Folha de S. Paulo


Ensino não pode ser de religião específica, diz conselho de educação

O ensino religioso deveria ser banido da grade curricular de alunos do ensino fundamental público. Como essas aulas estão previstas na própria Constituição, elas devem, então, ter caráter não-confessional, sem priorizar uma ou outra religião.

A avaliação é do CNE (Conselho Nacional de Educação), colegiado vinculado ao MEC (Ministério da Educação) e responsável por formular e avaliar a política nacional de educação. Caberá ao grupo, por exemplo, analisar um currículo nacional para a educação básica, atualmente em discussão.

"As informações, demandas e reclamações que chegam ao CNE e a outros espaços institucionais sobre os modos de exercício do ensino religioso tanto negam a laicidade do Estado () quanto escancaram as escolhas de conteúdos doutrinários disseminados por postura didática confessional", disse o conselheiro Luiz Roberto Alves nesta segunda-feira (15), em audiência pública no STF (Supremo Tribunal Federal).

"Espera-se, pois, que chegue logo o dia em que a LDB [Lei de Diretrizes e Bases] será escoimada [libertada] do componente escolar ensino religioso", concluiu ele, em nome do conselho.

Durante todo o dia, a Corte realiza audiência pública para ouvir entidades, especialistas e líderes religiosos sobre ação da PGR (Procuradoria-Geral da República) que questiona o modelo confessional do ensino religioso. Relator do tema no Supremo, o ministro Luís Roberto Barroso promete definir seu voto no próximo semestre.

"SITUAÇÃO DE TENSÃO"

A defesa do ensino religioso não-confessional também foi feita por representante do comitê nacional de respeito à diversidade religiosa, colegiado vinculado à Secretaria de Direitos Humanos da Presidência.

"Não é lícito que uma religião imponha à nação seus pontos de vista e não podemos deixar os espaços públicos republicanos serem ostensivamente ocupados e controlados por quaisquer comunitarismos ou igrejas", afirmou.

A grande maioria dos convidados para a audiência pública foram favoráveis a esse ponto de vista.

"O Estado tem que tomar as rédeas desse processo. O ensino religioso está em situação de tensão –e não de harmonia– com o Estado laico", argumentou o professor de direito da USP Virgílio Afonso da Silva.

ACORDO COM SANTA SÉ

A ação da PGR também questiona trecho de decreto de 2010, assinado entre Brasil e o Vaticano que prevê "o ensino religioso, católico e de outras confissões religiosas" como disciplina das escolas públicas de ensino fundamental.

O então representante do Brasil no Vaticano, Luiz Felipe Corrêa, defendeu os termos do documento e o ensino confessional. Segundo ele, o termo utilizado na Constituição para as aulas (ensino religioso) já indica que a disciplina deve focar em uma ou mais religiões - caso contrário, usaria o termo "ensino das religiões" para indicar que as aulas devem transcorrer sob viés histórico.

"O acordo assegura não apenas o ensino católico, mas igualmente o ensino de outras religiões que o demandem" disse Corrêa.

O deputado federal Pastor Eurico (PSB-PE) adotou posição semelhante e criticou o que considera ser uma "ideologia de gênero" nas escolas.

"Alguns querem tirar o ensino religioso [da escola], mas por outro lado há outra religião que querem introduzir: a da desconstrução da fé e daquilo que a pessoa crê. No meu caso, creio em Deus", disse ele em nome da Frente Parlamentar mista em defesa da família e em apoio à vida, formada por 268 deputados e senadores.


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