além dos quatro Brasileiros (1972, 1973, 1993, 1994).

Desde 2010, a CBF unificou as conquistas de torneios nacionais realizados na década de 1960 com as do Campeonato Brasileiro, batizado assim a partir dos anos 1970.

"O que mais me marcou foi o de 1994. Demos o troco no Viola depois que ele imitou um porco em 1993", diz Perricci com seu sotaque marcado.

Ele conta que em seus primeiros anos no Brasil só ouvia falar do Corinthians, que conquistou o Paulista IV Centenário em 1955.

Em uma de suas incursões ao estádio, foi ver o duelo entre o time alvinegro e o São Paulo. No momento do gol corintiano, sua vibração foi interrompida por um soco, e então o apreço por outro time passou a ser cultivado.
"Meu tio me deu um soco na barriga e falou 'italiano aqui no Brasil tem que ser Palestra'. A partir dali comecei a saber quem era aquele tal Palestra e me apaixonei", conta o aposentado.

Para comemorar mais uma taça, Perricci torce por ao menos um empate do Palmeiras contra a Chapecoense. Caso o confronto entre Flamengo e Santos termine empatado, o Palmeiras pode até ser derrotado que leva o título. Um revés do time da Baixada também é suficiente.

Mas depender dos resultados de outras partidas nem passa pela cabeça de Maria Eduarda Nepomuceno, 7. Ela nunca viu seu time -que aprendeu a amar com o incentivo do pai, Edgar- ser campeão do Brasileiro.
"Vai ser 3 a 0. Dois gols do Dudu e um do Gabriel Jesus", projeta a menina, barrada pela Polícia Militar no último confronto do clube, diante do Botafogo, por tentar entrar no estádio com o rosto pintado.

"Duda" vai entrar em campo neste domingo ao lado de seu ídolo Dudu.

Pode ser a redenção para Duda e demais crianças com idades próximas, que viveram toda suas vidas no vácuo de títulos do Brasileiro. Nos últimos sete anos, o Palmeiras conquistou a Copa do Brasil em 2012 e 2015, mas amargou um rebaixamento e reincidiu em brigas contra o descenso. Os rostinhos de crianças chorando viraram um clichê palmeirense nas transmissões de TV.

Fabio Yamaji, 42, cineasta, reconhece o período tortuoso, mas garante que a seca da década de 1980 foi pior.

"Nesse período [sem o Brasileiro] ainda conquistamos títulos como o Paulista e a Copa do Brasil. Em 1980 não conquistamos absolutamente nada. Apesar de termos sido rebaixados em 2002 e em 2012, o jejum é bem menos doloroso atualmente", defende Yamaji, descendente de japonês que italianiza o sobrenome em sua camisa do time: "Yamaggio".

Presença certa nas arquibancadas do Allianz Parque, Mayara Cardoso trocará o "Parabéns para Você" pelo hino do Palmeiras e os cantos de apoio que os torcedores carregam na ponta da língua. Ela comemorará seu aniversário de 25 anos assistindo a Jailson, Moisés, Gabriel Jesus e os demais tentando garantir que ela tenha um aniversário antológico.

"É o melhor presente que qualquer palmeirense pode ganhar. Depois de tantos anos é ainda mais especial".

Já Samuel de Lucena David, de apenas dez meses, começa sua vida com privilégio que poucos palmeirenses tiveram recentemente. Assim como o clube, que nasceu campeão no ano em que deixou de usar o nome Palestra Itália e passou a se chamar Palmeiras, em 1942, "Samuca" -quando entender melhor o significado do futebol- poderá se orgulhar de ter nascido no ano em que seu time chegou ao topo do mais importante torneio do futebol brasileiro.


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