Folha de S. Paulo


Programa bilionário dos EUA pretende dar 'tiro na Lua' contra o câncer

Nesta segunda (6), o vice-presidente dos EUA, Joe Biden, falou para uma plateia de médicos sobre aquele que pode ser o mais importante marco da participação do país na luta contra o câncer.

A iniciativa recebeu o nome de Moonshot (tiro na Lua, em tradução livre) e remete à década de 60, quando o governo dos EUA prometeu que o país levaria o homem à lua antes de 1970 –e assim o fez.

O novo Moonshot quer investir US$ 1 bilhão em colaborações entre pesquisadores, médicos e entidades para catalisar os avanços na área oncológica. A iniciativa tem apoio da maioria dos americanos até mesmo para uma elevação dos impostos para cobrir seus gastos e também conta com a aprovação de sociedades médicas e de acadêmicos.

Jim Young/Reuters
O vice-presidente americano Joe Biden, durante fala em congresso de câncer, em Chicago
O vice-presidente americano Joe Biden, durante fala em congresso de câncer, em Chicago

O projeto de Biden começou há pouco mais de um ano, após a morte de Beau Biden, filho do vice-presidente, aos 46 anos, de um câncer no cérebro. O caso gerou grande comoção no país.

Aos presentes no encontro anual da Asco (Sociedade Americana de Oncologia Clínica), que ocorre em Chicago, Biden falou por cerca de meia hora sobre os desafios que deverão ser enfrentados pela classe médica para otimizar a pesquisa na área de câncer. Para ele, o principal é mudar a maneira de se pensar.

"Se não houvesse ciúmes entre laboratórios e grupos de pesquisa, poderíamos evitar redundâncias desnecessárias das pesquisas", disse o vice-presidente americano. "Vocês [oncologistas] aprenderam que não dá para trabalharem sozinhos."

"Sei que o que vou dizer parece impossível, mas imaginem o que seria possível se todos trabalhassem juntos", disse Biden, que foi aplaudido pelos presentes.

A Asco tem contribuído com a iniciativa de Biden por meio de iniciativas como CancerLinQ, que pretende aproveitar a quantidade de dados de câncer disponíveis hoje. Já foram coletados dados de mais de 750 mil pacientes.

Biden costuma dizer que a análise de big data (grandes dados) é um dos caminhos mais promissores para promover um melhor cuidado e encontrar melhores tratamentos para os pacientes de câncer. Um exemplo seria comparar a pratica clínica com as diretrizes médicas mais recentes.

Com todo os dados brutos disponíveis, "daria para enxergar todo o panorama, e não só aquilo que se se espera de cada estudo individualmente".

TAPUR

Outra iniciativa que teve destaque é o ensaio clínico de fase 2 que será patrocinado pela própria Asco, uma iniciativa sem precedentes chamada Tapur (Targeted Agent and Profiling Utilization Registry, ou algo como registro de uso e caracterização de terapia-alvo).

A iniciativa encabeçada pela Asco tentará uma abordagem diferente no estudo de câncer: em vez de tratar um tumor baseado no local onde ele se encontra (pulmão ou intestino, por exemplo) e em suas características morfológicas (resultado da biópsia), serão utilizados como critério apenas as características do tumor.

Esse tipo de terapia é conhecido como terapia-alvo, e se baseia no ataque seletivo de algumas moléculas a alvos no tumor, impedindo sua proliferação e/ou facilitando sua destruição.

Só serão admitidos pacientes com câncer avançado e que não obtiveram sucesso em outras terapias. No anuncio desta segunda (6), foi comemorado o ingresso do 49° paciente no Tapur.

Além da Bayer e da MSD, que acabaram de entrar na colaboração, fazem parte da iniciativa as farmacêuticas Astellas, AstraZeneca, Bristol-Myers Squibb, Eli Lilly e Cia, Genetech e Pfizer.

Elas oferecerão ao todo 17 drogas que possibilitam 15 tipos de terapia-alvo diferentes para todos os tumores sólidos avançados, mieloma múltiplo e um tipo de linfoma.

Um objetivo secundário do Tapur é oferecer uma chance de cura por meio desse estudo. "Apenas 5% dos pacientes participam de estudos clínicos. Abordagens criativas como o Tapur são necessárias para trazer informação que beneficie futuros pacientes", disse Richard Schilsky, da Asco.

A iniciativa contou com a intermediação do Instituto Nacional de Câncer dos EUA, que se encarregou de conversar com as principais farmacêuticas na área oncológica para que se tornassem parceiras do projeto.

O projeto também tem um braço educacional que se dedicará a ensinar médicos oncologistas sobre como usar testes genéticos para ajudar seus pacientes.

O jornalista GABRIEL ALVES viajou a convite da Pfizer


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