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De atleta olímpico a presidente da Fifa; veja a trajetória de Havelange

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João Havelange como atleta olímpico, à esquerda; à direita, ao lado do ex-genro Ricardo Teixeira; abaixo, acompanhado por Carlos Arthur Nuzman e Pelé
João Havelange como atleta olímpico, à esquerda; à direita, ao lado do ex-genro Ricardo Teixeira; abaixo, acompanhado por Carlos Arthur Nuzman e Pelé

João Havelange foi o homem-forte do futebol brasileiro por 16 anos. O ex-presidente da Fifa morreu nesta terça-feira (16) aos 100 anos, no Rio de Janeiro.

Esteve à frente da CBD (antecessora da CBF) na conquista do tricampeonato mundial da seleção brasileira (1958, 1962 e 1970) e na criação dos primeiros torneios nacionais entre clubes.

Chegou ao poder em janeiro de 1958, aos 41 anos, e saiu em 1975, com 58, poucos dias antes de completar seu 17º ano no comando. No final da sua gestão já acumulava o cargo mais alto na Fifa, um dos motivos da sua saída da CBD.

O caminho para o poder da entidade teve início com a presidência da Federação Metropolitana de Natação, no Rio, no começo da década de 1950. Antes, já havia sido diretor de Esperia e Botafogo, além de presidente da Federação Paulista de Natação.

Diferentemente da CBF, que cuida exclusivamente de futebol, a CBD era responsável, na época, por 23 modalidades. O trabalho na federação rendeu uma indicação ao COB (Comitê Olímpico Brasileiro) em 1955, mesmo ano em que virou vice da CBD, na gestão de Sylvio Pacheco.

Cronologia - Havelange

Havelange, inclusive, havia apoiado Pacheco na eleição da entidade. Três anos depois concorreu à presidência e ganhou.

Durante a chamada era Havelange, o cartola foi apontado como responsável por modernizar a entidade e gerenciar seus recursos financeiros. Nesse período, fez empréstimos e se aproximou das lideranças do país. E o futebol sempre foi o carro-chefe.

Para a disputa da Copa de 1958, Havelange inovou ao colocar o empresário Paulo Machado de Carvalho como chefe de delegação. Deu certo. Com uma preparação inédita, o Brasil faturou a taça pela primeira vez.

O sucesso foi repetido em 1962 e 1970, em parte devido às estrelas presentes no futebol nacional, como Pelé (tri com a seleção) e Garrincha (bi em 1958 e 1962). Somente no Mundial de 1966 Havelange veria a seleção fracassar, quando a pré-lista teve 47 convocados.

Os clubes também tiveram o calendário incrementado, com o início de torneios nacionais.

O pioneiro foi a Taça Brasil, em 1959. A partir de 1969 se apossou da organização do Torneio Roberto Gomes Pedrosa, que, desde 1967, era uma extensão do Rio-São Paulo. Em 1971, criou o Campeonato Brasileiro, que segue em disputa até hoje.

Até por isso Havelange teve participação importante na unificação dos títulos de campeão brasileiro de 1959 a 1970 pela CBF, então sob o comando de Ricardo Teixeira.

Foi também durante a era Havelange que os clubes brasileiros venceram pela primeira vez a Taça Libertadores e o Mundial interclubes. O Santos, bi em 1962/1963, foi o pioneiro.

Foi reeleito cinco vezes para o cargo, mas sua última gestão ficou marcada pela eleição para a presidência da Fifa, em 1974. Já havia tentado se candidatar duas vezes em 1963 e 1971, mas não pôde concorrer ao cargo.

Em 1963, virou membro do COI (Comitê Olímpico Internacional). Ficou no posto por 48 anos, renunciando no final de 2011 por problemas de saúde.

A saída foi entendida como uma medida para evitar uma possível expulsão do Comitê. Havelange era investigado por supostamente receber propina de US$ 1 milhão (cerca de R$ 1,7 milhão na época) da ISL, antiga parceira comercial da Fifa.

Até Havelange, o máximo que um dirigente havia comandando a CBD tinha sido por cinco anos. Depois dele, Ricardo Teixeira tornou-se recordista, com 23 anos consecutivos no cargo. Entrou em 1989, apoiado por Havelange, e saiu em 12 de março de 2012. Na ocasião, Havelange era sogro de Teixeira.

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João Havelange em diversos momentos da carreira; clique na foto e veja galeria
João Havelange em diversos momentos da carreira; clique na foto e veja galeria

CARREIRA NA FIFA

Havelange ganhou a eleição para presidência da Fifa em 11 de junho de 1974, dois dias antes do início da Copa do Mundo da Alemanha. Ele superou o inglês Stanley Rous, no cargo desde 1961.

Em 1974, o britânico tinha apoio das federações europeias, mas o brasileiro conseguiu seduzir os sul-americanos, asiáticos e africanos com as promessas de desenvolver o futebol ao redor do mundo e organizar um torneio para os jogadores mais jovens, algo que se tornou realidade em 1977, quando aconteceu o primeiro Mundial de Juniores.

No entanto, a grande carta na manga de Havelange era a ampliação dos participantes da Copa do Mundo. Em vez de 16 equipes, a competição passaria a ter 20, o que beneficiaria sua base eleitoral. Porém, o aumento só ocorreu na Copa de 1982. Na Espanha, 24 seleções disputaram o torneio, superando a ideia original do dirigente.

Para o Mundial de 1986, escolheu de forma polêmica a Colômbia como sede, mas as dúvidas em relação à economia do país pouco antes da realização levaram o torneio para o México. As duas Copas seguintes tiveram a mesma quantidade de seleções.

Só em 1998, ano em que Havelange deixou a Fifa para a entrada do suíço Joseph Blatter —que ficou no comando até o ano passado—, a Copa adquiriu seu formato atual, com 32 equipes.

Além dessas mudanças, o brasileiro levou o torneio a lugares incomuns até então. A já citada Espanha, Estados Unidos e Argentina não haviam sediado a competição antes do mandato de Havelange.

A Argentina, inclusive, recebeu o evento mesmo sob o comando da ditadura militar do general Jorge Videla, que soube utilizar a Copa a favor de seu governo.

Com a ampliação da Copa do Mundo, Havelange também transformou a Fifa em uma das maiores multinacionais. Na década de 1980, atraiu poderosos patrocinadores (como a Coca-Cola) e a venda dos direitos de transmissão dos Mundiais passou a ser o grande trunfo financeiro da entidade.

Após deixar o comando da entidade, virou presidente honorário.

CARREIRA COMO ATLETA

Havelange começou a carreira esportiva no Fluminense, onde foi zagueiro e campeão pela equipe de futebol juvenil em 1931.

Nove anos depois, formou-se em Direito. Simultaneamente à graduação, passou a praticar esportes aquáticos profissionalmente.

Ex-nadador e jogador de polo aquático, ele disputou duas Olimpíadas : em Berlim, na Alemanha, em 1936 e em Helsinque, na Finlândia, em 1952.


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