Folha de S. Paulo


Com ocupações, prova nas escolas estaduais de SP tem sua pior adesão

Avaliação oficial do ensino na rede estadual paulista, o Saresp teve neste ano a menor participação de alunos desde ao menos 2007.

A menor presença ocorreu em meio a escolas ocupadas por estudantes e movimento de boicote ao exame, em protesto contra a reorganização da rede proposta pelo governo Geraldo Alckmin (PSDB).

A situação se agravou nos últimos dias, após o governo cancelar bônus de servidores de 174 escolas (que estavam ocupadas durante a prova).

Nessas unidades, o Saresp não foi aplicado –ele é a principal baliza para a definição da bonificação. O sindicato docente avalia entrar na Justiça contra a decisão. Não foi informado quantos alunos estudam nessas escolas.

Nesta edição do exame, feito terça (24) e quarta (25), de 1,1 milhão de alunos esperados, 915 mil (80,5%) compareceram. No ano anterior, foram 85,1%, índice que já chegou a 90,3%, em 2009.

Infográfico: Participação de alunos no Saresp

A Apeoesp (sindicato docente) e estudantes das ocupações pregaram boicote em todos os colégios. Por meio de panfletos, visitas e redes sociais, defenderam que alunos não comparecessem ou não resolvessem a prova.

Com o custo de R$ 22 milhões, o Saresp visa basear o pagamento de bônus a servidores, avaliar o sistema educacional e ajudar os colégios a identificar dificuldades.

Coordenador da área de avaliação da Secretaria de Educação, Olavo Nogueira afirmou que os primeiros dados indicam que o boicote "foi pontual", tanto em relação às ausências quanto à não resolução da prova.

Nogueira afirma que a presença registrada neste ano é suficiente para avaliar o ensino da rede estadual.

O coordenador disse que não poderia adiar o Saresp porque a ideia é oferecer os dados já sistematizados às escolas na primeira semana de fevereiro, para que sejam usados em seus planejamentos.

Pesquisador de avaliações educacionais, Ocimar Alavarse, da USP, afirmou que participação abaixo de 90% pode distorcer resultados.

O problema é maior, diz o analista, se os estudantes que faltaram tiverem perfil semelhante: se forem os mais preparados, as médias no exame caem artificialmente; se forem os menos preparados, sobem artificialmente.

Segundo Alavarse, o ideal é que a Secretaria da Educação analise o perfil dos faltosos no Saresp para identificar se será necessário ajuste estatístico nos resultados.

Infográfico: Proporção de participantes no Saresp

PROTESTOS

A reorganização foi anunciada em setembro e deve ser aplicada em 2016. Há três semanas, alunos ocupam escolas em protesto contra a medida. Segundo a Secretaria de Educação, 182 das 5.100 unidades estão bloqueadas.

O governo estadual pretende aumentar o número de escolas com apenas um segmento de ensino (só ensino médio, por exemplo).

A intenção, diz a secretaria, é facilitar a gestão e melhorar o ensino. O plano prevê mudar de colégio 300 mil dos 3,8 milhões de estudantes. E fechar 92 unidades, que ficariam ociosas após a ação.

As faculdades de educação da USP e da Unicamp afirmam que a medida visa apenas economia para o Estado.

A ONG Cenpec destacou o "transtorno" que haverá para as famílias devido à mudança de colégio.

A Secretaria de Educação nega que a reorganização vise cortar custos. E afirma que os alunos não serão deslocados para colégios a mais de 1,5 km de distância.

Segundo o portal "Cruzeiro do Sul", a Justiça em Sorocaba determinou a desocupação de 17 escolas no município do interior. Entretanto, decisão anterior do Tribunal de Justiça de São Paulo considerou que as ocupações são legais, pois são a forma de os alunos abrirem diálogo com o Estado.

Infográfico: Mudanças na educação

BÔNUS

A Apeoesp (sindicato docente) deve acionar a Justiça contra a decisão do governo Geraldo Alckmin (PSDB) de cortar o bônus de todos os servidores de escolas ocupadas -que não foram avaliadas no Saresp nesta semana.

Os sindicalistas afirmam que os professores não podem ser punidos. A ação judicial deve ser decidida na tarde desta sexta (27), em assembleia. "É um absurdo tentar resolver conflito criando outro. O secretário vai criar mais problema com professores e com a comunidade escolar", disse a presidente da entidade, Maria Izabel Noronha.

Para ela, o secretário de Educação, Herman Voorwald, é o culpado pelo início das ocupações e não pode transferir a culpa, prejudicando os professores.

"Ele está provocando tudo isso, de forma autoritária, porque quis fazer mudança com as quais alunos, professores e pais não concordam", disse Noronha.

A Secretaria de Educação diz que houve discussão antes do anúncio da reorganização. Os dirigentes de ensino tiveram um mês para definir os colégios que entrariam no programa e conversar com a comunidade.

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PERGUNTAS SOBRE A REORGANIZAÇÃO

1 - Quais estudos embasaram a decisão do governo? Eles foram divulgados?
O governo afirma que estudos da Secretaria da Educação e Inep (órgão federal) mostram que escolas com um ciclo têm melhores notas. Nenhum dos trabalhos, porém, isola quanto do ganho é resultado especificamente do número de ciclos.

2 - Houve diálogo com pais e alunos antes da decisão?
Segundo o governo, os dirigentes de ensino tiveram 30 dias para conversar com a comunidade escolar. O secretário de Educação, Herman Voorwald, reconhece, porém, que pode ter havido deficiência no processo.

3 - Qual será o destino das 92 escolas que serão fechadas em 2016?
Foram oferecidas às prefeituras e ao Centro Paula Souza (escolas de ensino técnico). Não há definição do que será feito com todas elas.

4 - O ano letivo dos alunos das escolas ocupadas está comprometido?
O governo afirma que serão cumpridos os 200 dias letivos obrigatórios. Assim, as unidades terão de repor aulas quando forem desocupadas.

5 - Quais os efeitos do cancelamento do Saresp nas escolas ocupadas?
As unidades ficam sem avaliação da sua qualidade, e os servidores dessas escolas ficarão sem receber bônus por desempenho.

6 - As ocupações são consideradas ilegais?
O Tribunal de Justiça considerou que as ocupações são válidas, pois têm como objetivo abrir discussão com o Estado sobre a reorganização.

7 - Quantas escolas serão impactadas?
O governo quer dividir parte das unidades por ciclos únicos (anos iniciais e finais do fundamental e o médio). Para isso, pretende transferir 300 mil alunos e fechar 92 colégios.

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BOLA DE NEVE NA CRISE DA EDUCAÇÃO EM SP
Reorganização da rede estadual gera protestos e ocupações de escolas

> 22.set
A Secretaria da Educação previa transferir 1 milhão de alunos em 2016

> 6.out
Começam os primeiros protestos de rua

> 27.out
Governo anuncia pacote mais tímido, com a transferência de 311 mil alunos e o fechamento de 94 escolas

> 9.nov
Com críticas à falta de diálogo, primeiras escolas são ocupadas

> 13.nov
Governo pede reintegração de posse, mas Justiça dá razão aos estudantes

> 15.nov
Tentativa de acordo fracassa, e ocupações explodem

> 24.nov
O Saresp, principal avaliação dos estudantes da rede estadual, é prejudicado. Governo não pagará bônus a professores das 174 escolas ocupadas. Sindicato reage e ameaça ir à Justiça


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