Folha de S. Paulo


Pelo fim do vale-tudo

Nesses tempos em que todos os dias são divulgadas novas e estarrecedoras notícias a respeito de relações pouco institucionais entre dirigentes de empresas privadas e membros do governo e parlamentares brasileiros, demos início a mais um capítulo do que agora parece ser uma crise sem fim.

Nunca as nossas instituições estiveram tão desacreditadas e, com as revelações dessas últimas semanas e seus possíveis desdobramentos, muito provavelmente a esperada retomada da economia e o retorno a um cenário financeiro mais positivo foram atrasados por um prazo indefinido.

Entretanto, por mais que seja sofrido e por mais que doa, chegou a hora de enfrentarmos e realmente tratarmos da doença que nos assola.

A propalada máxima de que "é corrupto, mas está estabilizando a economia" que, no fundo, não passa de uma versão moderna do "rouba, mas faz", também tem que acabar.

Precisamos, enfim, colocar nossos valores éticos e humanos acima de todos os fatores monetários e materiais. Já é passada a hora de criarmos, de fato, um novo país.

E, em um momento como esse, não é mais possível que nós, do setor privado, nos isentemos da nossa responsabilidade ante ao que está acontecendo.

Quando minha empresa atravessa a fronteira do que é ético para maximizar meus rendimentos; quando minha instituição financeira oferece produtos que incluem ações de empresas envolvidas em escândalos de corrupção ou que utilizam mão de obra escrava com a desculpa de que "estão no índice da Bolsa"; quando meus investimentos pessoais estão alocados nesses produtos porque oferecem liquidez e retorno "garantido", é preciso que eu entenda que, ao fazer isso, de forma passiva ou ativa, estou contribuindo para a manutenção dessa situação.

Estamos em uma etapa histórica em que somos impelidos a ir além. Somos impelidos a não ignorar mais o que estamos criando com nossas decisões econômicas do dia a dia.

É preciso que cada um se pergunte se está contribuindo para criar uma realidade melhor para o Brasil com todas as suas escolhas. Se não estiver, é preciso criar um plano para se chegar até lá. Nossas decisões de investimento criam o futuro que nós e o país vamos viver, estejamos conscientes disso ou não.

No mercado dos investimentos de impacto, em ascensão no Brasil e no mundo, a preocupação com essas questões é fundamental e prioritária.

As nossas decisões de investimento consideram como fator determinante a resposta à pergunta: estamos contribuindo para a criação de uma realidade melhor? Até que 100% do capital investido esteja operando para tornar o mundo um lugar melhor não só para mim, mas para todos, seguiremos trabalhando.

No atual cenário político e econômico, esse mercado precisa ainda mais do apoio dos investidores.

É preciso que estejam sintonizados com essa causa, que apoiem os fundos que já estão operando nessa lógica, que invistam nas empresas comprometidas com um Brasil mais justo e ético, e que também criem seus próprios veículos de investimento focados em impacto, juntando-se a esse movimento crescente e hoje tão necessário.

Dessa maneira, estaremos juntos nessa batalha para criar um país melhor para todos os brasileiros. De uma vez por todas!

DANIEL IZZO, é fundador e diretor executivo da Vox Capital, a primeira e mais ativa gestora de investimentos de impacto no Brasil; seu propósito é criar um mundo em que negócios são agentes de transformação social positiva; é parceira do Prêmio Empreendedor Social desde 2016


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