Folha de S. Paulo


'Bom maluco' David Braz vira um dos principais personagens do Santos

Moacyr Lopes Junior/Folhapress
SANTOS, SP, BRASIL. 17.11.2015. David Braz durante treino no CT, em Santos . (Foto: Moacyr Lopes Junior/Folhapress, ESPORTE). ***EXCLUSIVO***
O zagueiro David Braz durante treino do Santos

"Podem me chamar de maluco mesmo". A frase do zagueiro santista David Braz, em entrevista à Folha, soaria quase como um clichê não fosse o histórico que o acompanha. Braz, definitivamente, não se restringiu ao lugar-comum, dentro e fora de campo, até virar um dos principais personagens da final da Copa do Brasil entre Santos e Palmeiras, que se inicia nesta quarta-feira (25), às 22h, na Vila Belmiro.

O jogador viveu justamente nos dois clubes os momentos mais decisivos no início e para a sequência da sua carreira, que poderia ter tomado um outro rumo devido a uma saída turbulenta do rival, ao tempo perdido com noitadas e até mesmo pelo descrédito com torcedores e dirigentes com relação ao seu futebol.

"Nada na nossa vida é fácil, dou valor a cada segundo que estou no CT [Rei Pelé], na Vila [Belmiro] e em Santos. Vejo que tudo o que passei valeu a pena", diz o zagueiro, que não esquece: "mas tive que engolir muito sapo".

No Palmeiras, viu o começo promissor ser comprometido em meio às convocações para as seleções de base. O desfecho foi o único episódio que realmente lhe magoa. A decisão do rompimento brusco levou o clube alviverde a pedir por uma punição disciplinar junto à Fifa, julgada no último ano, mas não acatada.

"Uma pessoa de lá, junto com o empresário que eu trabalhava, fez um contrato de gaveta [para a renovação de contrato]. Não queria sair naquela época, mas era jovem, tinha outros interessados e achava que não perderia muita coisa".

Braz deixou o time que chegou aos 14 anos para a Grécia. Lá, ficou esquecido por um ano.

A volta só aconteceu no empréstimo ao Flamengo, em 2009, com o gol de cabeça que marcou contra o Grêmio, que confirmou o título brasileiro para a equipe carioca, na última rodada da competição.

"Aquele jogo mudou minha vida", resume.

Vida transformada, de verdade, aconteceu mesmo no Santos. Mas, antes de iniciar a sua relação de amor, como ele mesmo diz ter com o clube, superou uma severa reprovação. Chegou rotulado como um jogador adepto das noitadas e muito questionado por estar acima do peso. Esse peso, em grande parte, dos bastidores com craques como Ronaldinho e Adriano Imperador.

"Poderia ter sido melhor, mas não vou reclamar do que vivi. Foi importante viver essa fase, está feito, foi bom. Aprendi com tudo aquilo, ganhei experiência. Mesmo com problemas joguei no Flamengo e no Palmeiras. Hoje não curto mais baladas, nem bebo. Tem me ajudado a render o que eu rendo hoje, a ser bem visto pelas diretorias e comissões técnicas", explica.

A primeira tentativa de um segundo recomeço foi uma passagem para esquecer pelo Vitória, para onde foi emprestado em 2013, mas acabou encostado. "Ouvi de pessoas do futebol que eu não servia, que nem tinha condições de estar jogando", lembra.

Por lesões improváveis, ganhou no Santos a chance que não largou mais, que posteriormente lhe renderia a condição de se tornar um dos líderes do atual elenco e o sonhado contrato de quatro anos, renovado em agosto.

"Fiquei um pouco surpreso. Sempre pedi a Deus para que pudesse jogar uma temporada e conquistar um título com o Santos. Estou com a chance de ganhar mais um [título] e jogarei mais quatro anos. Sinceramente, me considero um menino da Vila", conta.

A maior maluquice recente nos bastidores foi em janeiro, ao rejeitar duas propostas com valores sedutores, do futebol mexicano e belga, e ir na contramão dos cinco santistas que deixaram o clube na Justiça devido aos salários atrasados.

"No começo do ano, eles me procuraram. Depois, souberam que tinha salários atrasados e queriam que eu entrasse na Justiça. Achei ruim, era o titular da posição. Eles acharam que eu aceitaria a ideia, mas não queria por tudo o que vivo e conquistei no Santos", conta.

MALUCO SÓ EM CAMPO

Dentro de campo, o defensor carismático também se transforma. Acumula causos que confessa não conseguir segurar o riso ao lembrar. "Já vivi tantas coisas, depois dou risada com minhas maluquices. Fui até expulso sem cometer pênalti", conta.

A lista dos frutos desse jeitão é muito maior do que a polêmica confusão citada, quando por um erro da arbitragem acabou expulso no lugar do lateral esquerdo Zeca, no clássico contra o Corinthians, pelo segundo turno do Brasileiro.

Discutiu asperamente com Tite, contestou uma citação do árbitro na súmula, protagonizou uma cena de enérgica cobrança de apoio aos torcedores durante um jogo na Vila e provocou Valdívia simulando estar chorando.

"Do Tite foi um mal-entendido, ele que me subiu para o profissional. Estou até hoje atrás do telefone dele, devendo essa ligação, mas tudo isso fica no campo mesmo", minimiza, para ainda emendar: "o Valdivia é meu irmão".

Em paz e contrariando tudo o que quase atrapalhou a sua carreira, ele confessa estar ansioso pelo título da Copa do Brasil. Maluquice, agora, só dentro de campo.


Endereço da página:

Links no texto: