Folha de S. Paulo


Ação anti-droga da PM em favela do centro de SP mata rapaz de 19 anos

Bruno Santos/Folhapress
Moradores da favela do Moinho entram em confronto com a polícia após jovem ser baleado em ação da polícia
Moradores da favela do Moinho entram em confronto com a polícia após jovem ser ferido em tiroteio

Uma ação da Polícia Militar em uma favela do centro de São Paulo suspeita de fornecer drogas à cracolândia terminou nesta terça-feira (27) com a morte de um rapaz de 19 anos, protesto de moradores e troca de acusações.

Leandro de Souza Santos foi morto a tiros após correr de agentes da Rota (grupo de elite da polícia) na favela do Moinho, em Campos Elíseos.

A PM afirma que ele atirou primeiro contra os policiais e que estes revidaram.

Já moradores da favela dizem que Leandro não tinha arma, mas que era usuário de drogas e correu para dentro de um barraco, onde teria sido agredido e assassinado.

Três pessoas deram entrevistas à Folha dizendo terem presenciado a entrada de policiais da Rota no local onde Leandro se escondeu. Elas afirmam que ouviram gemidos por mais de meia hora e, em seguida, tiros.

Dentro do barraco sobraram marcas de sangue na cozinha (do chão ao fogão) e de tiros no armário e na geladeira.

Após a ação, moradores do Moinho protestaram, interromperam a circulação de trens em um trecho da linha 8-diamante da CPTM e entraram em confronto com a PM.

À tarde, cerca de 50 pessoas fecharam a avenida Rio Branco. Algumas jogaram pedras em policiais, que usaram bombas de gás lacrimogêneo.

VERSÕES

O tenente-coronel Miguel Daffara afirmou que "a favela do Moinho é uma das fontes de abastecimento de drogas da alameda Cleveland", na cracolândia, alvo de operações das gestões Geraldo Alckmin e João Doria desde maio.

"Nós temos que sufocar o tráfico de drogas. No meio das pessoas de bem, há traficantes que se aproveitam e se escondem nos barracos", disse.

Pela versão apresentada por dois policiais na delegacia, Leandro correu para dentro de um barraco na favela. No local, com a entrada da Rota, teria dado dois tiros. Os dois policiais disseram ter disparado quatro vezes cada um.

Moradores dizem que a arma foi plantada pela polícia e que não houve confronto.

Letícia de Souza, 22, irmã de Leandro, afirma que ele era viciado em cocaína. "Ele estava virado, tinha cheirado a noite toda." Ela diz que viu um grupo de policiais gritar para seu irmão parar. "Ele estava transtornado e entrou na casa da vizinha", afirma.

Mariana Zylberkan/Folhapress
Maria Odete Gonzaga de Souza, 46, mãe de jovem morto pela polícia no Moinho mostra foto do filho
Maria Odete Gonzaga de Souza, 46, mãe de jovem morto pela polícia no Moinho mostra foto do filho

A dona do barraco foi retirada pelos policiais com truculência, segundo seu marido, Cristiano Machado Santos, borracheiro que estava na oficina vizinha. Ele afirma que havia um som ligado no imóvel e cujo volume foi elevado subitamente (diz acreditar que para camuflar agressões).

"Só dava para ouvir ele [Leandro] gemendo e chamando a mãe", diz Rafael Liberato, 35, também vizinho do rapaz.

Moradores se aglomeraram na frente do barraco para tentar resgatar a vítima. Letícia afirma que ouviu tiros abafados e se desesperou. Seu irmão, Lucas de Souza Santos, tentou entrar no local, mas foi impedido. "Os policiais deram uma gravata e ele desmaiou."

A mãe de Leandro, a ajudante de cozinha Maria Odete Gonzaga de Souza, 46, acompanhou a ida do filho ao pronto-socorro da Santa Casa, mas ele já chegou morto. "Meu filho foi torturado e assassinado pela polícia."

No corpo, de acordo com ela, havia cinco perfurações por bala na região do abdômen, além de sangue na boca, inchaços no rosto e dentes quebrados. "Deram marteladas no meu filho, afirmou Maria Odete, em referência a um martelo cheio de sangue encontrado no barraco."

Usuário de drogas desde os 12 anos, Leandro vendia sucata para sustentar seu vício. "Ele começou cheirando cola e passou para a cocaína. Vendia sucata para não roubar", disse a mãe do rapaz.

A PM diz que a ação dos policiais está sendo investigada em inquérito policial militar.

Ela disse que Leandro teria recusado a abordagem, levantando suspeitas. Duas pessoas foram presas na operação na favela. Uma com uma motocicleta furtada e outra com entorpecentes e um celular roubado.


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