Folha de S. Paulo


Coxas hipermusculosas no estilo 'mulher-rã' são febre em academias

A rã é um ser de pele lisa e pernas traseiras fortes. Sem gordura, o desenho dos seus músculos salta à vista. Seu formato parece com o das fêmeas humanas. Pelo menos com certo tipo delas, batizado por Luiza Brunet de "mulher-perereca".

Ao criticar o padrão estético das fêmeas em destaque, na coluna de Ancelmo Gois, em "O Globo", a ex-modelo definiu bem o corpo da moda: ultramusculoso, cinturinha, coxa grossa e (proporcionalmente) canela fina.

Como exemplo do estilo anfíbio, Brunet, 50, que é ex-rainha de bateria, apontou a atual rainha da Mangueira, Gracyanne Barbosa, 29.

Do alto de seus 60 centímetros de diâmetro de coxa, a rainha da vez disse à Folha que achou o comentário "desnecessário", mas não ficou machucada. "Não me considero mulher-perereca. Minha coxa não é tão grossa, é definida. Sou mais atlética, não faço estilo boazuda."

'PESOS SURREAIS'

Bastante criticada publicamente, essa estética meio funk, meio panicat (dançarina do programa "Pânico") e meio perereca mesmo tem muitos admiradores anônimos. Ou admiradoras, melhor dizer.

"Elas querem saber o que faço para ficar assim", diz Gracyanne, que no pós-Carnaval vem dando palestras motivacionais para mulheres em busca de boa forma.

A modelo diz fazer refeições a cada três horas, com muita proteína magra e zero açúcar e sal. E pegar pesado.

"Os pesos que Gracyanne usa são surreais, consegue colocar 200 quilos no agachamento", diz o personal dela, Xande Negão, que se apresenta como "body designer".

Nas academias, o público feminino corre atrás desse estilo de treino e de corpo.

"Todas as mulheres que vejo estão agachando, agachando, agachando. Quem está preparada para agachar tanto e ter essa perna tão grande?", pergunta Mauro Guiselini, professor de educação física da FMU e consultor de academias de São Paulo.

Com ou sem preparo, a demanda por pernões vem aumentando, segundo Guilherme Lacerda, professor de musculação e treinador das academias Runner Brasil.

É o que ele chama de estilo panicat. "As alunas querem esse corpo", diz.

Para atingir seu objetivo, elas treinam mais do que os homens. "Muitas usam tudo o que houver de lícito e ilícito para isso", diz Lacerda.

Entenda-se por tudo de suplementos de proteína a hormônios. "A mulherada está deitando e rolando nos anabolizantes, tomando ou injetando hormônio sem dó", acredita o fisioterapeuta Rafael Guiselini.

Gracyanne nunca fez uso dessas substâncias. O corpão, diz ela, é uma combinação de genética e estilo de vida esforçado. "É como ser atleta; me adaptei bem aos treinos, nunca saio da dieta. Mas sei que é difícil, 99,9% das mulheres não conseguem."

Por mais que se esforcem, há limitações físicas. "Corpo de mulher não foi feito para ter menos que 15% de gordura", opina a preparadora física Fernanda Borges, da Competition, de São Paulo.

Gracyanne está com 6% de gordura corporal. "É percentual de atleta homem", diz Xande, seu "body designer".

Além da proporção de gordura, há um número máximo de fibras musculares que uma mulher pode ter.

"Mesmo que a quantidade de fibras das pernudas seja acima da média, elas chegam a um patamar com treino e dieta e de lá não passam. Dentro dos limites fisiológicos do corpo feminino não dá para ser tudo isso que se vê por aí ", diz Mauro Guiselini.

Pernas respondem muito bem à musculação, segundo Eduardo Netto, diretor das academias Bodytech. Mas para dar o salto da perereca é preciso muita dedicação.

Editoria de Arte/Folhapress

"O treino é feito de séries muito parecidas com as de um fisiculturista: pouca repetição, muita carga, muitas horas malhando. Mas, mesmo com a maior disciplina do mundo, elas não conseguem ficar com as pernas tão grandes. Para isso, é preciso testosterona", diz Netto.

Mesmo sem aditivos, o tipo de treino da "mulher-perereca" é arriscado. Os movimentos e as cargas pesadas podem comprimir as vértebras lombares, lesionar articulações e encurtar a musculatura posterior das pernas.

"No futuro próximo, teremos muitas mulheres-pererecas lesionadas", diz o educador físico Mauro Guiselini.

CULTO E PRECONCEITO

Mais preocupadas com o agora, as alunas apostam nos benefícios, não nos riscos. "É sabido no mercado de fitness que essas mulheres não percebem quando passam dos limites", diz Saturno de Souza, diretor da Bio Ritmo.

Para a modelo Juju Salimeni, 26, o limite é individual. "Cada uma decide o seu. Existe grande preconceito contra o culto ao corpo. São ignorantes que não sabem respeitar o estilo de vida de cada um."

A percepção dos profissionais das academias é diferente. "Hoje, a onda é hipertrofia", diz Netto, da Bodytech.

Saturno de Souza, da Bio Ritmo, concorda: "O preconceito contra a mulher com músculos definidos já passou e o público feminino busca cada vez mais esse visual".

E os homens, o que acham? "Acham esse tipo de corpo atraente. Só consideram masculinizadas aquelas que ficam com ombros e costas largos", diz Souza. As magras, segundo ele, só conseguem impressionar as outras mulheres, não os homens.

Isso pode valer também para as saradas. Em sua pesquisa de doutorado sobre imagem corporal de frequentadores de academia, o professor de educação física Vinícius Damasceno, da Universidade Salgado de Oliveira (Juiz de Fora, MG), observou que em 55% dos casos, o tipo de corpo feminino que a mulher considera mais sedutor não é o que o homem deseja.


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