Folha de S. Paulo


Gays com mais de 60 anos dançam de rosto colado no ABC Bailão

ABC Bailão - Trainees Igor e Rafael

"Hoje talvez o movimento seja mais fraco. Em fim de mês, os aposentados estão sem dinheiro", alerta Lourival Cremasco, 60, o senhor de bigode grisalho milimetricamente aparado responsável pela administração do ABC Bailão.

São 21h, e de fato o movimento parece menor na casa noturna do centro de São Paulo onde, todas as quintas-feiras, homens gays se reúnem para dançar de rosto colado.

O ABC não é referência aos municípios da Grande São Paulo, mas sigla de "Amigos Bailam Comigo".

Ali, é proibido tirar a camisa, como se avisa na entrada, e demonstrações ousadas de carinho são reprimidas com delicadeza.

Em quatro anos como segurança do ABC, José Batista de Souza, 57, diz nunca ter visto desentendimento grave: "Geralmente todos são muito educados e respeitam as regras, sem criar caso. As pessoas vêm aqui só para poder encontrar amigos e dançar."

A trilha é composta de forrós, boleros -"Como Tu Mujer", de Marco Antonio Solís e Pasion Vega, parece tocar toda quinta- e alguns sertanejos, como "A Dama de Vermelho" versão de Bruno e Marrone.

O salão escuro, cercado por espelhos e luzes multicoloridas, é tomado majoritariamente por homens dos 40 aos 80 anos. Clientes acima de 60 anos pagam mais barato.

A pista de dança tem um quê de cenário do diretor norte-americano David Lynch, criador da série "Twin Peaks". Ao lado dela, uma mesa de bufê apelidada de "fome zero" oferece frutas, pães, tortas, bolos e sanduíches, tudo preparado pela única mulher do baile, a bartender Jô.

FIDELIDADE

Com foco na dança, o ABC Bailão conta com público fiel, gente que frequenta a casa desde a sua abertura, em 1996.

D. (que não quis se identificar), 73, é freguês há 15 anos. Em 2017 não faltou uma quinta sequer. Morador de Santos, ele não se rende frente às quase quatro horas de ônibus e metrô (ida e volta) que enfrenta para ir-e-vir dançar.

Amigos inseparáveis, Edson, 63, e Araújo, 53, saem de São Bernardo a cada 15 dias para "agitar o salão" há dez anos.

Eles acreditam que o ABC vai além de um momento de lazer para a terceira idade: é um local para que os frequentadores possam ser quem realmente são. "Me sinto seguro, sei que aqui não há problema em ser julgado ou agredido", afirma Araújo.

Boa parte dos clientes do ABC Bailão vive vida dupla; alguns são casados e têm filhos, outros não se assumiram, por receio ou pelo tabu da idade.

Com 11 anos de casa, o barman Francisco, 55, também adora dançar, principalmente boleros. Como isso é impossível durante o "expediente" na casa, só resta a Chico bailar em outra freguesia.

"Aproveito os dias em que não trabalho, e vou a um baile de hétero no parque da Água Branca. Não existem outros lugares como este por aí."

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