Folha de S. Paulo


Drogas devem vir antes de vacina antizika

Como a vacina contra o vírus da zika deve surgir apenas no longo prazo, cientistas e farmacêuticas vão apostar primeiro no desenvolvimento de drogas para tentar proteger as pessoas afetadas pela epidemia viral.

Em três anos, é possível que existam no mercado drogas que protejam o sistema neuronal contra o zika. Já uma vacina segura e eficaz deve demorar três vezes mais.

Os fármacos poderão impedir o desenvolvimento da microcefalia, associada a infecção por zika, e todos os efeitos negativos que surgem com a má formação fetal.

"Já vimos que é possível desenvolver um tratamento com medicamentos para proteger quem tiver contato com o zika", afirma Mauro Teixeira, farmacologista da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais).

Para o cientista brasileiro, que participou nesta semana do encontro anual da Rede Mundial de Virologia, em Atlanta, no sul dos Estados Unidos, o atalho para uma droga eficaz passa pelo uso de moléculas já testadas.

Com o medo dos americanos de que o zika chegue ao país, algo que deve ocorrer nos próximos meses, segundo estimativas do pesquisador Scott Weaver, da Universidade do Texas, os cientistas brasileiros foram o centro das atenções do evento.

A associação entre antivirais e neuroproteção é um caminho promissor, diz Teixeira. No laboratório, o pesquisador comprovou que uma molécula usada em um remédio para o mal de Alzheimer pode proteger o sistema neuronal contra o vírus da zika.

Fora dos laboratórios públicos, os grupos de inovação tecnológica do setor privado têm uma leitura semelhante de como está sendo travada a guerra contra o zika.

"O medicamento chegará ao mercado antes da vacina" sentencia Carlos Sanchez, presidente do Conselho de Administração do Grupo NC, que engloba a farmacêutica brasileira EMS.
A empresa vai investir no desenvolvimento de uma molécula que será montada a partir de outras duas (uma antiviral e outra neuronal).

O plano é colocar no mercado um remédio contra o vírus que tenha poucos efeitos colaterais tanto para os fetos quanto para as mães.

Em adultos, um dos efeitos colaterais mais temidos de um possível medicamento contra o zika é que ele cause a síndrome de Guillain-Barré, doença causada por infecção viral ou bacteriana que ataca os nervos periféricos fora do cérebro e espinha dorsal, causando paralisia.

VACINA A LONGO PRAZO

Com exceção de Jorge Kalil, diretor do Instituto Butantan, que acredita que em até três anos será preciso resolver o problema da imunização contra o vírus, os cientistas americanos e brasileiros presentes no evento miram o longo prazo quando o assunto é a uma possível vacina.

Hoje, existem pelo menos cinco grupos correndo atrás da vacina. Três deles com participação de organizações brasileiras: Fiocruz, Butantan e Evandro Chagas.

Esse terceiro grupo vai começar os testes em animais na virada do ano em conjunto com a Universidade do Texas, segundo Pedro Vasconcelos, diretor do instituto localizado em Belém (PA).

Nenhuma vacina deve ficar pronta em menos de oito anos, indicam as estimativas dos cientistas. Os primeiros testes humanos de uma possível imunização devem ter início no ano que vem.

Num primeiro estágio, o mais provável é que exista uma vacina para ser aplicada em um grupo restrito de pessoas, como o de futuras grávidas, que precisem de uma proteção prévia.
"Fazer uma vacina é fácil. O difícil é fazer uma que seja realmente segura", afirma José Esparza, presidente da Rede Mundial de Virologia.

Para Jorge Kalil, o maior problema nacional hoje é a falta de recursos e o excesso de burocracia. "Nós temos cientistas de primeira linha. Esse não é o problema".

O repórter EDUARDO GERAQUE viajou a convite da empresa EMS


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