Folha de S. Paulo


Para Dorval, ausência de Pelé no Mundial de 1963 não foi sentida graças a Almir

Cerca de 20 garotos se reúnem no centro do campo sintético do Clube Desportivo Municipal Ferradura, no Jardim Jabaquara, na zona sul da capital paulista. Atentos, eles escutam um senhor de 78 anos ensinar futebol.

Mais do que respeito, é possível notar admiração. O senhor que fala sobre as vantagens e desvantagens do esporte preferido da maioria dos brasileiros é Dorval Rodrigues, o ponta direita bicampeão do mundo pelo Santos em 1962 e 1963.

Dorval é o mais fechado dos nove bicampeões do mundo com o Santos, mas guarda boas lembranças do título conquistado contra o Milan, da Itália, após três jogos. Ele participou de todos e apesar de não ter feito gols diz que foi a maior glória da carreira.

O herói da conquista? Para Dorval, o destaque daquele título foi Almir Moraes de Albuquerque, o Almir Pernambuquinho, que teve a missão de substituir Pelé nos últimos jogos por conta de uma lesão muscular do camisa 10.

"Almir fez uma partida sensacional. Não sentimos a falta do Pelé porque o Almir correspondeu", afirmou Dorval à Folha, durante a pausa de um dos treinos que comandou no CDM Ferradura.

Acompanhe a entrevista do ex-ponta direita, como parte da série de textos sobre o bicampeonato mundial de 1963.

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MAIS BICAMPEÕES

Folha - Qual é a maior lembrança que o senhor tem do bicampeonato mundial?
Dorval - Quem lembra muito é o Coutinho. Eu não lembro tanto, mas alguma coisa eu consigo recordar. Fui campeão em 1962 e 1963. Contra o Benfica [1962] foi um jogo sensacional, um dos maiores da história do Santos. Demos um espetáculo no estádio da Luz [em Lisboa]. A torcida portuguesa aplaudiu o time de pé. Acho que até hoje os portugueses não esqueceram aquela exibição. Ganhamos por 5 a 2. Em 1963, contra o Milan, no Maracanã os jogos foram bons. Santos fez uma partida sensacional. Não tínhamos Pelé, Zito e Calvet, mas o Almir e os outros que entraram no time corresponderam muito bem. Choveu muito no segundo jogo e conseguimos superar até isso. O Santos tinha ótimos jogadores e nos sobressaímos.

Como foi superar até a ausência do Pelé nos dois jogos no Maracanã?
O Milan tinha um time sensacional também, mas nós mostramos para o mundo todo o nosso potencial, especialmente o Almir. Ele jogou no Milan e não foi muito bem. Então, tinha uma certa bronca. O jogo que perdemos por 4 a 2 [Almir não jogou] houve muita discussão, muita briga. Depois, na vitória por 4 a 2, ele fez uma partida sensacional. Não sentimos a falta do Pelé porque o Almir correspondeu. Ele sofreu o pênalti no terceiro jogo e o Dalmo que bateu.

Recorda porque o Dalmo cobrou e não o Pepe?
O Pepe geralmente batia, mas o Dalmo foi mais rápido naquele dia, pegou a bola e cobrou. Ele bateu bem. Foi um grande jogador e sabia bater pênalti.

Cinquenta anos depois do título, como é sua rotina hoje?
Trabalho aqui no CDM. O clube é da prefeitura. Temos uma cooperativa que era dirigida pelo Badeco, que foi presidente, e o Coutinho, que foi vice-presidente. Nos tínhamos 60 ex-jogadores que trabalhavam nesse projeto, mas ele foi encerrado porque a prefeitura não renovou nosso contrato. Estamos com esse projeto parado. Mas a gente continua trabalhando. O projeto é para tirar molecada da rua. Não deixá-los na rua que eles se perdem, caem nas drogas. Aqui tem lanche para eles. Estou há 20 anos e o campo está maravilhoso. Antes era barro, areião. Nosso cooperativa está parada, mas no ano que vem vamos tentar voltar.

O senhor vem todos dias para o CDM Ferradura?
Dou aula de terça e de quinta, das 8h às 11h e das 14h às 17h. É um trabalho social. Tenho uma ajuda de custo para estar aqui.

Os meninos que jogam aqui tem a ambição de jogarem profissionalmente?
Quem se destacar a gente até leva para algum clube, mas o intuito não é revelar. É tirar o menino da rua. Todo mundo merece uma oportunidade. Um que passou por está jogando profissionalmente é o Henrique [Dorval não lembrou a posição]. Sei que ele passou pelo Paraná.

O senhor conta as histórias do Santos para eles? Fala dos títulos que ganhou pelo clube?
A molecada gosta de perguntar alguma coisa. Na sede do clube, coloquei um painel com fotos e eles sempre perguntam algo. É um incentivo para a gente. Dar um conselho, contar uma história. A época do Santos foi maravilhosa. Peguei grande jogadores.

Editoria de Arte/Folhapress
Infográfico mostra como estão hoje jogadores que conquistaram o título do Mundial de Clubes em 1963
Infográfico mostra como estão hoje jogadores que conquistaram o título do Mundial de Clubes em 1963

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