Folha de S. Paulo


Análise

Falência do Estado ajuda a recrudescer violência no Rio

O recrudescimento da violência no Rio de Janeiro está diretamente relacionado à falência fiscal do Executivo estadual. Todos os serviços públicos estão sendo impactados por essa realidade, dado que os recursos de custeio e manutenção da máquina pública estão bastante escassos.

O atraso no pagamento dos salários agrava ainda mais a situação, desmotivando o funcionalismo público e, consequentemente, diminuindo a qualidade dos serviços prestados. Soma-se a isso o enfraquecimento da autoridade política no Estado, com ex-governador preso e o atual governador fragilizado por questões de saúde.

Esses fatores estão sendo decisivos no desmantelamento do projeto Unidades de Polícia Pacificadora (UPP). A despeito das limitações, as UPPs alcançaram resultados admiráveis na redução dos indicadores de criminalidade de 2008 a 2014.

Estudos científicos diversos realizados por pesquisadores cariocas comprovaram o impacto positivo do projeto na redução do domínio territorial das facções criminosas do tráfico de drogas.

O sentimento de segurança dos moradores melhorou, a atividade econômica local foi impulsionada, e as escolas e unidades de saúde passaram a funcionar com mais qualidade. Os efeitos benéficos foram inegáveis.

A partir do momento em que as UPPs são enfraquecidas, as facções criminosas voltam a almejar a retomada do domínio territorial.

É esse o fenômeno que estamos testemunhando na cidade do Rio de Janeiro. Não bastasse isso, os roubos estão em crescimento acelerado como também a letalidade e a vitimização policial. É cenário de nítido descontrole da segurança pública.

O que fazer para a reversão desse quadro tão grave? A convocação das Forças Armadas via Garantia da Lei e da Ordem (GLO), conforme previsão constitucional, é necessária e imprescindível como medida emergencial. Mas há período de validade para a atuação dos militares nas ruas. Não é solução.

É imprescindível a elaboração de um plano de ação de médio e longo prazos, envolvendo a articulação de esforços dos governos municipal, estadual e federal, como também do Ministério Público e do Judiciário. Nesse sentido, duas ações são prioritárias:

1) A retomada do projeto UPP em outros moldes, evitando o açodamento da experiência anterior. Além disso, é necessária a inserção no projeto de ações de prevenção social da violência focada na juventude;

2) Formação de uma força-tarefa, composta de representantes das polícias estaduais, das polícias da União, do sistema prisional, das Forças Armadas, do Ministério Público e do Judiciário, com a missão de realizar uma repressão qualificada das facções criminosas do Rio de Janeiro.

Isso envolve a necessidade de desmantelar o comércio ilegal de armas de grosso calibre como também as relações corruptas entre agentes públicos e criminosos.

Para finalizar, não há como ignorar o fato de que a disponibilização de recursos financeiros por parte do governo federal é pré-requisito para a viabilização do plano de ação aqui proposto.

LUIS FLAVIO SAPORI é doutor em sociologia, coord. do Centro de Estudos em Segurança Pública da PUC Minas, ex-secretário adjunto de Segurança de MG


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