Folha de S. Paulo


Homem morto em briga de torcida não frequentava estádios de futebol

Divulgação
José Sinval Batista de Carvalho, morto antes do clássico entre Palmeiras e Corinthians
José Sinval Batista de Carvalho, morto antes do clássico entre Palmeiras e Corinthians

José Sinval Batista de Carvalho, 53, dizia gostar do Corinthians, relatam familiares, só para não precisar se alongar em explicações. Na verdade, ele mal dava atenção ao futebol. Definitivamente, o esporte não estava entre os assuntos do seu interesse.

Não frequentava estádios, portanto.

Ironia triste. Na manhã de domingo (3), a 32 km do Pacaembu, que receberia Palmeiras x Corinthians naquela tarde, Sinval, como era chamado pelos amigos, morreu vítima da face mais lamentável do futebol.

Estava no lugar errado na hora errada: quando voltava para casa, depois de dormir fora, deparou-se com confronto entre corintianos e palmeirenses na praça Aleixo Mafra ou praça do Forró, como é mais conhecida, em São Miguel Paulista, na zona leste de São Paulo.

Nada tinha a ver com a confusão. Foi um tiro só, fatal. Por ora, Sinval é o único morto de um domingo que teve ao menos quatro confrontos entre torcidas organizadas, antes e depois do jogo –ainda há pessoas hospitalizadas.

Fabio Braga/Folhapress
SAO PAULO, SP, 07-04-2016 - Rosivaldo Santana, primo do pedestre que levou um tiro no coracao durante uma briga entre as torcidas do Palmeiras e do Corinthians antes do classico no ultimo domingo(3). ( Foto: Fabio Braga/Folhapress, COTIDIANO )
Rosivaldo Santana, cunhado de José Sinval, morto durante briga de torcidas de Palmeiras e Corinthians

Intrigou a todos que acompanham o futebol paulista a demora de quatro dias para que fosse identificado. Não tinha família?

"Na terça (5), passei com amigo na praça do Forró e comentei: 'Aqui o homem morreu'. Não imaginávamos que seria Sinval. Algumas vezes ele ficava três, quatro dias sem voltar para casa, por isso num primeiro momento não nos preocupamos", conta o irmão Celso Batista de Carvalho, 52, que é químico.

Sinval vivia sozinho na parte de cima da casa da família em rua pacata de São Miguel Paulista. No mesmo terreno, mas no piso inferior, mora seu pai, Antonio Batista de Carvalho. Aos fundos, a irmã Selma, o marido, Rosivaldo Santana, e dois filhos.

Até quarta (6) pela manhã, a família imaginava que Sinval estivesse na casa de uma das mulheres. Eram duas, relata o irmão: uma em Francisco Morato, na Grande São Paulo, e outra na Vila Mara, na zona leste da capital.

Sinval tem uma filha, Débora, que mora com a mãe em Francisco Morato.

O sinal de alerta foi ligado quando Gilberto, chefe de Sinval em um loja que vende galões de água em São Miguel, disse que o funcionário não havia aparecido na empresa naquela semana.

"Ele também é nosso vizinho, o Gilberto. E quando apareceu o retrato falado, ele chamou o Celso lá e disse: não parece o Sinval? É o Sinval, corre pro IML", contou o cunhado Rosivaldo Santana.

Na quarta (6), a Secretaria de Segurança divulgou o desenho da fisionomia do homem não identificado. Celso, que já havia ido ao pronto-socorro e à delegacia, foi então nesta quinta (7) ao IML (Instituto Médico Legal), em Artur Alvim, onde desde domingo estava o corpo de Sinval.

"Vi a sandália que usava. De qualquer maneira, foi feito exame de DNA para comprovar que era o Sinval mesmo", contou Celso.

Sinval é descrito pelos familiares e amigos como um homem reservado, a ponto de não haver fotos dele em casa.

Gostava de tomar uma cerveja com os amigos de décadas, seus vizinhos. Tinha se mudado da Bahia para São Paulo com a família com apenas sete anos de idade e sempre morou na mesma casa.

Da mãe Maria, morta há três anos, só recebia bronca por uma razão: o costume de andar sem documento. Celso conta: "Ele não gostava de usar carteira. E minha mãe dizia: 'Um dia pode acontecer algo com você e não vão te reconhecer, meu filho".

O enterro acontece na manhã desta sexta (8) no cemitério da Saudade.


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