Folha de S. Paulo


Prisões ligam facção criminosa de SP a traficantes da favela da Rocinha, no RJ

A Polícia Civil de São Paulo prendeu 13 pessoas ligadas à facção criminosa PCC (Primeiro Comando da Capital) suspeitas de fornecerem armamento a traficantes da favela da Rocinha, na zona sul do Rio de Janeiro. As prisões fazem parte da Operação Salazar, deflagrada na madrugada desta quinta-feira (19) para combater o crime organizado em cidades do Estado de São Paulo.

A operação foi coordenada pela Dise (Delegacia de Investigação sobre Entorpecentes), de São Bernardo do Campo. Os alvos são pessoas envolvidas com lavagem de dinheiro, associação criminosa, tráfico de drogas e armas.

Até a tarde desta quinta, os policiais haviam apreendido cinco armas, computadores, mais de 30 telefones, 5 kg de drogas, rádios de comunicação e R$ 25 mil em dinheiro. Além de cidades da Grande São Paulo, a operação ocorre também no litoral sul.

Na ação, são cumpridos 94 mandados de busca e apreensão e 26 de prisão temporária na capital, interior e litoral de São Paulo. A operação envolve 320 policiais civis.

De acordo com a polícia, a suspeita do envolvimento do PCC com traficantes da Rocinha aconteceu durante a investigação dos criminosos da capital paulista e da região metropolitana. Ligações telefônicas entre traficantes do Rio e o chefe de um grupo paulista, Fabiano Robson dos Santos, o Negão, foram interceptadas pela polícia.

Foi descoberto que a organização fornecia fuzis e outras armas para os membros da ADA (Amigos dos Amigos), facção que domina a favela.

A atuação do PCC no Rio se dá no fornecimento de drogas e armas à facção carioca aliada. Como a Folha revelou em abril, no final do ano passado, a facção criminosa paulista selou aliança com a ADA, dona do tráfico na Rocinha, segunda maior facção criminosa do Rio e inimiga histórica do CV (Comando Vermelho). Ali, a quadrilha paulista se aliou, na prática, aos inimigos de seus inimigos.

Andressa Anholete/AFP
Chamada - Clube do crime, especial sobre o PCC
Chamada - Clube do crime, especial sobre o PCC

ALIANÇA

A aproximação entre PCC e ADA vinha sendo desenhada desde 2015, quando a guerra com o CV –até então parceiro– estava se tornando inevitável. No meio do ano passado, a Polícia Civil do Rio notou problemas na relação entre CV e PCC quando a quadrilha chefiada por Marcos Camacho, o Marcola, iniciou uma campanha de cooptação de integrantes da facção inimiga em cidades do interior, em especial naquelas próximas à divisa de Rio e SP.

Já a recente guerra na Rocinha ocorreu porque Rogério 157, integrante da ADA, se recusou a devolver o controle das bocas de fumo da favela a um homem enviado pelo antigo chefe do tráfico local, Antônio Bonfim Lopes, o Nem, preso em Rondônia.

Rogério matou o emissário de Nem e expulsou aliados do então colega e agora rival. A ação motivou uma tentativa de invasão em 12 de setembro. Bandidos de outras favelas do ADA tentaram, sem sucesso, retomar o controle das bocas de fumo, tidas como entre as mais rentáveis do Rio.

A polícia interviu e, após cinco dias de intensos confrontos, as Forças Armadas, que já estavam no Rio para reforço na segurança pública, foram acionadas.

O Rio enfrenta grave crise financeira, com cortes de serviços e atrasos de salários de servidores, e está perto de um colapso na segurança pública. Um outro efeito dessa crise tem sido o aumento dos índices de criminalidade e a redução do número de policiais em favelas ocupadas por facções criminosas. As UPPs, base policiais em comunidades controladas pelo tráfico perderam parte de seu efetivo.

Nos últimos meses, têm sido rotina mortos e feridos por bala perdida, além de motoristas obrigados a descer de seus carros para se proteger dos tiros. Outro braço dessa crise é a morte de policiais. Só neste ano já foram mais de cem assassinados no Estado.

A situação de insegurança também levou o presidente Michel Temer a autorizar o uso das Forças Armadas para fazer a segurança pública do Rio até o final do ano que vem.

Pesquisa Datafolha mostra que, se pudessem, 72% dos moradores dizem que iriam embora do Rio por causa da violência. O desejo de deixar a cidade é majoritária em todas as regiões e faixas socioeconômicas –foram ouvidas 812 pessoas, e a margem de erro do levantamento é de quatro pontos percentuais, para mais ou para menos.

Nas últimas semanas, segundo o Datafolha, um terço dos moradores mudou sua rotina e presenciou algum disparo de arma de fogo. O levantamento revela que 67% das pessoas ouviram algum tiro recentemente.

Polícia Civil de São Paulo
Organograma da operação Salazar na delegacia da Polícia Civil; operação tem foco no crime organizado
Organograma da operação Salazar na delegacia da Polícia Civil; operação tem foco no crime organizado

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Entenda a guerra na Rocinha, maior favela do Rio

Racha na facção ADA (Amigos dos Amigos), que domina a Rocinha, provocou conflito

2011
Líder da ADA na Rocinha, Nem é preso. Rogério 157, seu ex-segurança pessoal, assume o tráfico na favela. Desde então, Nem estaria tentando tirá-lo do poder

Ago.2017
Da prisão, Nem dá ordem para que Rogério deixe o morro, mas ele ignora. No dia 13, três aliados de Nem são encontrados mortos; segundo a polícia, Rogério seria o mandante

Reuters
Antonio Bonfim Lopes, conhecido como 'Nem', é escoltado por políciais ao chegar na sede da polícial federal, no Rio de Janeiro
Antonio Bonfim Lopes, conhecido como Nem, é escoltado por policiais após ser preso, em 2011

Semana de 11.set.2017
Outros aliados de Nem são expulsos do morro

17.set.2017
Traficantes da ADA da Rocinha e de outros morros se unem para invadir a favela e expulsar Rogério 157. Bandidos do Comando Vermelho oferecem abrigo ao grupo de Rogério em outras comunidades

22.set.2017
Depois de seis dias de confrontos, 950 homens das Forças Armadas cercam acessos à Rocinha. Polícia entra para tentar prender envolvidos na guerra

29.set.2017
Após uma semana de cerco, Forças Armadas deixam favela da Rocinha. para o ministro da Defesa, Raul Jungmann (PPS-PE), os militares cumpriram a missão designada e não havia mais necessidade de permanência na região.

9.out.2017
Polícia do Rio prende segurança de Rogério 157. Soares foi capturado na Baixada Fluminense, o que levanta a suspeita de que Rogério não estaria na favela

10.out.2017
Forças Armadas voltam a operar na comunidade.

Mulher de Nem é presa na Ilha do Governador, na zona norte do Rio, a 30 quilômetros da favela. Ela tinha deixado a favela em setembro após o racha na facção.

Rogério 157 continua foragido


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