Folha de S. Paulo


'Aprendi a comer berinjela, que nem conhecia', diz cozinheira em favela

Grávida do quarto filho, Jannaína da Silva, 36, garantia o sustento da família vendendo água no sinal e fazendo faxinas. A comida dentro de casa, em Nova Descoberta, no Recife, era como na maioria das favelas brasileiras. "Antigamente eu comia muita coisa gordurosa."

Sua prima a levou para o Saladorama, negócio social que quer democratizar a alimentação saudável nas comunidades e é finalista do Prêmio Empreendedor Social de Futuro.

"Fui aprendendo, fazendo curso. Aprendi muita coisa", conta a agora cozinheira do restaurante em Nova Descoberta. "Agora tem bastante salada, refogo verdura, não faço muita carne gordurosa, boto tomate, cebola, pimentão. Na comida de casa também."

ESCOLHA DO LEITOR

Com uma gravidez mais saudável, Jannaína já planeja ensinar os novos hábitos para a caçula. "Quando minha filha nascer, vou dar verdurinha a ela. Fazer uma sopinha, com verdura, feijão, jerimum, batatinha, para ela já gostar desde pequena"

Leia seu depoimento à Folha.

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Trabalho hoje em dia no Saladorama. Faço todo tipo de salada. Os clientes ligam, a gente faz e manda para eles. Antes, eu trabalhava fazendo faxina, como empregada doméstica e vendia água no sinal.

Foi a mulher do meu primo que me levou para lá. Fui aprendendo, fazendo curso. Aprendi muita coisa.

As comidas aqui são todas sadias, né?! Antigamente eu comia muita coisa gordurosa. Hoje em dia, já diminui o óleo, o sal, como mais verdura.

Passei isso para comunidade onde eu moro, para minha família, para os meus meninos. É possível ter uma saúde melhor.

Agora tem bastante salada, refogo verdura, não faço muita carne gordurosa, boto tomate, cebola, pimentão. Na comida de casa também.

As verduras ainda estão caras. Tem uma feira aqui que vende todo tipo de verdura que você imaginar. Mas a gente só consegue comprar o mínimo. Antigamente, eu comprava era mais tomate, cebola, pimentão, agora é abobrinha, jerimum, chuchu, beterraba, alface.

O que eu mais gostei no Saladorama foi aprender a comer berinjela e abobrinha, que eu não conhecia. Aprendi a fazer lá. Com a berinjela, faço ratatouille no forno. A gente corta a berinjela em rodela, tempera com cominho, extrato de tomate, queijo, refoga ele todinho e bota no forno. Nunca imaginei que ficasse igual uma carne. É gostoso que só, parece um bife à milanesa quando você está comendo.

De vez em quando, faço em casa também. No começo, meus meninos não gostaram, mas até minha vizinha faz agora. Ninguém aqui na comunidade comia esse tipo de coisa. Achavam diferente, aprenderam através do meu trabalho.

GESTAÇÃO SADIA

Para minha gravidez, isso faz bem também. Cozinho mais verdura para mim e como menos comida gordurosa. Não estou podendo comer muito sal. A médica pediu para diminuir comida tipo macarrão, feijão. Aí eu refogo as verduras, cozinho na cuscuzeira.

Tenho quatro filhos, com essa que vai nascer agora. Eu engordei cinco quilos nessa gravidez, bem menos que nas outras. É uma gravidez mais saudável. Agora, por causa da idade, estou com problema de pressão, por isso fui diminuindo mais a gordura para controlar.

Quando minha filha nascer, vou dar verdurinha a ela. Fazer uma sopinha, com verdura, feijão, jerimum, batatinha, para ela já gostar desde pequena. Aos meus meninos eu não dava nada disso, eles não gostavam de verdura de qualidade nenhuma.

Quando era pequeno, eu dava bastante cuscuz, feijão, arroz, macarrão e carne. Só isso que eles comiam. Aí de tarde era iogurte e biscoito. Depois mudei e eles começaram a gostar das verduras, hoje em dia eles gostam.

Meus meninos não são mais de cachorro-quente não, a 'salsichinha' eles não gostam mais. Aí eu faço um sanduíche para eles, boto alface, tomate, cebola para eles comerem à tarde. Antes, era muito biscoito, cortei.

Achei bom quando ouvi falar dessa história de restaurante de salada na comunidade. A gente aprende muita coisa sobre a saúde, sobre todo tipo de verdura. Eu não gostava de beterraba, hoje em dia eu gosto. Ralo ela e boto em cima da salada ou então cozinho só no vapor. Nem precisa botar sal.

Eu não via, na televisão, falando sobre alimentação saudável. Eu não dava nem atenção, nem ligava para isso. Só vim aprender isso tudinho mesmo através desse meu emprego.

Fiquei feliz [com o restaurante todo montado], fiquei muito emocionada. Graças a Deus vou voltar a trabalhar lá de novo [depois da licença maternidade]. Lá, a gente tem muitas comidas diferentes. No futuro, pode até abrir um negócio para vender na comunidade.


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