Folha de S. Paulo


Após pressão e manobra de tucanos, Assembleia cria CPI da merenda

Em uma manobra para ampliar o foco de uma CPI da merenda na Assembleia, deputados da base do governador Geraldo Alckmin (PSDB) recolheram 74 assinaturas para instaurar uma comissão que vai investigar, além dos contratos suspeitos com o Estado, mais de 20 prefeituras.

Deputados da base do governo apresentaram na tarde desta terça-feira (10) uma proposta de CPI da Merenda alternativa à feita pelo PT, que não prosperou.

Com 74 assinaturas, a criação da CPI proposta pela base do governo está garantida.

Na proposta do PT, o foco era nos contratos da Coaf –cooperativa suspeita de fraudes e de pagar propina a políticos– com a Secretaria de Educação do Estado.

Agora, todas as compras entre cooperativas de agricultura familiar com prefeituras e com o governo poderão ser analisadas.

"Não adianta investigar só o Estado. As prefeituras também recebem recursos públicos e devem ser investigadas", disse o deputado Orlando Morando (PSDB). Deputados da base consideraram que a proposta do PT –que só conseguiu recolher 26 das 32 assinaturas necessárias– era muito parcial e tinha o intuito de desgastar politicamente o governo.

A decisão dos deputados governistas ocorre uma semana após a Assembleia ser ocupada por alunos e membros de entidades estudantis que pediam a abertura da investigação. Desde o fim de março, estudantes secundaristas têm ocupado Etecs (escolas técnicas) e escolas estaduais reivindicando, entre outras coisas, a criação da CPI.

Na avaliação de deputados da oposição, segundo a Folha apurou, essa nova proposta de CPI tira o foco do governo Alckmin e do presidente da Assembleia, Fernando Capez (PSDB), citado por delatores como um dos beneficiários do esquema de propinas. Capez nega envolvimento com o escândalo.

Segundo o líder do PT na Assembleia, Zico Prado, a oposição vai agir para que a comissão não perca o foco. "Se o município tem problema, nós não vamos deixar de punir, mas não vamos também deixar que o governo foque do lado dos municípios", disse. "É por isso que queríamos a nossa, mas não podemos ficar fora de uma CPI só porque não é a nossa".

"No nosso ponto de vista, essa CPI vai funcionar porque queremos que a sociedade toda acompanhe, que a molecada venha para cá", completou Prado.

'PIZZA'

Para o deputado Carlos Giannazzi (PSOL), a abertura da CPI é resultado da pressão de estudantes e movimentos sociais. Mas ele ressalta o risco de a CPI "acabar em pizza".

"Está claro que o governo vai controlar a CPI, vai indicar o relator. Vamos ter de pressionar para que haja as convocações para esclarecimentos", disse ele no final da tarde, antes de conhecer a proposta. "Se abordar a Secretaria de Educação e a Casa Civil, vamos assinar".

A ideia da base de incluir as prefeituras no escopo da CPI é "fazer um contraponto" ao governo do Estado, porque algumas estão sob comando do PT, como São Bernardo do Campo (Grande SP). Conforme a reportagem apurou com deputados, a ampliação da finalidade da CPI pode inviabilizar a investigação de possíveis ilegalidades envolvendo o governo.

Questionado sobre a viabilidade de investigar contratos com 22 municípios e com o Estado no prazo regimental de uma CPI –120 dias, prorrogáveis por mais 60–, o deputado Estevam Galvão (DEM) disse que, se a Lava Jato consegue, a Assembleia também.

"É uma CPI dura, firme e honesta, não é eleitoreira, não", afirmou.

Para Galvão, que assina o novo requerimento de CPI, "não faz sentido" investigar apenas contratos de fornecimento de suco de laranja para o governo do Estado, porque "a merenda é muito mais ampla". Segundo ele, a ideia da base já era instaurar uma CPI. "A ocupação [de alunos] na semana passada acabou acelerando as coisas."

De acordo com as investigações da Operação Alba Branca, do Ministério Público e da Polícia Civil, a Coaf fraudou contratos com o Estado e com ao menos 22 prefeituras, mediante pagamento de propina a agentes públicos e políticos.


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