Folha de S. Paulo


Governo sanciona projeto que libera inibidores de apetite

Rafael Hupsel/Folhapress
Liberação de emagrecedores pelo Legislativo pode ferir a autonomia da Anvisa
Liberação de emagrecedores pelo Legislativo pode ferir a autonomia da Anvisa

O presidente em exercício Rodrigo Maia (DEM-RJ) sancionou nesta sexta (23) lei que libera produção, comercialização e consumo de inibidores de apetite feitos a partir das substâncias anfepramona, femproporex e mazindol.

Derivados das anfetaminas, esses anorexígenos foram usados por décadas no país –até a proibição da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) em 2011.

A agência alegou que não havia comprovação de segurança e eficácia e que os riscos à saúde eram maiores que os supostos benefícios.

Já a sibutramina, também citada no projeto, pôde ser comercialziada, mas com restrições, como a necessidade de prescrição médica especial.

A decisão de sancionar a lei foi antecipada pela Folha na quinta (22).

Maia afirma que tomou a decisão após consultar médicos favoráveis à liberação e também o Conselho Federal de Medicina (CFM).

"Entendo o drama de milhares de brasileiros que têm níveis perigosos de obesidade e precisam ser levados a sério, e com responsabilidade, tendo acesso a um tratamento médico controlado", informou por meio das redes sociais, usando a hashtag "#ObesidadeEuTratoComRespeito".

REAÇÃO

A Anvisa classificou a lei como inconstitucional e disse que a medida pode trazer riscos à saúde.

"A decisão de sancionar a liberação da comercialização desses anorexígenos no Brasil vai contra o que ocorre em outros países desenvolvidos, cuja competência para avaliar se estão aptos a serem oferecidos à população é das respectivas agências reguladoras", informou, em nota.

Das drogas, só a anfepramona é vendida nos EUA, mas não na Europa –o mazindol foi retirado dos EUA e da Europa em 1999 e o femproporex nunca foi aprovado nos EUA e foi proibido na Europa em 1999.

Em nota, o Idec (Instituto de Brasileiro de Defesa dos Direitos do Consumidor) e Abrasco (Associação Brasileira de Saúde Coletiva) informam que estudam recorrer à Justiça contra a liberação.

Para as entidades, o aval às drogas "atende ao lobby e poder econômico das empresas farmacêuticas e dos prescritores que lucram com a produção, a venda e as comissões sobre remédios".

Para Salomão Rodrigues, do CFM, é preciso "ampliar o leque" de tratamentos contra a obesidade. Segundo ele, a autarquia deve elaborar, em até 60 dias, uma norma para regular o uso dos anorexígenos. A ideia é ter critérios rígidos, como doses máximas, riscos de associações entre medicamentos e pacientes para os quais são indicadas.

O documento também deve trazer incentivo ao tratamento conjunto com iniciativas de reeducação alimentar e prática de exercícios físicos e veto ao uso simultâneo de mais de um inibidor de apetite.

"Já sabemos que devem ser usadas como monodrogas, ou drogas únicas", afirma. "O uso do inibidor dificilmente traz problemas, o que traz problemas é o abuso. Precisamos de uma norma bem estabelecida. O uso com prescrição médica, com doses adequadas, só vai fazer bem", completa.

Alexandre Hohl, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (Sbem) diz que o caminho adotado "não foi o melhor" e que "a sociedade perdeu com isso". Mas, segundo ele, a raiz do problema é a proibição da Anvisa: "Tiraram a possibilidade de uso de medicamentos que, em casos específicos, poderiam ajudar."

Segundo ele, estudos amplos não devem ser realizados, por serem muito demorados e caros ("dezenas de milhões de dólares") para drogas sem patente –de baixo custo e lucratividade, portanto.


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