Folha de S. Paulo


Pelé diz que houve erro médico em sua primeira cirurgia no quadril

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De acordo com Pelé, 75, médicos que o examinaram disseram que houve um erro em uma cirurgia ao qual foi ele submetido em 2012, para a implantação de uma prótese no quadril.

Em entrevista à Folha nesta quarta-feira (6), Edson Arantes do Nascimento disse que uma suposta falha o levou a passar por nova operação, em dezembro do ano passado.

O primeiro procedimento, no qual ele acredita ter havido erro, foi realizado em São Paulo, no hospital Albert Einstein. O segundo aconteceu no Hospital for Special Surgery, em Nova York.

"Segundo os médicos que me analisaram, teve um erro médico. Um erro na técnica dos brasileiros", afirmou.

Procurada pela reportagem, a assessoria do Einstein não respondeu ao comentário de Pelé.

Quatro meses após a operação, disse estar sem dor. Contudo, ainda se movimenta com certa dificuldade. Deixou de usar um andador dias atrás e agora leva uma bengala à mão esquerda.

Descontraído, o ex-jogador afirmou que lamenta o atual momento da gestão do futebol brasileiro e que manteria Dunga como técnico da seleção, embora também goste de Tite.

Como espectador dos Jogos da Rio-16, ele dará outra colaboração: está fazendo música para o evento esportivo, que começa em agosto.

Folha - Prefere ser chamado de senhor, você ou majestade?

Pelé - Pode me chamar de "meu bem". O pessoal me chama de senhor Pelé, de seu Pelé. E eu falo: 'Tem tantos adjetivos e vai me chamar de seu Pelé?' Me chama de Edson, me chama de Rei.

Em 2002, você participou do Pacto da Bola, para lançar o calendário quadrienal do futebol. A gente divergiu e você disse que me falaria se se arrependesse. Você se arrependeu de ter feito parte daquilo que acabou mantendo o Ricardo Teixeira?

Naquele momento, não tinha outra alternativa para fazer a mudança. Perguntar agora não é nem justo, né? Não vou dizer que estou feliz, que estou satisfeito. Infelizmente, temos tido experiências que não dá para comparar com aquele tempo. Ainda mais eu, que sou mais jovem que vocês [risos]. Eu estava em uma roda ontem [terça-feira (5)], conversando, falando da Copa de 1958. Todo mundo respeitava o Brasil. Tem muita diferença daquela época para cá. Mudou tudo, mudou o jeito de se administrar o futebol. Eu não me orgulho de falar dos dirigentes brasileiros hoje. Eu fico triste que tenha mudado.

O que você acha da atual gestão da CBF?

A gente não tem parâmetro. É pouco tempo, mas ocorreram algumas mudanças, [embora] nenhuma definitiva. A gente tem de esperar gestão definitiva. Em uma época, nós batemos de frente com o João Havelange. Questionamos. Agora, não dá para falar nada ainda [Del Nero assumiu em abril de 2015; após denúncias, afastou-se formalmente do comando para se defender, dando lugar ao coronel Nunes].

Quem você colocaria como presidente da CBF?

Agora? Caramba. Tenho tantos amigos que mereceriam. Mas eles não querem. É difícil.

Você sempre conta um episódio em que prometeu ao seu pai que ganharia uma Copa. O que doeu mais: o 2 a 1 contra o Uruguai, em 1950, ou o 7 a 1 para a Alemanha, em 2014 ?

A gente está rindo, mas é triste. Virou até piada essa coisa. Em 1950, eu tinha 9 para 10 anos. Eu estava com meu pai [João Ramos do Nascimento, o Dondinho], que tinha convidado amigos para assistir ao jogo em casa. Eu estava com meus colegas brincando.

De repente, um silêncio. Entrei na sala e eles falaram o que tinha acontecido, que o Brasil tinha perdido a Copa. Falei a ele: "Calma, pai, não chora, nós vamos ganhar ainda uma Copa para você". Não esqueço essa cena. Foi um desastre na época.

Essa Copa de agora, com certa experiência, me fez sofrer muito menos. Acho que Deus tinha me preparado. Foi tão absurdo que a gente tomou de 7 e depois esqueceram que a gente tomou de 3 para a Holanda.

Tite ou Dunga na seleção?

Têm características diferentes, mas gosto dos dois. Hoje, eu deixaria o Dunga mesmo. Mas os dois poderiam estar na seleção.

Por que ir aos EUA para cirurgia se já tinha operado aqui?

Segundo os médicos que me analisaram, teve um erro médico [refere-se à cirurgia no quadril ocorrida em 2012]. Ou um procedimento, uma técnica [inadequada].

Eu tinha um problema na resistência, e a dor não passava. Fiz fisioterapia por dois ou três meses, mas não passava. Os médicos que, antes, tinham me orientado a fazer a cirurgia no Brasil acharam melhor me levar aos EUA.

Para encurtar a conversa, o médico disse que a técnica deles era a seguinte: tem o fêmur, a cabeça do fêmur e o chapéu, eles fixam com três parafusos, até calcificar. Aqui no Brasil, usaram um parafuso só e não calcificou, ficou solto. Eles acharam melhor que eu fizesse o reparo lá.

Não tenho dor nenhuma. Até brinquei com meu médico que chegou minha oportunidade na Olimpíada (risos). Eu já soltei o andador, estou com uma bengala. Mais uns três meses vou brigar por uma vaga [nos Jogos].

Há um ponto que até hoje faz com que o país te critique, o caso da sua filha não reconhecida, que acabou sendo reconhecida. Por que nunca disse o motivo de não reconhecê-la?

Eu não tinha certeza se era minha filha ou não naquela época. Essa menina de Santos, que faleceu, eu não tinha conhecimento. Ela apareceu na casa da minha irmã, dizendo que a mãe dela tinha dito que ela era minha filha.

Era Sandra o nome dela. E, então, pensei: com 22 anos ela aparece para dizer que é minha filha? Eu acho que quando ela nasceu, a mãe tinha que ter me falado. Por isso que exigi o DNA. Ela apareceu e a mãe não apareceu? Foi essa a discussão. Então fiz o exame e deu positivo.

Nunca soube do paradeiro da mãe. Deve ter sido coisa de criança, uma escapada, uma excursão do Santos (risos).

Algum outro caso recente?

Não. Que eu saiba, não [risadas]. Vamos esperar mais 25 anos para ver se aparece alguma outra aí (risos).

A situação do país te preocupa?

Qualquer um que ama esse país fica preocupado. Quem vive aqui sofre. E quem sai para viajar e ouve os repórteres também sofre muito. Em todo lugar a que chego, a primeira coisa que me perguntam é sobre corrupção no Brasil. Isso deixa a gente chateado.

Qual vai ser sua participação na Olimpíada?

Ainda não tem nada certo sobre isso. A empresa que cuida dos meus direitos está vendo como vamos fazer. Eu estou fazendo uma letra e música da Olimpíada.

Pode cantar para gente?

Ah, não posso. Porque vou estragar a surpresa.

Você vai carregar a tocha?

Quando recebemos a tocha, eu dei a volta com ela. Na abertura, fui consultado para ver se eu tinha interesse. Mas não tem nada acertado. A companhia que cuida da minha imagem é quem está discutindo isso.

Você poderia me explicar, eu até agora não entendi a explicação do Celso, por que você decidiu leiloar os seus troféus?

O Celso que o Juca está falando é o meu sócio, que está aqui comigo. Não é a primeira vez, já várias vezes, apareceram pessoas querendo fazer isso. Muita gente termina a carreira e não sabe para onde foi o troféu. Eu achei que dessa maneira, além de eu fazer um benefício para os meus futuros filhos, eu teria uma forma de garantir que as peças não seriam perdidas. Por isso, eu aceitei essa proposta.

Não é dificuldade financeira?

Graças a Deus não. Isso não é problema.

Excluindo você, usando Garrincha como exemplo. Ele jogaria tão bem hoje como no tempo dele?

Sem dúvida. O Beethoven não seria o Beethoven hoje?

Seu projeto de completar 100 anos continua em pé?

Eu sou mineiro, de Três Corações. Começa a se preparar, que com 100 anos eu vou bater uma bolinha no Maracanã. Não sei onde vai ser, mas vocês vão estar comigo.


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