Folha de S. Paulo


Ex-bancário, jovem prefeito de Minas peita Samarco e atrasa nova licença

Divulgação/Prefeitura de Santa Barbara (MG)
Leris Braga (PHS), 34, prefeito da mineira Santa Bárbara
Leris Braga (PHS), 34, prefeito da mineira Santa Bárbara

Leris Braga (PHS), 34, prefeito de Santa Bárbara (MG), é a mais recente preocupação da mineradora Samarco, que busca duas licenças ambientais para voltar a operar após o rompimento da barragem que deixou 19 mortos em 2015.

Uma das autorizações está travada desde janeiro na cidade, onde a Samarco captava água para produção de minério. O volume retirado pela empresa em um ano é o suficiente para abastecer os 30 mil habitantes por 11 anos.

As outras quatro cidades onde a Samarco atua em MG (Mariana, Ouro Preto, Catas Altas e Matipó) já emitiram a chamada carta de conformidade para que a empresa inicie o processo de reabilitação das licenças suspensas em outubro passado. A mineradora pertence à Vale e à anglo-australiana BHP Billiton.

O prefeito diz que a adutora da Samarco está em uma zona de recuperação ambiental e, por isso, a empresa deve entregar estudos sobre seu impacto e cooperar para cessar a degradação da área. "A medida de mitigação é importante, porque preservar o recurso hídrico é preservar a matéria-prima", diz o prefeito.

Em fevereiro, mês em que entrou na Justiça, a Samarco também entregou os estudos, atualmente sob análise da prefeitura. Uma decisão deverá sair nos próximos dias.

A mineradora chegou a obter na Justiça, no mês passado, uma sentença que obrigava o município a emitir ou não a carta em dez dias, independentemente da análise dos estudos. Dias depois, a presidente do STF, Cármen Lúcia, derrubou a decisão.

"A expedição de declaração de conformidade sem a devida análise e conclusão sobre os impactos [...] importa, de imediato, expor toda a coletividade do município a situação de risco", afirmou a ministra.

"A prefeitura não se manifestou até agora. Se julgar não haver conformidade, ela tem que apresentar o aspecto que está sendo descumprido. Se for possível consertar, eu conserto. Ou compenso de outra maneira", diz Alexandre Souto, gerente da Samarco.

As partes chegaram a um acordo informal em abril: a Samarco iria arcar com um projeto de estação de tratamento de esgoto para Santa Bárbara. O acerto desandou porque o prefeito queria que a mineradora executasse a obra, e a empresa se comprometeu somente a ajudar a captar recursos públicos.

"Não é correto a empresa fazer a estação de tratamento. Os estudos mostram que a adutora tem impacto desprezível", diz o gerente.

A Samarco argumenta que não cabe à prefeitura exigir compensações, já que o licenciamento e a definição de contrapartidas são competências do governo estadual.

O prefeito afirma, porém, que não pede uma compensação ambiental. "São estudos para embasar a decisão da prefeitura, não tem a ver com licenciamento ambiental. É uma zona degradada, se algum empreendedor deseja algo ali, ele precisa equilibrar. O município não quer uma oferta, não é um negócio."

A Samarco quer voltar a operar com 60% da sua capacidade –não é possível a recuperação plena após a tragédia. Para isso, necessita ainda da licença, protocolada há um ano, para construir um novo sistema de rejeitos.

Um ano de Lama

"O entrave de Santa Bárbara atrasou, e muito, a retomada. A última expectativa era o final deste ano, mas já foi frustrado", diz o gerente.

O retorno representaria 20 mil empregos diretos e indiretos. A própria Santa Bárbara vive da mineração, que representou 8,6% de sua receita de R$ 96,4 milhões em 2016. A Samarco, porém, não paga impostos à cidade por não explorar minério ali.

"O município compreende a importância da mineração. Preciso pensar nos colaboradores de hoje da mineração, mas também preciso pensar nos empregados de amanhã."

Nascido em Santa Bárbara e filho de pequenos produtores rurais, o prefeito Braga foi estudar administração em Belo Horizonte, onde passou num concurso do Banco do Brasil. Deixou o posto para concorrer à prefeitura em 2012. Novato e sem padrinhos políticos, foi reeleito com 78% dos votos no ano passado.

Braga e Samarco já se cruzaram em 2013, quando o prefeito assumiu a administração e, faltando 12% para a instalação da adutora, verificou que faltava o alvará municipal para a obra, que foi embargada pela Promotoria.

Para conclusão, prefeitura e Samarco fizeram um acordo que prevê R$ 12,8 milhões em investimentos até 2020.

Foram construídos posto de saúde, centro comunitário, centro de empreendedorismo, além de pavimentação. Ainda restam R$ 4,4 milhões a serem repassados pela Samarco.

Foi também nessa época que a primeira carta de conformidade da adutora, expedida em 2009 pelo ex-prefeito Antônio Eduardo Martins (PTB), foi questionada na Justiça em ações por improbidade ambiental e crime contra a administração ambiental.

Segundo o Ministério Público, não houve "avaliação técnica prévia que embasasse essa declaração municipal".

A defesa do ex-prefeito afirma que ele fez questão de ressalvar, na carta, que a legislação ambiental pertinente deveria ser respeitada. A Samarco diz que os acordos já firmados regularizam as pendências e que a questão está resolvida.


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