Folha de S. Paulo


Saiba como Del Nero se tornou cartola mais poderoso do futebol brasileiro

Terça, 23 de abril de 2013.

A convite de Marco Polo Del Nero, à época vice da CBF, e de José Maria Marin, então presidente da entidade, Alexandre Kalil, o principal dirigente do Atlético-MG àquela altura, desembarcou no Paraguai para uma visita à Conmebol, a Confederação Sul-Americana de Futebol.

Liderado por Ronaldinho Gaúcho, o time mineiro acabara de se classificar para a fase final da Libertadores.

Ir à Conmebol naquele momento serviria para introduzir Kalil à cúpula da entidade que organiza o torneio. "O Marco Polo me apresentou como um importante dirigente brasileiro. Falou: 'Isso é o Brasil. Não mexa com ele senão estará mexendo comigo'", lembra o atleticano.

Naquele instante, Del Nero ganhou o apoio de Kalil, um dos cartolas mais incendiários da história recente do futebol nacional –o Atlético-MG acabou conquistando o título da Libertadores.

Foi assim, portando-se como grande defensor dos clubes e distribuindo agrados sem alarde, que Del Nero ganhou corpo a ponto de chegar à presidência da CBF, cargo que assumirá oficialmente nesta quinta (16).

Tanto seus desafetos quanto seus aliados usam expressões e adjetivos semelhantes para descrevê-lo. "Pragmático", "frio", "de difícil leitura" são os termos usados.

"Ele é oriental. Enquanto você fala, não sabe se ele está aprovando o que você disse ou não", define Carlos Miguel Aidar, presidente do São Paulo e contemporâneo da faculdade de direito na década de 1960. "Aquele olhar de peixe morto engana", completa.

Editoria de arte/Folhapress

Em 1991, Del Nero nem sequer conseguiu se eleger presidente de seu clube, o Palmeiras. Agora, 24 anos depois, assume o posto de maior poder do futebol brasileiro.

Sua carreira na cartolagem começou com cargos nos anos 80. Advogado, tornou-se auditor do Tribunal de Justiça Desportiva de São Paulo em 1985. Em três anos, tornou-se presidente do TJD, cargo que manteve até 2003, ano em que chegou à vice-presidência da Federação Paulista de Futebol (FPF).

Ao assumir o posto, segundo o estatuto da FPF, Del Nero estava a um passo de ocupar a cadeira de presidente. O regimento previa que, em caso da saída do presidente, o vice mais velho assumiria.

Era a manobra perfeita. Como ele era 13 anos mais velho que Reinaldo Carneiro Bastos, o outro vice, Del Nero se credenciava a ser o sucessor de Eduardo José Farah.

Fragilizado politicamente, o então presidente renunciou em 2003. Num estalo, Del Nero, que até então não havia ocupado cargo de grande relevância no futebol, se convertera no chefe da federação mais rica do país.

A ambição o levou a outras jogadas. Del Nero rompeu com o antecessor após três meses de poder e selou a paz com Ricardo Teixeira, então presidente da CBF e desafeto de Farah. "A relação da CBF com a FPF mudou da água para o vinho", afirmou Teixeira à época.

Aliados de Del Nero juram que, nos bastidores, a bandeira branca já tinha sido hasteada antes mesmo de Farah sair. O cartola já tinha em mente seu principal objetivo: a presidência da CBF.

As pazes permitiram a Del Nero o direito de indicar José Maria Marin à vice-presidência da CBF no último mandato de Teixeira. O estatuto da confederação previa a mesma norma de sucessão que o da FPF –e Marin era, novamente, o vice mais idoso.

Enfraquecido como Farah nove anos antes, Teixeira deixou a CBF em 2012. Deu-se o drible: Marin assumiu a presidência da entidade e levou Del Nero. Como vice, ficou mais fácil para ele articular a chegada ao topo.

Enquanto Marin aparecia em entrevistas e eventos, seu vice –novamente o mais velho e o próximo na sucessão– fazia a comunhão com os clubes e as federações.

Del Nero, que havia fechado contrato de patrocínio da FPF com a Chevrolet, levou a empresa a 22 federações estaduais. Os acordos renderam não só dinheiro às entidades, mas também a simpatia dos eleitores da CBF ao cartola paulista em ascensão.

Sob a batuta de Del Nero, a CBF deu outro agrado às federações: às vésperas da eleição da entidade, dobrou os repasses mensais de R$ 50 mil para R$ 100 mil.

Com medidas como essas, ele minou as forças de seu principal desafeto, Andres Sanchez, que não conseguiu registrar sua chapa à presidência da CBF (precisava de apoio de oito federações e de cinco clubes da Série A).

Outros cartolas que se rebelaram após a queda de Teixeira, como Ednaldo Rodrigues, da federação baiana, recuaram. E, hoje, estão ao lado de Del Nero. Jogada de mestre.


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