Folha de S. Paulo


Questões de português cobraram gramática 'clássica', dizem professores

Os 23.908 candidatos que prestaram a segunda fase da Fuvest neste domingo (10) encontraram uma prova difícil, com questões interdisciplinares, com cobrança de gramática formal e com uma proposta de redação abrangente, que exigiu concentração em seus textos de apoio.

O exame, um dos maiores do país, seleciona estudantes para 9.568 vagas na USP (Universidade de São Paulo) e 120 no curso de medicina oferecido pela Santa Casa.

Para Célio Tasinafo, diretor pedagógico do cursinho Oficina do Estudante, de Campinas (SP), as questões de português e literatura foram "muito exigentes" e cobraram do aluno muitas referências de conhecimento. "Não foi uma prova tranquila e não houve concessão para questões mais fáceis. Chama a atenção a quantidade de perguntas interdisciplinares, que envolviam saber tanto sobre o conteúdo de um livro como de história ou de geografia", diz.

O professor Lílio Paoliello, diretor pedagógico do Cursinho da Poli, avalia que literatura estava mais "refinada". "Desde o ano passado, percebemos a literatura comparada como ponto importante. Na questão em que se pegou uma situação comum entre [os livros] 'Memórias de um Sargento de Milícias' e 'O Cortiço', e pediu-se para analisar o erotismo, o aluno tinha de ter segurança nas leituras para emitir opinião."

Para Eduardo Calbucci, supervisor de português do Anglo, as questões de língua portuguesa e literatura, Calbucci diz que as perguntas estavam dentro do padrão do que se espera da Fuvest. As seis primeiras questões versavam sobre gramática e texto e as quatro últimos de literatura, essas um pouco mais difíceis.

"Quem estudou olhando exames anteriores não foi surpreendido. As questões de literatura foram mais desafiadoras porque exigiam a leitura prévia dos nove livros obrigatórios, e elaboração de respostas mais longas e articuladas. Além disso, eles fizeram relações entre as obras e o conhecimento a respeito de Teoria Literária e a história da Literatura. Essa combinação faz com que as questões sejam mais difíceis. Se houve mudança, o desafio maior foi na redação", disse Calbucci.

Já para o coordenador de português do Grupo Etapa, Heric Palos, a prova de linguagem foi bem elaborada e exigia bastante conhecimento, mas não pode ser rotulada como difícil. "A parte de linguagem cobrou gramática mais convencional –como o uso de tempos verbais, orações subordinadas, por exemplo–, que normalmente os alunos relegam a segundo plano durante os estudos. As questões de literatura foram bem exigentes e cobraram análise, entendimento e leitura. A Fuvest só deixou de cobrar poesia", disse Palos.

Os especialistas foram em sentido comum no parecer sobre as perguntas de gramática. Eles afirmam que as questões envolveram cobranças de conteúdos mais "clássicos" como flexões verbais e com menos análise da língua.

UTOPIA

Para ir bem no tema da redação –"As Utopias: indispensáveis, inúteis ou nocivas", de acordo com os professores de cursinho, o candidato tinha de se concentrar nos argumentos dos textos de apoio e criar uma boa estrutura textual.

De acordo com Lu Cunha, do Objetivo, "o tema foi abstrato e difícil, embora houvesse textos de apoio. Temas que saem do cotidiano dão menos argumentos para o aluno." "Acho que fui bem porque li [o livro de Aldous Huxley] 'Admirável Mundo Novo'. Falei contra as utopias. É mais importante se preocupar com o agora," diz Erick Tengan, 19, que tenta vaga em ciências biológicas.

Para Palos, o diferencial da redação este ano foi a seleção dos textos de coletânea. "O que chama mais a atenção não foi o tema, que é bem oportuno, mas a coletânea de textos realmente ajudou os estudantes a construir um caminho sólido e consistente para elaborar a redação."

Calbucci diz que a redação da Fuvest voltou a abordar temas mais abstratos e filosóficos, como fazia na década de 1990. "Este ano, a Fuvest deixou os temas ligados ao mundo atual, como havia explorado nos vestibulares dos últimos três anos, e voltou a abordar temáticas mais abstratas e filosóficas. Acredito que essa mudança se deva a celebração dos 500 anos de publicação do livro "Utopia", de Thomas More, um dos mais importantes da filosofia renascentistas", disse Calbucci.

Os textos de apoio continham passagens de filósofos e de pensadores como Carlos Drummond de Andrade. Apesar de desafiador, o tema foi resumido pela banca em forma de uma pergunta, o que acaba ajudando os estudantes a formularem melhor sua redação. "A pergunta é um elemento facilitador, pois você espera que a redação seja uma resposta para essa pergunta. O que não significa que a prova não tenha sido mais difícil. Alguns alunos têm mais facilidade, mas para a maioria o tema foi muito desafiador."


Endereço da página:

Links no texto: