Folha de S. Paulo


Após 55 dias, alunos deixam escola símbolo das ocupações em São Paulo

Após 55 dias, estudantes da escola Fernão Dias Paes, em Pinheiros (zona oeste de SP), desocuparam a unidade, que se tornou símbolo do movimento contra a reorganização escolar.

Cerca de 100 alunos saíram da escola, carregando roupas, e sentaram nas escadas que levam à entrada do colégio. Agora prometem protestar contra o aumento da tarifa de metrô, ônibus e trem.

Em jogral, leram um "termo de entrega", firmando o compromisso de consertar ou substituir, ao longo de 2016, itens que foram danificados durante a ocupação, como espelhos e uma mesa.

Os estudantes gritaram palavras de ordem e reforçaram o compromisso contra o reajuste da passagem: "Deixamos a ocupação, mas continuamos na luta contra a reorganização e agora contra o aumento da tarifa", gritaram.

"Estamos deixando a escola, mas não estamos deixando a luta", diz o aluno Heudes Oliveira, 18. Segundo ele, se o governo propuser a reorganização novamente em 2016, as escolas podem voltar a ser ocupadas.

A Fernão Dias Paes foi a segunda a ser ocupada no Estado, no dia 10 de novembro de 2015, pouco depois da escola estadual Diadema (Grande SP). O colégio acabou concentrando as principais lideranças, em um tipo de quartel-general do movimento. No total, 196 escolas foram ocupadas. Hoje, há cinco.

A diretora da escola, Andréa Sbrana, foi afastada do cargo por problemas de saúde no início deste ano. A Secretaria da Educação afirmou que ela será substituída pela vice-diretora do colégio.

Sbrana foi alvo de críticas por parte dos alunos durante a ocupação. Diziam, por exemplo, que era ela quem escolhia os estudantes que faziam parte do grêmio estudantil do colégio.

A Folha tentou falar com a diretora, mas ela se recusou a dar entrevista.

No interior da escola, havia uma pilha de roupas de alunos que ocuparam a unidade e de "achados e perdidos". "O que sobrar, vamos doar", diz o estudante Chico Braga, 16, que é de outra escola, mas prestou apoio à Fernão Dias.

Os alunos cobriram a porta da coordenação com papéis sulfite, com frases como "Fernão será diferente depois da luta secundarista", "Queremos usar a sala de informática" e protestos contra o aumento da tarifa de ônibus, trem e metrô.

Livros didáticos nunca usados foram empilhados em forma de labirinto, depois da porta da escola até a sala da diretora. "Eles falam que não têm verba, mas tem livro sobrando", diz o estudante Cauê Borges, 16. "Agora, o que atrapalha nossa vida vai atrapalhar a diretora simbolicamente."

A Secretaria da Educação afirma que os livros, dados pelo Ministério da Educação, serão distribuídos no início do ano letivo de 2016.

Um laboratório de química da escola aparenta não ter sido usado há alguns anos: há tubos de ensaio e outros materiais empoeirados e produtos químicos vencidos, como um frasco de ácido sulfúrico cuja data de validade é 2006. "Estudo no Fernão há quatro anos e tive duas aulas no laboratório. A última foi em 2013", diz a aluna Ana Beatriz Chaves, 15, que também reclama do abandono das salas de teatro e de informática.

Em nota, a pasta estadual da Educação afirma que uma repórter da Folha, no início da ocupação, permaneceu quatro dias na unidade e não levantou essa situações. Afirma, também, que os alunos "criam fatos e cenários para ganhar espaço".

Pais de alunos acompanharam a desocupação. "Sinto orgulho do meu filho. Os estudantes tiveram muita responsabilidade, cuidando bem de uma escola desse tamanho", diz a costureira Tereza Cristina Lopes da Rocha, mãe de um estudante do 2º ano do ensino médio.

Segundo ela, o filho não dorme em casa desde a primeira noite da ocupação, no dia 10 de novembro.

PROTESTOS

O movimento de ocupação surgiu como protesto contra a medida da gestão Geraldo Alckmin (PSDB) que fecharia 92 unidades de ensino e transferiria 311 mil alunos. Segundo o governo, há escolas ociosas, com menos alunos do que sua capacidade.

As ocupações e protestos nas ruas fizeram com que Alckmin suspendesse a mudança, o que resultou também na saída do então secretário de Educação Herman Voorwald. Segundo o governo, depredações em 81 escolas causaram prejuízo de R$ 1 milhão.

Apesar do recuo, parte das ocupações foram mantidas. Os alunos pediam a revogação definitiva do plano, e não apenas sua suspensão.

Alunos de escolas ocupadas passaram o Natal e o Ano-Novo nas unidades. Na Fernão Dias, alunos fizeram uma ceia em volta de uma fogueira no pátio do colégio. Heudes Oliveira diz esperar que outras reivindicações sejam atendidas. Entre elas, a retomada de uma oficina de teatro que havia aos sábados na escola.

Colaborou LEANDRO MACHADO


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