Folha de S. Paulo


Há um mês na escola, alunos limpam, cozinham e até instalam chuveiros

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Acampados na escola há quase um mês, estudantes da E.E. Diadema, na Grande São Paulo, descobriram espaços sem uso, como uma sala cheia de cadeiras e mochilas novas e um vestiário com capacidade para oito chuveiros, que havia virado um almoxarifado. Foi nele que os alunos instalaram duas duchas, as únicas com água quente no prédio, doadas pela comunidade.

"A gente se encontrava com alunos de outras escolas nas manifestações de rua e falava brincando: se aqui não der certo, vamos dormir na escola. Foi o que aconteceu", conta Rafaela Boani, 16, do 2º ano do ensino médio.

A E.E. Diadema foi uma das primeiras escolas estaduais ocupadas por alunos desde que o governo Geraldo Alckmin (PSDB) anunciou, em setembro, seu plano de reorganização do ensino, que previa para 2016 o fechamento de 93 escolas e o remanejamento de 311 mil alunos.

Nesta sexta (4), após 26 dias de escolas ocupadas e sob protestos estudantis diários nas ruas da capital, Alckmin suspendeu a reorganização escolar. O governador afirmou que recuou para "aprofundar o diálogo" sobre a reestruturação em 2016.

"Nós entendemos que devemos aprofundar o diálogo, vamos dialogar escola por escola", disse, em pronunciamento na sexta. Segundo o governo, a mudança eliminaria salas de aula ociosas e facilitaria a gestão dos colégios.

Com ela, 93 escolas seriam fechadas, para depois serem disponibilizadas para outros equipamentos educacionais, como creches, Etecs e Fatecs. "Essas escolas serão reformadas. Não com o dinheiro da nossa secretaria, mas o governo do Estado de São Paulo tem esse planejamento", disse à Folha na quinta (4) a secretária-adjunta da Educação, Irene Kazumi Miura.

OCUPAÇÕES

Antes da suspensão da reorganização escolas, o número de instituições ocupadas crescia diariamente. De acordo com balanço da Secretaria de Educação, na quinta-feira (3), eram 196 em todo o Estado. No total, a rede estadual tem 5.147 escolas e 3,8 milhões de estudantes.

A Folha acompanhou a movimentação dos estudantes em cinco delas no último dia 21. Apesar de a organização ser diferente em cada uma, uma característica em comum é a designação de equipes para dar conta das tarefas cotidianas.

Na E.E. Fernão Dias (zona oeste paulistana), por exemplo, há um grupo responsável pela segurança e outro, pela limpeza. "Nunca vi a escola tão limpa assim" diz Larissa Cruz, 16, enquanto varre a escada que dá acesso ao prédio principal.

No andar de baixo, seu pai, Rabsaque Cruz, 48, acompanha-a com o olhar. "A gente se preocupa com os filhos e com a reação da polícia, mas acho importante esse movimento. Há muita coisa errada", diz o aposentado, que diariamente vai ao colégio para visitar os dois filhos que participam do movimento.

Nas escolas Presidente Salvador Allende Gossens (zona leste) e João Kopke (centro), os alunos impediram a entrada da reportagem. A resolução foi tomada, segundo eles, depois de uma reunião com todos os integrantes da ocupação que optaram por não permitir a entrada da imprensa e assim ter maior controle das informações que são veiculadas sobre o movimento.

Ali, bem como nas outras instituições visitadas, os estudantes ressaltam que todos os temas são deliberados. "Não temos líderes, aqui é um coletivo, e as decisões são tomadas a partir de votações nas assembleias. Não entra adulto nem professor, apenas aluno", explica uma jovem de 17 anos, que participa da ocupação na E.E João Kopke e não quis se identificar.

LÍGIA ROCA, MARCUS LEONI, MAÍRA CABRAL, RENAN LOPES e RICARDO LERMAN fizeram o 1º Programa de Treinamento em Fotojornalismo e Vídeo da Folha, patrocinado por Friboi, Odebrecht e Philip Morris Brasil.


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