Folha de S. Paulo


Obstetras pedem testes de zika mesmo para grávidas sem sintomas

Andre Borges - 30.mar.2016/Agência Brasilia
Mulher faz ultrassom em hospital de Brasília
Mulher faz ultrassom em hospital de Brasília

Mesmo sem recomendação oficial, médicos obstetras têm incluído o teste do vírus da zika no pré-natal para gestantes que não tiveram sintomas da infecção ou que não viajaram para áreas endêmicas.

Sociedades médicas não recomendam o rastreamento indiscriminado das gestantes porque os testes para zika são pouco específicos e podem gerar reação cruzada com outros vírus da mesma família.

Segundo o infectologista Artur Timerman, presidente da Sociedade Brasileira de Dengue e Arboviroses, em populações já expostas aos vírus da dengue ou da febre amarela (ou mesmo vacinada recentemente contra a doença), há risco de resultados falso-positivos por conta de uma reação cruzada.

"Resultados positivos devem ser analisados com cautela porque podem representar apenas uma exposição prévia a outros flavivírus." Para ele, não há sentido algum em pedir o teste a gestantes assintomáticas. "Só serve para causar estresse, neura e pânico entre as mulheres."

O que o vírus faz no bebê

O ginecologista Cesar Fernandes, presidente da Febrasgo (Federação das Sociedades de Ginecologia e Obstetrícia), também afirma que o teste de zika não tem precisão suficiente para ser indicado como rastreio sistemático na gravidez –como acontece, por exemplo, com os testes de rubéola e de sífilis.

"Não se justifica, a menos que a paciente tenha apresentado sintomas de zika ou esteja preocupada e peça para fazer o teste. Mas precisa ser informada sobre a limitação."

Em casos de fertilização in vitro, o teste é obrigatório. Decisão da Anvisa de março de 2016 determinou que doadores de sêmen ou óvulo ou casais que vão fazer o procedimento sejam testados.

Se o exame do doador der positivo, o material é descartado. Em relação aos casais, se um ou outro estiver com o vírus, o início do tratamento ou a transferência do embrião para o útero (última etapa da FIV) deve ser adiado.

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Segundo ele, uma comissão da Febrasgo que trata das questões de zika na gestação deve se reunir no final deste mês para atualizar as informações sobre o tema.

"Ainda há um desconhecimento muito grande sobre zika, não tivemos tempo hábil para maturar as informações. E a imprecisão dos testes não ajuda muito", diz ele.

Hoje há uma técnica que identifica o vírus nos primeiros dias da doença (Polymerase Chain Reaction, PCR) e os testes sorológicos IgM, que detecta anticorpos na corrente sanguínea na fase aguda, e o IgG, que verifica se a pessoa já teve contato com zika em alguma época da vida.

FALTA DE TERAPIA

A infectologista Carolina Lazari, assessora médica do Fleury Medicina e Saúde, lembra que um rastreamento só faz sentido se houver conduta terapêutica a ser tomada diante da infecção.

Por exemplo, se a grávida for detectada com toxoplasmose, sífilis ou HIV há possibilidade de tratamento que minimiza ou evita as sequelas da doença no bebê. "No caso da zika, não há o que fazer", afirma a médica.

Segundo ela, nos casos em que o exame dá positivo para zika, o laboratório costuma ligar antes para o médico, explicando as limitações do teste e a possibilidade de reação cruzada, para que ele tranquilize a paciente.

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"Queremos evitar que ela veja o resultado pela internet e se desespere. Às vezes, não conseguimos falar com o médico antes e isso acontece."

Foi exatamente o que ocorreu com a advogada Ana Luíza Costa, 32, de Vitória (ES). Grávida de 12 semanas, ele teve o teste incluído no pré-natal, mesmo sem ter tido sintomas de zika. Ao abrir o resultado pela internet, levou um tremendo susto.

"Bateu um desespero, comecei a chorar, meu marido correu ligar para o médico, mas nem ele sabia muito bem o que dizer. Só falou que era bom repetir [o teste] para ter a certeza. Foi uma semana dos infernos até vir um segundo resultado negativo."

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