Folha de S. Paulo


CBF tenta lucrar com imagem de árbitros por 20 anos e irrita categoria

Rivaldo Gomes/Folhapress
O árbitro Anderson Daronco com o ponto eletrônico durante jogo do Campeonato Brasileiro
O árbitro Anderson Daronco com o ponto eletrônico durante jogo do Campeonato Brasileiro

Uma atitude recente da comissão de arbitragem da Confederação Brasileira de Futebol tem incomodado os árbitros do país. Desde o início de maio, por e-mail e durante os cursos de atualização dos árbitros por todas as federações do país (exceto Roraima e Rondônia), eles têm recebido um contrato que prevê a cessão de seus direitos de imagem por 20 anos. Além da irritação com o período prolongado previsto no contrato, os árbitros também ficaram incomodados com a indefinição quanto aos valores que receberiam com o vínculo.

No entanto, segundo a Folha apurou, há profissionais que têm assinado o documento com medo de sofrerem represálias, ou seja, serem preteridos em futuras escalas de jogos. Alguns árbitros das federações do Rio, Minas Gerais e Goiás já assinaram o contrato.

No documento obtido pela reportagem, denominado "Termo de compromissão e de autorização para uso de nome, imagem e voz", lê-se que "as partes acordam que o cedente fará jus a uma remuneração por cada partida nas quais atuar, cujo valor será negociado a cada jogo, ficando a CBF autorizada a divulgar sua imagem e explorá-la, por qualquer meio, podendo cedê-la a terceiros, inclusive a quaisquer parceiros e patrocinadores". O trecho causou irritação nos árbitros por não especificar qual o valor que receberiam caso assinem o documento. Desta forma, o temor era o de que a entidade recebesse somas vultosas pela comercialização dos direitos de imagem e repassasse apenas uma parcela pequena disso aos árbitros.

Reprodução
Documento enviado a árbitros pela CBF
Documento enviado a árbitros pela CBF
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Documento enviado a árbitros pela CBF
Documento enviado a árbitros pela CBF

O tema dos direitos de imagem dos árbitros ganhou destaque em 2015, em meio as discussões sobre o Profut. Um artigo da chamada "MP do Futebol" continha artigo que concedia 0,5% dos contratos de televisão aos árbitros sob pretexto de pagamento de direitos de imagem. A presidente Dilma Rousseff (PT), atualmente afastada do cargo, vetou o artigo.

A Anaf (Associação Nacional dos Árbitros de Futebol), que tem organizado ação referente aos direitos de imagem dos árbitros desde então, questiona a atual postura da CBF e algumas passagens do documento.

"É mais que claro e evidente que a entidade mantenedora CBF acaba reconhecendo o direito de imagem a que sempre teve direito o árbitro de futebol. Este documento é prova cabal deste entendimento. Ocorre que a Anaf é a entidade que a anos vem brigando e fazendo esforços incansáveis para alcançar este objetivo. Sabedores deste ganho sistemático, não de valores e sim de conquistas, temos que fazer constar que quem lutou e fez acontecer foi a Associação e não a CBF que neste ato vem a reconhecer o mérito antes do veredicto", diz a entidade em nota.

"Trata-se de um contrato unilateral onde a CBF propõe a cessão do direito de imagem e voz e a utilização de uniformes sem adicional de recebimento de patrocínio conforme estabelecido no itens 3 e 4.
Observa-se que o instrumento carece de alterações no sentido de ser equiparado em condições de direitos e deveres, principalmente quanto ao que tange ao patrocínio e ao prazo exacerbado", conclui.

"Fazendo uma rápida e superficial análise jurídica, falta-lhe claramente alguns requisitos essenciais aos contratos, como por exemplo economicidade, já que o termo não traz em seu bojo os valores a serem recebidos pelos árbitros. Trazendo mais um simples exemplo, podemos também citar a ausência de cópia para os árbitros com a assinatura do representante legal da CBF, detentora dos direitos cedidos no termo unilateral proposto. O contrato também é extremamente amplo, não apenas o de exibir a imagem dos árbitros (expressões corporais e nome) dá a CBF também o direito de 'locar' os árbitros para futuros patrocinadores dos uniformes ou competições nos próximos 20 anos (tempo que também não parece razoável)", diz parecer jurídico de escritório contratado pela Anaf para tratar da negociação dos direitos de imagem.

Procurado pela Folha, Sérgio Corrêa, presidente da comissão de arbitragem da CBF, disse que nas mensagens que enviou sobre o tema, sempre ressaltou que nenhum árbitro seria obrigado a assinar nenhum contrato e que ninguém sofreria represálias por qualquer postura diante do documento. Ele ainda acrescentou que o tema está sendo conduzido pelo departamento jurídico da entidade, que está inteiro sobre as minúcias do contrato proposto.


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