Folha de S. Paulo


Falsos atrasados não convencem na porta do Enem deste ano

Os portões do local de prova se fecham às 13h e põem fim ao sonho de quem esperava conseguir uma vaga em uma universidade com a nota do Enem, mas não chegou a tempo. Algumas pessoas até chegam correndo depois disso, afobadas. Mas, em vez de serem recebidas com flashes e entrevistas, o que ouvem são os gritos de uma multidão: "Fake! Fake! Fake!"

Os "falsos atrasados" do Enem, que em outros anos já pregaram peça na internet e em jornalistas, desta vez não entusiasmaram muitos que esperavam na porta da Uninove, na Barra Funda, zona oeste de São Paulo.

Atrasados Enem 2017

"Tem uns que não convencem", diz o auditor Nelson de Jesus, 33, que promete se fingir de atrasado no ano que vem. Ele reuniu amigos para rir de quem chega atrasado na prova. "Do lado de uma estação de metrô, de acesso fácil, a pessoa perde a prova? Não dá", afirma, enquanto bebe uma lata de cerveja.

"Eu vim de Carapicuíba e gastei 40 minutos. Não existe desculpa. Viemos prestigiar mesmo", diz o amigo dele Alexandre Gomes, 33.

Depois que os portões foram fechados, o grupo foi rir de Gabriele Oliveira, 18, que chorava na porta da universidade por não poder fazer a prova. Mas foram surpreendidos quando ela disse que, na verdade, chegou ao local às 10h40. Ocorre que na subida para as salas, conta ela, o RG que segurava em uma das mãos caiu no vão de uma escada rolante e ela não conseguiu encontrá-lo mais. "O pessoal pergunta se eu não tenho humor. Eu to passando mal, tô tremendo, como vou ter humor?", questiona.

"Eu não estava atrasada, mas nem todos se atrasam porque querem. Às vezes o metrô para, o ônibus quebra. Cada um tem seus motivos".

Thiago Amâncio/Folhapress
Gabriele Oliveira, 18, que enfrentou problemas e não conseguiu fazer a prova do Enem deste ano
Gabriele Oliveira, 18, que enfrentou problemas e não conseguiu fazer a prova do Enem deste ano

Gabriele quer estudar pedagogia e apostará agora suas fichas nos vestibulares da USP, PUC e Mackenzie. "Nunca entrei em tanto desespero. Procurei em tudo e não achei. Tentei explicar para a coordenação, mas acho que eles não acreditaram em mim. Bate um desespero tão grande, você se preparou o ano inteiro e não pode fazer a prova."

REDAÇÃO

O tema da redação do Enem deste ano é "Desafios para a formação educacional de surdos no Brasil", de acordo com o Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira).

Por determinação judicial, redações que contiverem trechos com desrespeito aos direitos humanos agora não podem mais receber mais nota zero.

A decisão é da ministra Cármen Lúcia, que entendeu que proibir o desrespeito aos direitos humanos, como prevê o edital da prova, implicaria limitar a liberdade de expressão. "Não se combate a intolerância social com maior intolerância estatal", escreveu, na decisão.

No final de outubro, a Justiça Federal determinou a suspensão da regra do Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) que dá nota zero, sem direito à correção de seu conteúdo, para a prova de redação que seja considerada desrespeitosa aos direitos humanos. A decisão foi tomada em caráter de urgência a pedido da Associação Escola Sem Partido, tendo em vista a proximidade da realização das provas.

Em julgamento, a 5ª turma do TRF-1 (Tribunal Federal da 1ª Região) acolheu o pedido da Associação Escola Sem Partido por 2 votos a 1.

Na ação, a Associação Escola Sem Partido sustenta que "nenhum dos candidatos deveria ser punido ou beneficiado por possuir ou expressar sua opinião" e que não existe um referencial objetivo sobre os parâmetros adotados, "impondo-se aos candidatos, em verdade, respeito ao 'politicamente correto'".

A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, pediu na sexta-feira (3), que o STF suspendesse a decisão liminar do TRF-1.

Dodge argumentou que a medida do TRF1 viola a segurança jurídica e que sua suspensão evitaria "grave lesão à ordem pública" e "o desnecessário tumulto na preparação dos candidatos".

O pedido foi protocolado no mesmo dia que o Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira), órgão do MEC (Ministério da Educação), apresentou um recurso com o mesmo objetivo ao STF, em caráter de urgência, já que a prova de redação do exame será aplicada a mais de 6 milhões de candidatos neste domingo.


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