Folha de S. Paulo


Investigação do MPF acha mais indícios de fraudes na CBDA

Além da acusação por improbidade administrativa em licitação para compra de artigos esportivos, que levou a pedido de afastamento e bloqueio de bens da cúpula da entidade, o MPF (Ministério Público Federal) apurou outras contratações suspeitas que envolvem a CBDA (Confederação Brasileira de Desportos Aquáticos) não divulgadas na ação inicial.

A maioria dos contratos é assinada pelo presidente da entidade, Coaracy Nunes.

De acordo com relatório da procuradoria obtido pela Folha, as investigações detectaram falta de contratos que comprovem prestação de serviços, notas fiscais sequenciais e diferenças significativas entre orçamentos para compra de passagens aéreas.

Um dos pontos recai sobre a contratação da empresa Big Midia para prestação de serviços de informática por meio de dinheiro advindo do patrocínio com os Correios.

Patricia Stavis/Folhapress
SÃO PAULO, SP, BRASIL, 02-07-2010: Coaracy Nunes Filho, da Confederação de Desportos Aquáticos, durante o evento
Coaracy, da Confederação de Desportos Aquáticos, durante evento no Clube Pinheiros, em São Paulo

A Big Midia, sediada em Belo Horizonte, foi contratada para dar suporte e fazer manutenção e hospedagem dos sistemas de informática da CBDA. Para isso, recebeu pagamentos mensais superiores a R$ 80 mil entre outubro de 2014 e março de 2015.

O Ministério Público aponta que, dado o fato de haver 13 notas sequenciais –duas em outubro, cinco entre novembro e dezembro e seis entre janeiro e fevereiro daqueles anos–, a confederação seria cliente única da Big Midia.

"Não encontramos contrato de prestação de serviço firmado entre as partes", disse a procuradoria no relatório.

Ela também não achou contrato que vincule a CBDA à VOX Sports Marketing e Entretenimento, que recebeu por serviços de assessoria de marketing –pagos com verba de patrocínio dos Correios.

De janeiro a junho de 2015, a empresa, aberta em setembro de 2013, recebeu seis pagamentos de R$ 10 mil –também com notas sequenciais.

O relatório apontou que um dos sócios da VOX é Bruno Beloch, genro do ex-presidente da Confederação Brasileira de Vôlei Ary Graça.

Os procuradores apontaram suspeitas que envolvem a agência de turismo Roxy. A empresa venceu licitações da CBDA para serviços de passagens, hospedagem e transporte, mas com valores supostamente superfaturados.

O MPF afirmou no relatório que duas das concorrentes em editais (Mundi Tour Viagens e F2 Viagens) não possuem sites e os telefones que constam na internet não pertencem às empresas.

Procurou, então, a mesma Roxy, que fez novas cotações para quatro eventos em 2014. Todas tiveram valor inferior aos apresentados pela CBDA; as diferenças variaram entre R$ 3 mil e R$ 24 mil. O Ministério Público também pediu preços a outras agências, que forneceram valores menores.

PETIÇÃO INICIAL

Essas apurações não constam da ação inicial ajuizada nesta quarta (21) pela procuradora Thaméa Danelon Valiongo, que dispunha acerca de fraude na compra de equipamentos destinados a atletas, de convênio com a União.

"(...) não foram apenas os ilícitos tratados nessa inicial que foram praticados pelos dirigentes da CBDA, diversos outros foram cometidos juntamente com inúmeras empresas e pessoas físicas", disse a procuradora na peça.

Pelo processo inicial, R$ 1,2 milhão relativos ao convênio foram pagos a empresa (Natação Comércio de Artigos Esportivos) em cujo endereço de registro, na zona oeste de São Paulo, está instalado, na verdade, um pet shop.

A procuradoria pediu afastamento e bloqueio de contas de Coaracy Nunes e Sérgio Ribeiro Lins de Alvarenga, presidente e diretor financeiro da CBDA, e de outros.

Eduardo Anizelli/Folhapress
SAO PAULO, SP, BRASIL, 21-09-2016, 17h20: Fachada do Pet Shop Amistad, que fica na rua Pio XI, em Pinheiros. O MPF-SP pediu nesta quarta-feira o bloqueio de bens e o afastamento do presidente da CBDA (Confederacao Brasileira de Desportos Aquaticos), Coaracy Nunes, e outro dirigente por falcatruas. Na mais grave delas, esta a vitoria de uma empresa em licitacao sobre fornecimento de equipamentos chamada Natacao. No local onde ela supostamente funciona, porem, esta este pet shop. (Foto: Eduardo Anizelli/Folhapress, ESPORTE)
Fachada do Pet Shop Amistad, que fica no endereço onde deveria estar empresa de material esportivo

OUTRO LADO

As empresas citadas na investigação do Ministério Público Federal negaram qualquer irregularidade e afirmaram que possuem contratos que detalham a prestação dos serviços para a CBDA.

A empresa de informática Big Midia negou ser cliente única da confederação e enviou à reportagem notas fiscais de serviços prestados a outros clientes.

"Mantemos um sistema de controle de incidentes, onde são registrados todos os atendimentos prestados à CBDA e todos os envolvidos", disse.

A Big Midia diz também que foi registrada em 2007 e apenas fechou contrato com a CBDA apenas em dezembro de 2009. A companhia diz ainda que em nenhum momento foi intimada a apresentar nenhum documento ao MPF e que está a disposição para qualquer esclarecimento.

A empresa VOX Sports Marketing e Entretenimento, que foi paga pela CBDA por serviços de assessoria de marketing, afirmou possuir, além de documentos, "uma série de evidências" que comprovam a prestação dos serviços.

A companhia diz ainda que não existe relação entre a empresa, a CBDA e o ex-presidente da Confederação Brasileira de Vôlei Ary Graça.

A CBDA, por sua vez, disse já ter comentado sobre a acusação feita pelo MPF.

Na quarta (21), o presidente da entidade, Coaracy Nunes, afirmou por nota que o inquérito tem "cunho eleitoreiro" e que a entidade "seguiu rigorosamente" a lei que dispõe sobre licitações.

Questionada sobre contratos investigados e não divulgados na ação inicial do MPF, a CBDA ainda não respondeu à reportagem.

Em contato com a Folha, funcionário da agência Roxy disse que os responsáveis pela empresa não poderiam falar com a reportagem.


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