Folha de S. Paulo


Promotor expõe testemunha protegida em julgamento da maior chacina de SP

Em um plenário repleto de familiares e colegas de PMs acusados de participação na maior chacina da história de São Paulo, a Promotoria expôs a identidade de uma testemunha protegida, que não quis comparecer ao julgamento por temer represália.

O nome verdadeiro do homem, que havia prestado informações à investigação sob a condição de sigilo no processo, foi citado pelo menos cinco vezes pelo promotor Marcelo Alexandre de Oliveira no julgamento da chacina que deixou 17 mortos em Osasco e Barueri (Grande São Paulo) em agosto de 2015.

Aloisio Maurício/Fotoarena/Folhapress
Julgamento de três acusados de participar da chacina que deixou 17 pessoas mortas em 2015 em Osasco, região metropolitana de São Paulo.
Julgamento de acusados de chacina que deixou 17 pessoas mortas em 2015 em Osasco e Barueri

Na quarta-feira (20), Oliveira fez referências à identidade da testemunha protegida de forma indireta. Nesta quinta-feira (21), foi explícito. Questionado pela Folha, Oliveira defendeu a exposição do homem: "Talvez ele fique até mais seguro se alguma coisa acontecer com ele".

A testemunha protegida é tio da mulher do policial militar Thiago Barbosa Henklain, 30, um dos três acusados pela chacina que estão sendo julgados nesta semana –ao lado do PM Fabrício Emmanuel Eleutério, 32, e do guarda municipal de Barueri Sérgio Manhanhã, 43.

No processo, a testemunha protegida foi apresentada pelo nome fictício de Gama. Esse homem disse à polícia, em depoimento formal, ter ouvido acusações contra Henklain em um almoço de família. Ele não quis, porém, repetir à Justiça sua versão porque, segundo a própria Promotoria, dizia ter recebido informações de que comparsas do PM estavam esperando para identificá-lo e matá-lo.

O julgamento dos acusados pela chacina começou na segunda-feira (18) e poderá acabar nesta sexta (22). Segundo essa testemunha Gama, a avó de Henklain teria visto o policial chegar em casa na noite da chacina, às 23h30, muito agitado.

No dia seguinte, teria ouvido a mulher do PM brigar com ele ao reconhecê-lo em imagens de TV matando uma pessoa de camisa vermelha no chamado bar do Juvenal, em Osasco, epicentro da chacina e onde câmeras flagraram os assassinos com os rostos escondidos. Esse reconhecimento teria ocorrido em razão de uma blusa do PM.

Para a Promotoria, essas informações, prestadas a policiais no inquérito, seriam as mais importantes do processo –por se tratar de gente próxima ao policial militar e que o conhecia muito bem.

PROTEÇÃO

Questionado, o promotor minimizou a revelação do nome da testemunha, ainda que sem consentimento dela. Embora a identidade do homem tenha sido mantida em sigilo no decorrer do processo por questões de segurança, Oliveira afirmou que a defesa dos réus havia tido acesso ao nome e que a exposição poderia significar maior proteção à testemunha.

O promotor afirmou ainda que a testemunha se recusou a falar à Justiça também porque poderia haver problemas familiares, já que a mulher de Henklain estaria grávida e ficaria ao lado do marido. Isso, na avaliação de Oliveira, seria a principal razão para a testemunha não falar ao júri, até mais do que eventuais ameaças de morte.

Em 2015, a principal testemunha protegida de chacinas ocorridas em 2013 –também envolvendo PMs de Osasco– foi assassinada a tiros.

INTIMIDAÇÃO

Um outro episódio do julgamento, a cargo da defesa de um dos policiais, foi questionado pela Promotoria. O advogado Nilton Nunes, que defende o PM Eleutério, mencionou o nome e a profissão dos jurados no fim dos debates nesta quinta.

Detalhes sobre os integrantes do júri vinham sendo mantidos sob reserva –sem divulgação a jornalistas. Para o promotor Oliveira, tratou-se de "uma tática baixa, para dizer o mínimo", pela hipótese de intimidação. "Não sei se ele fez de propósito ou de boa-fé. Se estiver de boa-fé, é muito ingênuo, mas é um tremendo ato de irresponsabilidade", disse.

Nunes afirmou não haver nenhuma proibição e que não quis amedrontar ninguém. Disse que apenas tentou ser mais educado "para tratá-los por nome, e não por números".


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