Folha de S. Paulo


Clubes brasileiros são dependentes da ação dos empresários

De todos os países filiados à Fifa, o Brasil é o sexto que mais tem agentes registrados: 204. Neste ano, a federação internacional decidiu acabar com a função de agente Fifa. Por isso, esta será uma marca brasileira para sempre.

Na teoria, os clubes passam a ter que negociar jogadores entre si, sem intermediários. Na prática, um atleta pode passar uma procuração a alguém de confiança.

Vistos como vilões pela ação predatória de boa parte deles, os agentes e os fundos de investimento não foram necessariamente ruins para o futebol do Brasil nos últimos dez anos.

Fernando Gonçalves é um nome desconhecido, mas foi diretor da parceria entre o Nations Bank e o Vasco no fim dos anos 1990, diretor de futebol do Fluminense em 2005, dirigente do fundo de investimentos da Traffic na parceira com o Palmeiras entre 2007 e 2009.

Há dez anos, Gonçalves dizia que os fundos de investimento colocariam dinheiro e transformariam o futebol do Brasil. Isso aconteceu.

Entre 2007 e 2014, grupos como Sonda, Traffic e MFD –criado pelo banco Modal ajudaram a manter ou colocar no país jogadores como Neymar, Paulo Henrique Ganso, o argentino D'Alessandro e o chileno Aránguiz. Também houve conflitos quando os agentes ou fundos de investimento decidiram tirar jogadores a fórceps.

Em 2006, Neymar viajou para Madri para treinar no Real, encontro arranjado pelo empresário Wagner Ribeiro. O jogador voltou ao Brasil três semanas depois e decidiu continuar no Santos. O agente não influenciou.

Três anos depois, Oscar rompeu com o São Paulo por influência de seu empresário, Giuliano Bertolucci. Foi para o Internacional e depois para o Chelsea, onde brilha agora na Liga dos Campeões.

O São Paulo investe R$ 8 milhões por ano em sua base e perdeu uma de suas principais revelações na Justiça.

O técnico do clube, Muricy Ramalho, costuma dizer que as promessas que chegam para treinar com o time principal já têm dois celulares e um carro do ano na garagem.

"Há agentes e agentes. Acho ruim quando o empresário tem mais de 30% dos direitos do jogador, mas é bom quando existe parceria", diz o empresário Jorge Machado.

A bola da vez é o atacante Malcom, 17, do Corinthians. O clube detém apenas 30% de seu contrato e 35% estão sob domínio de Fernando Garcia, irmão do candidato à presidência Paulo Garcia.

O contraponto é o garoto Gabriel Fernando, o Borel, do Palmeiras. Na tentativa de renovação de seu vínculo, o presidente Paulo Nobre não aceita dividir percentuais acima de 25%. Correu o risco de perder o atacante, mas protegeu o clube e vai renovar.

Editoria de Arte/Folhapress

A existência de agentes Fifa e fundos de investimento não é necessariamente ruim, mas isso depende da maneira como o clube consegue ser independente.

Em 2007, o Manchester United chegou a comprar Tevez e manter um vínculo com o empresário iraniano Kia Joorabchian. Neste ano, o Atlético de Madri foi vice-campeão da Liga dos Campeões com um time repleto de jogadores vendidos pelo mega-agente português Jorge Mendes, como Miranda, Filipe Luís e Diego Costa.

A Fifa decidiu em outubro proibir esse tipo de associação. "Na prática, não vai mudar nada", diz Jorge Machado. "O Chelsea não terá jogadores de empresários. Todos serão do Roman Abramovich [empresário russo, dono do time inglês]", completa.

Os clubes intermediários da Europa, como Sevilla, Atlético de Madri, Porto e Benfica, usam esse tipo de parceria como forma de competir com os gigantes Chelsea, Manchester United, Bayern, Barcelona e Real Madrid. Estes têm dinheiro sobrando, o que os torna independentes dos empresários.

Apesar disso, o Real Madrid tem relação estreita com o português Jorge Mendes, que vendeu ao clube jogadores como Pepe, Fábio Coentrão –ambos por 30 milhões de euros– e o colombiano James Rodriguez, destaque da Copa do Mundo de 2014. A diferença é que, no caso dos times mais ricos, o agente depende mais do clube do que o clube do agente.

No Brasil, os clubes não têm esse poder.

William Mur/Editoria de Arte/Folhapress

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