Folha de S. Paulo


Josi atende a pedido de Lais e diz como a amiga a convenceu a ir a Sochi

Há sete meses Josi Santos, 29, e Lais Souza, 25, são companheiras diárias. Ex-ginastas, foram convidadas para treinar um esporte de inverno e tentar vaga na Olimpíada de Sochi, na Rússia.

No esqui aéreo, elas aprenderam a combinar a velocidade na descida de uma rampa na neve com um salto e manobras até a aterrissagem.

Porém, em um passeio de esqui, em 27 de janeiro, nos Estados Unidos, Lais sofreu um acidente que resultou em trauma na coluna cervical.

Após três cirurgias, ela ainda respira por aparelhos e tenta recuperar o movimento dos braços e das pernas.

Josi precisou se separar da amiga no último fim de semana. Com vaga nos Jogos, ela está em Sochi graças ao pedido da própria Lais.

Nesta entrevista exclusiva à Folha, Josi fala sobre a última conversa, o choro, o pedido de Lais e a escolha de competir no próximo dia 14.

Divulgação/CBDN
Josi Santos (esq.) e Lais Souza durante treinamento, em julho de 2013, em Whistler, no Canadá
Josi Santos (esq.) e Lais Souza durante treinamento, em julho de 2013, em Whistler, no Canadá

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Folha - Qual a sensação de chegar a Sochi para os Jogos?
Josi Santos - Era para ser de muita alegria pois é a realização de um sonho como atleta. Mas, devido às circunstâncias, esse sonho não está sendo vivido intensamente como eu gostaria.

Você está com medo depois do acidente da Lais?
Não, definitivamente não. O que aconteceu com ela não foi nas rampas, mas em pista normal. Ela me pediu para vir, me deu muita força e isso me deu motivação e energia para continuar.

O que a Lais falou para você?
No sábado, ela já estava melhorzinha, então conseguimos conversar bastante. Eu consegui desabafar tudo o que eu estava sentindo, toda a dor que havia passado durante a semana. Não aguentei e chorei, chorei como criança, pedi desculpas por não conseguir estar sendo forte, e ela me respondeu: "Pretinha, eu sei o que você esta sentindo. Eu, no seu lugar, estaria do mesmo jeito. Pode chorar. Eu sei o quanto está doendo em você, mas você precisa ser forte. Vai lá e representa a gente. Estarei aqui torcendo. Tenha muita calma e muita força".

Quando você era ginasta, sonhava em estar na Olimpíada?
Sim. Minha primeira seleção foi em 1998 e esse sonho nunca saiu da minha cabeça.

Qual resultado espera?
Tenho consciência. Meu salto é de menor valor do que das outras atletas. Espero fazer sem queda, assim já ficarei feliz. O resultado não importa.

Por que você, a Lais e o treinador Ryan Snow estavam esquiando no dia do acidente?
Foi para descontrair devido à espera da vaga olímpica. Aquela tinha sido uma semana bem tensa, e tínhamos passado muito tempo treinando. Os saltos já estavam prontos. Tiramos o dia para esquiar e descontrair, mas infelizmente pegamos a pista errada. Não descemos pelos moguls [degraus de neve], mas pelo cantinho que era mais reto e tinha apenas umas ondas. Descemos com cautela, mas acredito que ela tenha perdido o controle e se chocado com as árvores que estavam próximas.

Você não viu o acidente?
Nem eu nem o Ryan. Nem ela lembra, embora estivéssemos todos juntos, em fila. Ryan na frente, a Lalá um pouco mais em cima e eu atrás. Só que, no momento, eu e ele estávamos de costas.

Como ela estava no último encontro entre vocês?
Está evoluindo a cada dia, sendo a guerreira de sempre. Ela é um espetáculo de força e coragem. Ela merece voltar a andar. A voz é um pouco rouca e baixa, mas a gente entende perfeitamente. A última [notícia] foi que ela sentiu um incômodo nas pernas e conseguiu sentir as escápulas se juntarem. Está melhor.

Quando você soube que estava classificada para Sochi, pensou em dizer que não ia?
Sim. Chorei muito, pois era um sonho. Mas conversei com minha mãe, namorado, amigos próximos, com a Lalá. Eles pediram para eu fazer por ela, porque ela iria gostar de me ver lá. Foram muito duros os treinamentos. Era minha chance de mostrar para o Brasil e para o mundo o que nós treinamos todos esses meses.

Como você está se sentindo na Vila Olímpica agora?
Está sendo muito difícil para mim. Eu tinha a Lais ao meu lado todos os dias, uma companheira. Agora não tenho mais com quem conversar, brigar, mandar abaixar o volume do som, fazer nossa omelete no café da manhã, fofocar. Aí eu fico triste por esse capítulo aqui em Sochi estar sendo escrito de outra maneira e não como havíamos planejado. Mas ganhei um abraço forte de todos da delegação, e isso faz lembrar a pequena pedindo para eu vir, aproveitar o máximo esse sonho e nos representar.

Hoje você acha que fez a escolha certa ao trocar de esporte?
O acidente foi uma fatalidade, o destino quis assim. Certo ou errado, estou aqui, realizando o maior sonho da minha vida como atleta. O que você faria no meu lugar?

Editoria de Arte/Folhapress

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