Folha de S. Paulo


Grupos de família no WhatsApp levam conflito de gerações para a internet

Os papos (e as brigas) daqueles almoços de domingo em família agora continuam nas redes sociais ou no aplicativo WhatsApp, em grupos que reúnem desde o tio piadista à prima viciada em selfies.

Se cara a cara a convivência já não era fácil, no meio virtual tudo pode piorar.

Que o diga o químico João Henrique Nunes, 25, que pediu para sair de um grupo do WhatsApp com mais de 30 familiares.

"Eu recebia mensagens incessantes de bom dia, fotos de bebês, correntes e vídeos motivacionais com mais de cinco minutos que acabavam com a minha internet 3G."

Apesar de dar um basta no grupo familiar, João coleciona diálogos engraçados com a mãe, Maria, e os publica no Facebook. Ele é um dos criadores da página "Minha mãe no WhatsApp", que já tem mais de 4.000 seguidores.

Daniel Marenco/Fohapress
A economista Mariana Villar, 42, com o filho Diogo, 10, que adora o aplicativo WhastApp
A economista Mariana Villar, 42, com o filho Diogo, 10, que adora o aplicativo WhastApp

Em uma das conversas expostas na rede, ele pergunta: "Mãe, de que cor é esse vestido?", e envia uma foto do vestido azul e preto que no fim de fevereiro virou "meme" na internet. A mãe não entende nada e diz: "Que vestido é esse?? João Henrique, vira homem!".

Os mal-entendidos que fazem sucesso na internet são causados por um choque de gerações, segundo Regina de Assis, consultora em educação e professora aposentada da Universidade do Estado do Rio de Janeiro.

"Há diferenças no jeito de se relacionar. Os mais velhos ainda entendem que a relação olho a olho é insubstituível", afirma ela.

Isso leva a inevitáveis conflitos, afirma a terapeuta de casais e família Juliana Potter.

"Cada um pensa que seu jeito de usar a internet é o certo. Os adolescentes acham ridícula a forma que a mãe usa as redes sociais, e os adultos não entendem como estar conectado é realmente importante para os jovens."

Um exemplo é o caso de Diogo, 10, filho da economista Mariana Villar, 42.

"Ele inferniza a minha vida pedindo um aparelho com acesso ao WhastApp 50 vezes por dia", diz ela. "Eu digo que ele não precisa, que não tem maturidade para isso, mas não adianta. Ele acha um absurdo ser o único da turma que não tem o aplicativo."

Recentemente, ela deixou o menino acessar o aplicativo do celular dela. "Ele me colocou no grupo dos amigos e eles não gostaram, reclamaram, porque eu ficava vendo as conversas. O papo é assim: um diz 'oi' e todos respondem. Por que precisa de um telefone para conversar isso?"

No outro lado, os jovens riem com as dificuldades tecnológicas dos mais velhos.

"Quando minha mãe tem um dúvida no WhatsApp –como usar maiúscula, como mandar áudio–, eu tento ajudar. Às vezes até discutimos, porque o que parece muito simples para mim é, para ela, muito difícil de aprender, então acabo não tendo muita paciência", afirma a estudante Tais Bronca, 23.

Ela é um dos criadores do blog "Minha mãe no WhatsApp". "Ela se atrapalha com os comandos mais simples. Coloca o celular sem querer no modo avião e depois pergunta por que a rede sumiu."

Tais, porém, enxerga um ponto positivo no uso da internet por outras gerações.

"A minha geração tem o costume de achar que tudo que mãe e pai fazem é brega. Às vezes é implicância, às vezes eles dão motivo –como quando chamam o WhatsApp de ZapZap. Mas é vantajoso que a gente se comunique e que eles treinem a mente para aprender algo novo."

Não é fácil nem para os especialistas propor uma solução equilibrada para essa divergência entre gerações.

"Os jovens não podem viver em um mundo em que não há a contribuição dos mais velhos. Por outro lado lado, não tem como impedir os mais novos de usar as redes sociais. O que precisa ser feito é não deixar os jovens se fecharem na próxima realidade", afirma o psicólogo Cristiano Nabuco, coordenador do Grupo de Dependências Tecnológicas do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas de São Paulo.

Para a psicóloga Maria Apparecida Mamede, professora emérita da PUC-Rio (Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro), não tem como culpar a ferramenta por possíveis conflitos.

Segundo ela, os conflitos são os mesmos de sempre. "Envolvem moral, civilidade, não expor o outro sem permissão." Para resolvê-los, afirma, o mecanismo é o tradicional: diálogo.


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