Folha de S. Paulo


Maior medalhista olímpico da Espanha treina acima do peso em MG por 2016

Rafael Nadal, Pau Gasol, Mireia Belmonte, Casillas, Xavi, Iniesta. A atual lista de chamada para os espanhóis campeões mundiais nas mais diversas modalidades é extensa. Um deles treina no Brasil desde maio de 2013, agradecido por não receber o assédio comum a muitos de seus compatriotas.

Para o canoísta David Cal, 32, satisfação mesmo é ser o maior medalhista olímpico da história da Espanha.

"O esporte que faço não é basquete, tênis ou futebol, então há esportistas mais famosos. Mas em Olimpíadas quem tem mais medalhas sou eu, e isso me orgulha muito, claro", afirma Cal à Folha.

Dono de cinco pódios (um ouro e quatro pratas) em três edições dos Jogos (Atenas-2004, Pequim-2008 e Londres-2012), Cal não sabia se continuaria a competir após o recorde. Foi quando seu treinador nos últimos 15 anos se mudou para o Brasil.

Jesús Morlán foi contratado pelo COB (Comitê Olímpico do Brasil) para forjar o primeiro campeão olímpico do país na canoagem velocidade. Em menos de dois anos, transformou o baiano Isaquias Queiroz, 20, em bicampeão mundial na prova de 500 m (especialidade de Cal).

O pupilo espanhol, então, decidiu seguir o mestre até São Paulo. Em outubro, Cal se juntou a atletas da elite brasileira que treinam em Lagoa Santa, na região metropolitana de Belo Horizonte.

"Foi a decisão acertada para mim. De 2007 a 2012 treinamos sozinhos, só eu e Jesús. Era uma monotonia. É muito duro. A mudança me fez bem. Aqui, tenho outra rotina, positiva", diz Cal.

Como convidado do técnico, o campeão olímpico atualmente divide um quarto com o paulista James Macedo, 19, do caiaque, outro convidado na casa da seleção na cidadezinha mineira de menos de 60 mil habitantes.

"Se David decidisse voltar a treinar, eu não podia abandoná-lo", afirma Jesús. "Aqui ele ajuda a equipe, é como um Deus para eles. Passa experiência e tranquilidade, mas não estou totalmente contente", completa o treinador.

Visualmente é possível perceber que o atleta, cinco vezes medalhista em mundiais e cinco em Olimpíadas, está fora de forma.

"Ele tem que ser exemplo. Precisa perder 20 kg", diz Jesús, eleito o melhor técnico do Brasil em 2014 pelo COB.

O desempenho atual coloca em dúvida mais do que a participação de Cal nos Jogos do Rio. Põe em xeque também sua permanência em Lagoa Santa, segundo Jesús.

"Ainda há tempo, tenho que trabalhar todos os dias para chegar bem em 2016. É perder peso. É possível."

DESAFIO

A primeira meta é terminar entre os seis melhores do Mundial de Milão, que ocorrerá em agosto de 2015, e garantir a vaga no Rio. Um dos principais rivais na prova dos 1.000 m (na qual foi campeão olímpico) será Isaquias, com quem treina atualmente.

Se não conseguir, o espanhol precisará participar do pré-olímpico europeu, considerado muito mais difícil.

Os gastos de Cal no Brasil são divididos entre o comitê olímpico e o Conselho Nacional de Esportes da Espanha, ambos afetados também pela crise econômica de 2008.

"Houve cortes em todas as áreas e está claro que é mais importante manter o dinheiro em educação e saúde do que no esporte", opina Cal.

"Desde Barcelona-92 se apostou muito forte no esporte espanhol, meteu-se muito dinheiro e os resultados vieram. Até hoje aquele é o melhor resultado da nossa história. Depois não se podia manter aquele nível, então baixou apesar de bons resultados. Mas, com a crise, os recursos para os esportes baixaram muito. E se quer ter resultados, precisa de dinheiro para que os esportistas dediquem-se somente ao esporte", explica.

O atleta espanhol diz que conhece pouco do esporte brasileiro além da canoagem. Mas acredita que o fenômeno ocorrido na Espanha pode se repetir no país onde vive atualmente, com muito investimento para os Jogos do Rio e, depois, uma queda.

"Estão investindo muito para ter bons resultados no Rio. Mas precisa ver como vai ser depois. Espero que não seja tão grande a queda, para o esporte não voltar a etapa anterior", deseja o convidado em seu refúgio brasileiro.

Etapa anterior, no caso da canoagem brasileira, é ser praticamente desconhecida no mundo. Hoje, porém, ao menos o quarteto de elite da seleção é respeitado mundialmente com Isaquias Queroz (no C1 500 e C1 1.000), Nivalter Santos (C1 200), Erlon Silva e Ronilson Oliveira (C2 1.000).

COMPARAÇÃO

Na Rio-2016, o Brasil tem como meta conseguir 30 medalhas e ficar entre os dez melhores países no quadro de medalha, algo inédito.

A melhor campanha espanhola, em Barcelona-92, resultou em 13 ouros, sete pratas e dois bronzes, totalizando 22 medalhas e o sexto lugar (única vez do país no top 10 olímpico até hoje).

Na história olímpica, a Espanha acumula 133 medalhas (38 de ouro), enquanto o Brasil tem 108 (23 ouros).

Em Londres-2012, as campanhas foram similares com três ouros e 17 medalhas no total para ambos. A Espanha conseguiu dez pratas, contra cinco do Brasil, que teve nove bronzes, contra quatro dos espanhóis.

Moacyr Lopes Junior/Folhapress
O espanhol David Cal sentado na margem da Lagoa Santa, na região metropolitana de Belo Horizonte (MG)
O espanhol David Cal sentado na margem da Lagoa Santa, na região metropolitana de Belo Horizonte

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