Folha de S. Paulo


Professora agredida em SC pede que país 'volte a valorizar a educação'

Agredida por um aluno dentro da escola em que trabalha, a professora Marcia Friggi, 51, pediu nesta terça-feira (22) que o país "volte a valorizar a educação" e que alunos e pais de alunos "voltem a respeitar os professores".

"Precisamos voltar a valorizar a educação e a cultura. Precisamos voltar a respeitar os pais, os professores, os mais velhos. O Brasil está esquecendo disso", disse à Folha. Na segunda (21), ela foi agredida a socos por um aluno de 15 anos em Indaial (145 km de Florianópolis).

Reprodução/Facebook
A professora Marcia Friggi, 51, agredida no interior de Santa Catarina por aluno de 15 anos
A professora Marcia Friggi, 51, agredida no interior de Santa Catarina por aluno de 15 anos

A professora publicou na internet fotos em que aparece com corte na testa e com hematoma no olho direito, e desde então vem sendo tratada nas redes sociais como uma espécie de "símbolo do descaso com a educação".

"Infelizmente, isso [agressão] não ocorre só comigo. Vários professores passam por esse problema diariamente. Isso [violência] precisa mudar. Nosso país só vai conseguir melhorar se melhorar a educação." Marcia disse que ainda não consegue abrir o olho direito. "Não estou bem nem fisicamente, nem emocionalmente."

POLÍCIA

De acordo com relato da professora à Delegacia de Polícia Civil de Indaial, a agressão aconteceu às 10h de segunda-feira no Ceja (Centro de Educação de Jovens e Adultos) da cidade. Era a primeira aula dela com o aluno. No depoimento, Marcia contou que o rapaz se irritou quando ela pediu para ele tirar o livro de cima das pernas e colocá-lo sobre a mesa de estudos. O aluno teria se recusado e a xingado.

Ainda segundo o depoimento, a professora pediu para o aluno se retirar da sala e ir até à direção. No caminho, segundo a educadora, o rapaz jogou o livro em sua direção, não a atingindo. A agressão aconteceu na sala da direção. Marcia diz ter levado três socos, a ponto de cair contra a parede. Segundo ela, o aluno "é alto, é forte, é um homem". A professora é magra e mede 1,65 m.

O delegado José Klock afirmou que a professora estava machucada no momento do registro da ocorrência e que ele chamado à delegacia e que a polícia ouvirá testemunhas da agressão.

ANTECEDENTES

O conselheiro tutelar Jair Gilmar Gonzaga informou que o aluno denunciado pela professora já "precisou de encaminhamentos anteriores" da repartição, mas não detalhou os motivos. Limitou-se a dizer que foi por "problemas" nas escolas em que já estudou. "O que podemos dizer é que nunca tivemos um caso de agressão com esta magnitude aqui na cidade. É algo atípico", disse.

Uma professora da rede municipal da cidade ouvida pela reportagem disse que o aluno "é agressivo" e que está no Ceja porque não conseguiu fazer os ensinos básico e fundamental com os colegas da mesma faixa de idade.

"Ela já bateu em colegas. Bateu até na mãe. É um garoto com problemas sérios de relacionamento, sem orientação", disse a professora, que pediu para não ser identificada.

EXPERIÊNCIA

A professora Marcia Friggi trabalha em mais de uma escola de Indaial, cidade de 65 mil habitantes. Marcia é professora de Língua Portuguesa. Está no magistério há 12 anos. Ela ficará sete dias em casa, de atestado.

Colegas a descrevem como "uma pessoa comedida". "A professora Marcia é uma profissional respeitada. É uma pessoa comedida. Sempre respeitou os alunos", disse Andrea Cordeiro, coordenadora de uma escola onde a professora leciona.

A agressão contra ela foi comentada até por pessoas e entidades fora do âmbito da educação. "Episódios como o da agressão à professora são emblemáticos e não podem ser aceitos, sob hipótese alguma. As medidas socioeducativas pertinentes precisam ser adotadas", disse Glauco José Côrte, presidente da Fiesc (Federação das Indústrias do Estado de Santa Catarina).

"A ampla repercussão do ocorrido precisa ser o ponto de partida para uma reflexão sobre o valor do professor para a sociedade. O respeito aos valores e à dignidade humana começa em casa. Jamais pode ser delegado à escola", disse ele.

Nesta terça, Marcia afirmou que o comportamento do aluno "é reflexo da falta de respeito que ocorre em toda a sociedade" e que "na sala de aula isso vem à tona". Marcia disse que tem recebido milhares de mensagens de carinho, mas que também vem recebendo "manifestações de ódio", o que "não [lhe] surpreende".

Ela afirmou que não tem expectativas sobre o que vai acontecer com o aluno. "A minha parte eu fiz. Não me acovardei. Procurei a polícia, fiz corpo de delito. Agora não é mais comigo."

OUTRO LADO

A reportagem não conseguiu contato com o aluno acusado de agressão, nem com a família dele. Os nomes do rapaz e dos pais não foram fornecidos pelo Ceja, pela Secretaria de Educação, pela Polícia Civil, pelo Conselho Tutelar e pelo juizado da Infância e Juventude.

Até a tarde desta terça, ele também não havia sido ouvido formalmente por nenhuma entidade que pudesse, indiretamente, fornecer sua versão. A promotoria da Infância e Juventude de Indaial informou que o caso "ainda não foi formalizado" e que provavelmente correrá em segredo de justiça porque se trata de adolescente.

A direção do Ceja não comentou o assunto. Informou que só a Secretaria de Educação do município falaria sobre o caso.

Em nota, a pasta confirmou a agressão, informou que prestou apoio à professora e declarou que repudia "qualquer tipo de agressão moral ou física independentemente da motivação". "A Secretaria de Educação está acompanhando todos os fatos e continuará prestando o apoio necessário à professora", diz o texto. A nota não faz alusão ao aluno.

O prefeito de Indaial, Andre Moser (PSDB), informou nesta terça que a situação escolar do aluno será discutida nos próximos dias e que a agressão já foi comunicada às autoridades competentes.


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