Folha de S. Paulo


A tecnologia a serviço das mulheres empreendedoras nas favelas

A violência nas favelas está sempre na mídia. E apesar das tentativas nos últimos anos para mudar esse cenário, não foram realizadas ações sociais para mudar a vida de quem reside nestas áreas. Só na cidade do Rio de Janeiro, por exemplo, são cerca de dois milhões de pessoas vivendo em favelas.

Analisando o perfil demográfico destas áreas observamos que nelas existe uma quantidade enorme de mulheres, cerca de 40% segundo o IBGE, como únicas responsáveis pelo sustento dos filhos. São mulheres em sua maioria com baixo nível de escolaridade, que não tem acesso a empregos qualificados e lutam sozinhas para sustentar a família.

Muitas destas mulheres enveredam pelo caminho do empreendedorismo por necessidade, como única fonte de renda, ou para complementar os baixos salários. Tem seus negócios em casa, geralmente nas áreas de culinária, artesanato e beleza.

Capacitar estas mulheres para empreender é um grande desafio. Inúmeros são os problemas envolvidos: a necessidade de conteúdo e linguagem específicos nos cursos, a mobilidade reduzida pela violência, a insuficiência de creches públicas e mesmo o preço das passagens que pesam no bolso.

Conhecedora há mais de vinte e cinco anos desta realidade, a Asplande (Assessoria & Planejamento para o Desenvolvimento) é uma instituição que tem trabalhado com mulheres empreendedoras de inúmeras favelas. A experiência obtida ao longo desses anos levou ao profundo conhecimento das demandas destas mulheres e fez da Asplande uma referência no tema.

Sempre em busca de novas soluções face às mudanças sociais, o crescente número de empreendedoras conectadas à internet pelos celulares fez com que a Asplande passasse a utilizar a tecnologia a favor do aprendizado destas mulheres, minimizando as questões colocadas acima como desafios

Foi criado o Portal Mulheres em Rede Compartilhando Saberes, com o apoio de instituições de renome como a ESPM, Uerj, FGV, Aceleradora de Negócios Sociais do Sebrae, Ashoka, Atados e mais recentemente a UFF.

O portal fornece conteúdo de ensino à distância voltado especialmente para mulheres empreendedoras de favelas e periferias, com linguagem customizada e informações relevantes para este público. O acesso é gratuito pelo site, e é possível assistir a uma rápida introdução sobre as atividades no YouTube.

Tudo isso está formatado para o uso do celular, a principal forma de acesso destas mulheres à internet.

O mais importante é que as próprias alunas são convidadas a participar das gravações, incentivando e valorizando a troca de saberes. Isso porque a experiência de vida de cada uma tem um valor inestimável para o coletivo de mulheres que participam dos cursos. Ou seja, ao lado de especialistas e empresárias de sucesso, participam das gravações mulheres de diversas favelas, trazendo suas dúvidas e contando suas histórias.

Este justamente é um dos grandes diferenciais do portal da Asplande: atuar com e por estas mulheres empreendedoras, utilizando o conhecimento da sua realidade como principal insumo para as ações de capacitação.

Por fim, deve-se ter em mente que o objetivo maior do Portal Mulheres em Rede Compartilhando Saberes não se resume à geração de renda. Antes, tem na sua visão de futuro o seu grande diferencial: conseguir que, por meio da inclusão econômica, seja fomentada a participação destas mulheres na sociedade como verdadeiras cidadãs.

Cientes de seus direitos e deveres, essas empreendedoras materializam a consciência por meio de uma economia mais justa e solidária, capaz de modificar as relações sociais e construir uma sociedade mais igualitária e justa.

ELENA MARTINIS é especialista em empreendedorismo feminino, autora do livro "Mulher de Negócios - Faça sua Empresa Acontecer" e coautora do livro "Ensino de Empreendedorismo no Brasil"


Endereço da página: