Folha de S. Paulo


Blogueiras que fazem sucesso em redes sociais lançam livros com dicas de exercício

"Bom dia! Já estou preparando meu omelete pré-treino! Vocês vão ficar aí na cama, na 'derrota'?", pergunta a publicitária Gabriela Pugliesi, 28, aos seus 650 mil seguidores da rede social Instagram, chamados por ela de geração Pugliesi.

Garota-propaganda do próprio estilo de vida, Gabriela virou um sucesso de público graças à divulgação de dicas de alimentação e exercício físico baseadas em sua experiência, que acumula anos de dietas malsucedidas antes da conquista do corpo sonhado -59 kg distribuídos em 1,70 m.

Ela não é a primeira nem a única a divulgar os benefícios da rotina saudável na internet e com isso arrastar uma legião de fãs. O "Instafit", como vem sendo chamada a moda, também é prática da empresária Carol Buffara, 28, que quase sempre antes do Sol nascer anuncia aos seus 285 mil seguidores que já tomou suco de couve e adiantou o treino do dia.

O sucesso dos conselhos fez com que a rotina das duas, também blogueiras, virasse livro. Recentemente, foram lançados "Projeto Carol Buffara" (Arte Ensaio, 166 págs., R$ 49,90) e "Raio X Gabriela Pugliesi" (Réptil Editora, 174 págs., R$ 49,90).

Raquel Cunha/Folhapress
A publicitária Gabriela Pugliesi, 28, que acaba de lançar livro sobre sua rotina
A publicitária Gabriela Pugliesi, 28, que acaba de lançar livro sobre sua rotina

Escritos com a consultoria dos especialistas que as atendem, os livros seguem a fórmula dos perfis da rede social: misturam histórias pessoais e dicas de saúde -o que gera polêmica entre profissionais da área.

"Elas indicam e avaliam produtos sem serem nutricionistas. E não temos como saber se há um vínculo com a marca, já que elas ganham muitos produtos e vivem disso", diz Lara Natacci, da DietNet.

Para o endocrinologista Mario Kehdi Carra, membro da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia, o maior problema é que as recomendações, mesmo que sejam dadas por especialistas, não servem para todas as pessoas.

"Não dá para colocar todo mundo no mesmo balaio. A regulação da fome e da quantidade de calorias necessárias são controladas por muitas substâncias do organismo, a maioria coordenada geneticamente. O que é bom para ela pode não ser bom para você", diz.

Além disso, algumas dicas dadas pelas blogueiras são controversas. Carol Buffara, por exemplo, indica o consumo de água com gotas de limão pela manhã para acelerar o metabolismo. "Não tem esse efeito, não é um emagrecedor e ainda pode ser prejudicial para quem está com a acidez do estômago elevada", afirma a nutricionista Tânia Rodrigues, da RGNutri.

Acostumada a rebater críticas, Gabriela diz que não quer ser especialista em nada, mas sim ser uma "incentivadora".

Alex Argozino/Editoria de Arte/Folhapress

"O livro é um misto de autoajuda e motivação. Meu papel é dar o primeiro empurrão para que, com mais força de vontade, as pessoas busquem por profissionais qualificados. A pessoa precisa adaptar as minhas dicas à realidade dela, sua rotina e seus objetivos."

Sobre a acusação de receber dinheiro em troca de indicar produtos, ela afirma que faz sim parcerias comerciais e que daí retira sua renda, mas que os posts publicitários são sempre sinalizados. "Não faço publicidade de nada que não aprovo, que não vai ser interessante para as pessoas", acrescenta.

Procurada, Carol Buffara não quis dar entrevista. Junto com seu livro, vem um panfleto com as escolhas de produtos da blogueira "para deixar o dia a dia mais bonito, saudável e saboroso". No verso do papel, em letras pequenas, está escrito: "publicidade".

COPO MEIO CHEIO

Entre os especialistas, não há apenas aqueles que advogam contra o "Instafit". O médico do esporte Franz Burini, professor da Universidade Estadual Paulista, vê um lado bom na prática.

"É uma ferramenta de extrema validade para estimular a prática do exercício físico. Elas usam um tom de humor, brincam, e assim incentivam uma rotina mais saudável. Estamos em uma luta mundial contra o sedentarismo e não vejo nenhum governo usando uma estratégia dessa para incentivar a população", opina.

Para Burini, é preciso ver as dicas das blogueiras de uma forma despretensiosa, com cuidado para não generalizar as recomendações. O mesmo pensa a médica nutróloga Marcella Garcez Duarte, diretora da Associação Brasileira de Nutrologia.

"É um exemplo positivo. Muitos hábitos delas realmente beneficiam a maioria das pessoas, como comer mais frutas e verduras, trocar cereais refinados por integrais etc."

Para a nutricionista Fernanda Pisciolaro, membro da Abeso (associação de estudo da obesidade), os seguidores devem ter um cuidado para a motivação não se traduzir em cobrança excessiva.

"Muitas pessoas podem sofrer porque não conseguem fazer tudo o que elas fazem, mas elas vivem disso. Para a maior parte das pessoas ter uma rotina igual é muito difícil", diz. E nem é preciso, de acordo com a nutricionista. "Para ser saudável não é preciso comer tal alimento ou se matar na academia. Tudo tem que ser moderado para fazer bem."


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