Localizada na reserva Chico Mendes, no meio da Amazônia, a escola Airton Sena recebe todo mês um coordenador pedagógico, que percorre 40 quilômetros floresta adentro para chegar ao local.
O objetivo da visita é ajudar o professor a planejar as aulas. Foi o modo que o Acre encontrou para melhorar o seu nível de ensino.
A rede estadual acreana é a terceira melhor do país no fundamental 2, mostra o Ideb (indicador do desenvolvimento da educação), atrás da líder Minas e de Goiás.
"Esse planejamento é importante porque tira o professor do automático", diz Denis Brito, coordenador das escolas de difícil acesso de Brasiléia -é ele quem faz as visitas.
O acompanhamento, repetido em todo o Acre, é feito em duas fases. A cada 15 dias o professor se reúne com o coordenador para debater problemas da sua matéria. E pelo menos uma vez por bimestre todos os docentes da escola participam do encontro interdisciplinar. Neste último, o foco é como levar o ensino de português e matemática para as outras matérias.
"Não há mais um palco, em que o professor vai falar. O estudante precisa entender o que é ensinado, ver que as matérias se conectam e fazem sentido umas com as outras", diz Francisco Lira, coordenador da escola estadual Padre Diogo Feijó, de Rio Branco.
Para o secretário de Educação do Acre, Marco Brandão, é preciso que o ensino de uma matéria esteja presente na outra. "Você tem que fazer com que nove professores de diferentes formações pensem de forma integrada e transdisciplinar. Daí a necessidade de acompanhamento."
Em Brasiléia esse planejamento ajudou o município, que fica a 150 quilômetros de Rio Branco e faz divisa com a Bolívia, a ter a melhor nota do Estado: 5,3. Para comparação, São Paulo tirou 4,4.
A proximidade com a fronteira e o bom desempenho atraem estrangeiros para as escolas locais.
O boliviano Luis Armando Werthemeier matriculou seu filho em Brasiléia, em vez de optar por uma escola em seu país. "O ensino é muito melhor, é visível", diz. O menino se formou ano passado no nono ano e ganhou bolsa para fazer o ensino médio no Rio. "A formação que ele teve aqui foi forte", diz o pai.
É comum ver garotos com uniforme e mochila atravessando a ponte que liga Brasiléia à boliviana Cobija, como Heinny Pamela, 13. "Gosto de estudar aqui, as aulas de português são legais", diz. Ela mora do lado boliviano a faz o trajeto de bicicleta.
"Alguns alunos chegam com dificuldade em português, mas trabalhamos no início para resolver", diz Ana Maria Cruz, diretora da escola estadual Odilon Pratagi, de Brasiléia, que tem o segundo melhor Ideb do Acre.
Segundo ela, a melhoria do ensino tem a ver com exames e simulados que a escola faz. Com isso, a dificuldade de cada um é identificada. "Fazemos um diagnóstico com a habilidade que falta ao aluno e que ele já deveria saber. Assim, os professores vão direto ao problema", diz Cruz. "Se você não resolve a dificuldade logo no sexto ano, isso vai refletir lá na frente."
Pensando nisso a escola Valeria Bispo Sabala, na zona rural de Brasiléia, implementou reforços em português e matemática para alunos do sexto ano. O objetivo é gerar resultados visíveis a longo prazo, quando a turma acabar o nono ano.
"Começamos identificando os problemas dessa série, e um professor vai trabalhar para resolver já. Se deixamos para depois, isso vai explodir lá em 2019, quando eles se formarem" explica o diretor, José Henrique Ribeiro.
No Acre, os diretores das escolas estaduais são eleitos pela comunidade (alunos, pais, professores e funcionários) por quatro anos, com direito a uma reeleição. Precisam ser aprovados em um processo da secretaria e podem sofrer "impeachment" em caso de má gestão.
Para o secretario Brandão, isso dá mais autonomia à escola. "A direção pode estabelecer as prioridades, tanto financeiras quanto pedagógicas, e criar projetos ligados à realidade em que está."
'COITADINHOS'
Primeiro lugar no Estado, a João Mariano da Silva, em Rio Branco, usa essa liberdade de várias formas. Há desde aula de história com canções, que ocorre no pátio, a jogos de xadrez no intervalo.
Para melhorar seus resultados (foi de 3,6 em 2005 para 5,9 em 2013), a escola criou um programa que unifica os dados dos alunos, da frequência às notas. Com isso, é possível fazer gráficos que mostram onde há problemas. E resolvê-los.
"Antes, os alunos não tinham pretensões, eram tratados de coitadinhos, porque moram em um local muito pobre. Mudamos isso com tecnologia", diz o ex-diretor e atual coordenador de ensino, Wilson Guimarães.
O colégio fica no Taquari, periferia afetada por violência e alagamentos.
Nascida e criada no bairro, Neiva Silva estudou no colégio, se formou em letras e hoje leciona ali. "O aluno esquece os problemas de fora quando está na escola, isso ajuda."
Aluna do nono ano, Joice Lima, 14, concorda. "A escola incentiva para que a gente tenha uma profissão."
Um salto maior no ensino do Estado emperra nos salários baixos. "O professor precisa trabalhar de manhã, tarde e noite", diz Alcilene Gurgel, presidente do SinproAcre (sindicato dos professores da rede estadual).
O próprio secretário reconhece que o salário não é o ideal. "Não pagamos o que gostaríamos, mas o que é possível", diz Brandão.
O Acre enfrentou greve de professores em 2015, que acabou sem aumento. Um acordo prevê alta de 18% em 2017.
Outro problema, diz a representante do sindicato, é a falta de estrutura das escolas, a maioria não conta com sala de informática ou quadras. Algumas escolas também sofreram com roubo de merendas e alagamentos.
"Não temos as escolas mais bem equipadas, então o jeito é usar bem o que temos e não desperdiçar o tempo dos professores", diz Guimarães, da João Mariano da Silva.