Folha de S. Paulo


Ex-líder de torcida organizada, Rollo tenta ser presidente do Santos

Jorge Araujo/folhapress
Orlando Rollo mostra o escudo do Santos tatuado no peito
Orlando Rollo mostra o escudo do Santos tatuado no peito

Integrantes da Torcida Jovem vendiam lugares na caravana para Limeira (a 151 km de São Paulo), onde o Santos enfrentaria o Corinthians, pelo Paulista de 1995.

Um sujeito com a camisa do São Paulo passou pelo local. Após troca de insultos, prometeu voltar. Cumpriu a promessa minutos depois.

Assim que entrou no bar, puxou a arma e disparou tiro à queima-roupa em um dos líderes da organizada: um torcedor chamado de Morcego.

A vítima foi alvejada na boca. Deu sorte. A bala acabou amortecida por um dos dentes incisivos e se alojou no pescoço. Ele sobreviveu.

Dezenove anos depois, Orlando Rollo, 36, o Morcego, quer ser presidente do Santos.

"Só as pessoas mais antigas da torcida me chamam assim. A maioria nem lembra. E mesmo alguns mais velhos já me chamam apenas de Orlando", disse ele para a Folha.

A pedido da reportagem, ele abre a camisa e mostra o escudo do Santos tatuado no peito. Acima deste, o nome da torcida da qual começou a fazer parte aos 14 anos.

A preocupação é explicar que a tatuagem não tem as estrelas dos títulos mundiais do time (em 1962 e 1963) porque se apagaram com o tempo. Planeja retocar a imagem e pintar as estrelas de laranja. Com o tempo, ficam amarelas, como deve ser.

Presidente da Terceira Via, grupo de oposição que trabalha desde 2012 pensando na eleição que acontece no próximo dia 6, está acostumado a acusações de que ele e outras pessoas do grupo foram ou são de organizadas.

"Eu não vejo problema nenhum [em ser de torcida]. Não escondo. Complicado é que tem muita gente que inventa boato maldoso. A grande maioria dos nossos membros é oriunda da arquibancada. São da Torcida Jovem, Sangue Jovem e são pessoas de bem. São médicos, advogados, engenheiros, jornalistas... Há pessoas que querem dar a conotação que nosso grupo é formado por meliantes e desocupados", se queixa.

Rollo recita o próprio currículo para mostrar que tem gabarito para ser presidente. Advogado, formando em gestão de segurança pública, policial civil, é suplente de vereador em Santos. Foi um dos vice-presidentes da Federação Paulista de Futebol.

Toda vez que fala sobre as organizadas, usa a expressão "oriundo da arquibancada". Isso significa ter percorrido o país vendo o Santos jogar especialmente na década mais difícil para o torcedor: os anos 90. O time não ganhou nenhum título de expressão.

Protagonizou fatos do qual afirma se arrepender hoje. Em 2001, liderou invasão ao centro de treinamento em que um segurança foi agredido.

"Ao contrário de 'alienígenas', que aparecem só em época de eleição, eu vivo o Santos sete dias por semana, 24 horas por dia. Eu me preparei a vida inteira para ser presidente", afirma.

Nunca na história da agremiação uma eleição presidencial teve mais de dois candidatos. Agora são cinco. Além dele, concorrem Fernando Silva, José Carlos Peres. Nabil Khaznadar e Modesto Roma Jr.

FÔLEGO

A Terceira Via tem 1.200 associados. A maioria paga mensalidades de R$ 30 para fazer parte. Para se filiar, é preciso ser sócio do Santos.

Se todos estiverem adimplentes com o clube, darão fôlego para Rollo na votação. Em 2011, Luis Alvaro foi reeleito com 3.365 votos. Um pleito em que era favoritíssimo. Em 2009, contra o então mandatário Marcelo Teixeira, ganhou com 1.882 votos.

O carro chefe da candidatura é a reforma da Vila Belmiro. Ele quer modernizar o estádio e aumentar a capacidade para 30 mil pessoas. Atualmente, este pode receber 16 mil pagantes.

"Não é difícil. Não é possível essa má vontade dos dirigentes do Santos com a Vila Belmiro. Eu considero um crime o que fizeram com a Vila, que foi perdendo capacidade ano após ano. Meu projeto não é nada de faraônico. O que eles fizeram foi elitizá-la, o que é um dos principais fatores que faz a Vila ter um público tão baixo", jura.

Quando afirma ter se preparado "a vida inteira", lembra ter estudado e ocupado cargos no futebol. Mas a grande arma é o discurso "oriundo da arquibancada". Falar o que o torcedor deseja ouvir.

Promete iniciar o projeto da ampliação da Vila imediatamente ao ser eleito, mesmo que seja com recursos próprios, sem parcerias ["É viável", garante]. Afirma que dentro de campo o time não vai sofrer com falta de recursos. Promete analisar cuidadosamente as contas. Utiliza uma expressão de impacto para lembrar que não se sabe a real situação financeira do Santos: "é uma caixa preta". Sobre os 13 milhões de euros emprestado pela Doyen Sports para a compra de Leandro Damião, diz ser uma das piores negociações da história do futebol. "Ruim para o clube. Para quem fez [a transação], foi extremamente vantajoso."

O discurso de Rollo é pronto. Especialista no estatuto do Santos, não vacila diante de perguntas. Os assuntos estão na ponta da língua. Essa foi uma das características que impressionaram o ex-presidente Marcelo Teixeira quando o conheceu. Assim como a ousadia de enfrentar quem era absoluto no clube.

Aos 23 anos, desafiou José da Costa Teixeira, o candidato de Marcelo, na eleição para presidente do Conselho Deliberativo. Sozinho, conseguiu 20% dos votos.

A mania de discutir, argumentar e usar o conhecimento das regras do jogo para atrapalhar os adversários tirou de Teixeira uma previsão que hoje o faz rir. "Tenho a ata dessa reunião até hoje. Ele disse que eu seria o presidente do Santos um dia. A profecia é dele..."

Se tudo der errado, Rollo jura não saber como será o futuro e e tentará de novo se candidatar. A expressão é de quem vai. Enquanto isso, continuará usando sua coleção de mil camisas do Santos. De uniforme usado por Pepe em 1964 a os modelos atuais.

"A única certeza que tenho é que vou continuar indo aos jogos. Eu sempre vivi o Santos. Vou continuar vivendo."


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