Folha de S. Paulo


Drones 'intrusos' afetam aeroportos pelo mundo até para filmar aviões

A suspensão de voos em aeroportos por causa da interferência de drones, como ocorreu em Congonhas, se tornou um problema cada vez mais frequente pelo mundo. Contra isso, fabricantes de aviões e autoridades aeroportuárias têm investido em sistemas de proteção antidrones.

O uso irregular do equipamento perto de uma das cabeceiras de Congonhas, na zona sul de São Paulo, fechou o local por mais duas horas, desviou voos e atrapalhou a rotina de milhares de passageiros entre a noite de domingo (12) e a manhã de segunda (13).

Em julho, a pista do aeroporto de Gatwick, em Londres, um dos mais movimentados da Europa (2º maior britânico), foi fechada duas vezes devido a alertas de avistamento de drones. Os atrasos chegaram a três horas.

A imprensa do país escreveu que a suspeita era que alguns drones deliberadamente sobrevoassem áreas próximas às pistas para filmar a movimentação dos aviões.

Em sites como Youtube é possível achar vídeos de pousos e decolagens de aviões comerciais que supostamente foram feitos com a utilização de drones. Alguns deles inclusive em aeródromos brasileiros, como em Paraty (RJ). O número de avistamentos de drones por pilotos no Reino Unido passou de 29, em 2015, para 71, em 2016.

Até 1º de outubro deste ano, foram 81 ocorrências. Em agosto de 2017, foi a vez do aeroporto de Nova Déli ter seu movimento interrompido. Houve episódios de interferências de drones também no aeroporto John F. Kennedy, em Nova York, desde 2015.

DEFESA

Para tentar minimizar a ameaça do uso de drones, autoridades aeroportuárias estão testando e implantando tecnologias capazes de identificar essas aeronaves, rastrear seus "pilotos" e até neutralizá-las. Aeroportos brasileiros não têm essa tecnologia.

Uma companhia britânica projetou um conjunto de canhões que disparam ondas de rádio capazes de interferir na navegabilidade do drone. O problema agora é refinar esse produto para que as ondas de rádio não interfiram em outros dispositivos, como os celulares dos passageiros.

A mesma técnica de bloqueio foi usada neste ano no Fórum Econômico Mundial de Davos, na Suíça, e em visita do ex-presidente dos EUA Barack Obama à Alemanha. Em 2015, a Boeing anunciou um superlaser capaz de atingir um drone e superaquecê-lo a ponto de ele perder controle e cair.

No Brasil, indústrias já buscam serviços de uma empresa recém-chegada que diz ser capaz de identificar drones e seus "pilotos". A empresa afirma que esse sistema poderia ser aplicado a aeroportos, mas ele ainda é considerado incipiente.

CONGONHAS

Os transtornos provocados pelo drone, que sobrevoava a região do Jabaquara, na zona sul da capital paulista na noite deste domingo, levantaram na aviação brasileira uma preocupação que já se espalhou pelo mundo -devido aos riscos de interferência dos aparelhos, com uso doméstico e profissional, no tráfego aéreo.

No Brasil, até este mês, estão cadastrados mais de 24 mil drones -o número oficial pode ser ainda maior.

O drone que parou Congonhas foi avistado por pilotos que estavam na etapa final de voo. A informação foi repassada aos controladores de voo, que notificaram as autoridades de segurança aérea e do aeroporto -que, por sua vez, decidiram interromper os pousos e as decolagens.

Pelas regras fixadas em maio deste ano pela Anac (Agência Nacional de Aviação Civil), os drones são proibidos de operar a uma distância de até 9 km de aeroportos ou de rotas de aviões, a depender da altura atingida pelo equipamento.

A suspensão de Congonhas causou efeito cascata. O aeroporto, que normalmente opera até as 23h, recebeu voos até as 2h45, que tinham atrasos de mais de cinco horas.

O consultor de marketing Leandro Schulai embarcou em voo da Gol que saiu de Brasília e deveria chegar às 22h40 em Congonhas, mas acabou desviado ao Galeão, no Rio. "Dormi no voo e, quando acordei, eu me assustei porque vi que ninguém deixava a aeronave. Foi quando comunicaram que estávamos no Rio", contou ele, que voltou a São Paulo por volta da 1h.

Segundo a Infraero (estatal que regula os aeroportos), 34 voos foram desviados para outros aeroportos do país.

CRIME

O operador do drone que fazia sobrevoo irregular pode pegar até cinco anos de prisão por colocar a aviação civil em risco, segundo Marcelo Honorato, juiz e especialista em crimes aeronáuticos.

Ele pode ser enquadrado no artigo 261 do Código Penal, que tipifica como crime expor a perigo aeronave ou praticar qualquer ato a impedir ou dificultar navegação aérea. O artigo também é usado para tentar coibir a soltura de balões.

O caso pode render ainda um processo civil, caso as companhias aéreas queiram buscar ressarcimento pelos custos que tiveram por causa do uso indevido do drone.

O piloto Adriano Castanho, diretor do Sindicato Nacional dos Aeronautas, diz que uma eventual colisão de aeronave em voo com um drone pode ser "catastrófica". "A aeronave tem peças muito sensíveis que, se atingidas, podem prejudicar um controle do voo."

Aeroportos do país não dispõem de tecnologia para identificar drones em suas áreas. Castanho sugere que a regulação do setor passe a contemplar a obrigatoriedade do vínculo de um drone a um IP (código identificador de computadores). "Assim, quando fosse ativado, seria possível fiscalizá-lo de alguma forma."

A Abear (associação das empresas aéreas) cobrou uma "ação contundente de punição" ao responsável pelo drone na região de Congonhas. "Esse caso precisa servir de exemplo para educarmos a sociedade quanto ao perigo dessa atitude. Foi uma irresponsabilidade", disse Ronaldo Jenkins, diretor da entidade, que estimou prejuízos imediatos superiores a R$ 1 milhão.


Endereço da página:

Links no texto: