Folha de S. Paulo


Menina encontra na dança força para superar câncer e perda da perna

RESUMO Laura Morgon, hoje com nove anos, enfrentou um câncer no osso há três anos. Por causa do tumor, que afetou o crescimento no membro inferior esquerdo, parte da perna teve de ser amputada. Hoje a menina usa prótese e leva uma vida normal em sua cidade, Fernandópolis (SP). Apaixonada por dança ela faz aulas de zumba e criou um grupo de dança na escola onde ensina as coreografias para as amigas.

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Tudo começou em junho de 2015. Tinha seis anos e levava uma vida normal como qualquer criança da minha idade. Eu ia à escola, adorava brincar e dançar.

Tinha acabado de começar a fazer aulas de balé e zumba quando uma dor na minha perna esquerda começou a incomodar. Depois de alguns exames veio o diagnóstico: eu estava com um tumor no osso da perna esquerda.

Confesso que aquela notícia não me abalou, talvez porque eu não entendesse muito bem o que estava acontecendo, mas, ao ver meus pais chorando, eu chorei também ali no consultório médico.

Fui encaminhada para fazer tratamento no Hospital de Câncer, em Barretos (a 395 km de São Paulo).

Em poucos dias, eu, meu pai e minha mãe nos mudamos para lá.

Eu tive que deixar minha casa, minha irmã, minha cachorrinha, meus amigos e minha escola.

Acho que a pior parte do tratamento foi essa: ficar longe da escola e dos meus amigos. Mas tudo bem, eu só queria sarar logo.

TRATAMENTO

Em Barretos, os médicos me explicaram tudo sobre a minha doença, falaram que eu teria que fazer quimioterapia e por causa da medicação meu cabelo iria cair.

Meu cabelo era lindo, comprido e volumoso. Logo na primeira sessão do tratamento eu percebi que ele estava caindo bastante.

Resolvi cortá-lo bem curtinho e doar minhas mechinhas para que fosse feita uma peruca com elas.

Não que eu fosse usar a peruca, porque eu não gosto, acho que não combina comigo, mas aquele cabelo ia ajudar outras pessoas que faziam tratamento igual a mim.

De cabelo bem curtinho, eu seguia fazendo meu tratamento. Não era fácil, mas eu não reclamava, tudo fazia parte da busca pela cura.

Em setembro daquele mesmo ano veio mais uma notícia: eu teria que amputar parte da perna esquerda. Por causa da minha pouca idade, o tumor tinha afetado o crescimento, meu corpo ia desenvolver, mas o membro não.

Com a notícia meus pais ficaram sem reação, mas lembro que minha única pergunta foi: "Se eu amputar eu vou viver? Apenas quero viver!"

A cirurgia foi marcada para aquele mesmo mês. Fiz questão de ir para o centro cirúrgico andando, afinal era a minha última caminhadinha com as minhas duas pernas.

Correu tudo bem, a cirurgia foi tranquila e algumas horas depois eu já estava no quarto em recuperação. Naquele mesmo dia, após passar o efeito da anestesia, eu acordei e já pedi pra minha mãe deixar eu tentar caminhar com o auxilio das muletas no corredor do hospital.

Muita gente que convivia comigo ali e acompanhava meu tratamento me viu e chorou. Eu estava curada.

A DANÇA

Em fevereiro de 2016, após nove meses de tratamento, recebi alta. Voltei para minha casa, em Fernandópolis (a 521 km de São Paulo).

Lá no hospital ganhei uma prótese e com ela eu podia ter uma vida normal. Voltei a frequentar a escola e a rever meus amigos e professores.

Mas ainda faltava algo: voltar para a aula de dança. E foi lá na escola, durante um show de talentos, onde os alunos tinham que fazer algum tipo de apresentação, que eu tive uma ideia: criar um grupo de zumba com minhas amigas.

Chamei quatro meninas e começamos a ensaiar. Todos os dias sempre que tínhamos um tempinho no intervalo das aulas ou quando saíamos da escola, à tarde, a gente se encontrava para dançar.

Como eu fazia aulas antes da doença e voltei a fazer depois de curada, já sabia as coreografias e ensinei a elas.

Nossa apresentação foi na escola para os outros alunos e professores. Foi muito legal, todos gostaram, alguns professores até a choraram.

O nosso grupo continua. Sempre que podemos nos encontramos e eu ensino elas a dançarem. Gosto muito de poder passar essa minha paixão para os outros.

Além de ensinar minhas amigas também faço aulas de zumba em uma academia, onde aprendo cada dia mais.

A prótese não me atrapalha em nada. Quero continuar a dançar ainda por muito tempo, até ficar velhinha.


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