Folha de S. Paulo


Não consigo dormir nem comer, diz dono de bicicleta sobre jovem tatuado

Reprodução
Jovem tem testa tatuada após ser acusado de roubo em São Bernardo do Campo, na Grande São Paulo
Jovem tem testa tatuada após ser acusado de roubo em São Bernardo do Campo, na Grande São Paulo

Ademílson de Oliveira, 31, dono da bicicleta que supostamente seria furtada pelo adolescente de 17 anos que teve a testa tatuada com a frase "eu sou ladrão e vacilão", disse que desde que ficou sabendo da tortura sofrida pelo jovem não consegue dormir nem voltar à sua rotina. Para ele, o que fizeram com a vítima não foi justo.

O caso aconteceu na última sexta-feira (9), em São Bernardo do Campo (ABC paulista). Oliveira contou o "Agora" que mora na pensão onde o tatuador Maycon Wesley Carvalho dos Reis, 27, e o pedreiro Ronildo Moreira de Araújo, 29, presos pelo crime, eram hóspedes, no centro da cidade.

Oliveira, que é deficiente físico e vive do dinheiro que ganha pedindo em semáforos, disse que tinha ido ao médico quando o adolescente foi torturado na pensão.

"Quando cheguei, o Maycon contou que tinha impedido o furto da minha bicicleta e mostrou o vídeo. Aquela imagem não sai da minha cabeça. Eu não consigo dormir nem comer. Minha vida parou", disse Oliveira.

Ele afirmou que, se estivesse na pensão, não permitiria que fizessem a tatuagem no adolescente. "O que fizeram não foi certo. Ele não iria muito longe com minha bicicleta porque todo mundo conhece ela. Queria encontrar com a família desse menino para falar que eu não tenho nada a ver com isso", afirmou. O adolescente nega que tenha tentado furtar a bike.

Segundo Oliveira, o tatuador contou que o rapaz aproveitou que a porta da pensão estava aberta para entrar no local. No momento, segundo o relato, só o tatuador e o pedreiro estavam no imóvel.

Oliveira usa a bicicleta para ir até semáforos pedir dinheiro. Ele disse que nunca tinha visto o adolescente. "Eu estou com medo de alguém querer se vingar em mim. Não consigo ir trabalhar. Nem sei como vou pagar minha pensão."

O dono da pensão, o comerciante Antônio Santos de Araújo, 54, disse que ficou surpreso com a atitude do tatuador. "Nunca imaginei que iria ter uma atitude como essa. Ele ficou na rua exibindo o vídeo e falando que ladrão tinha que ser tratado assim."

TATUAGEM

A Prefeitura de São Bernardo do Campo disse nesta segunda (12) que, em parceria com a Faculdade de Medicina do ABC, será disponibilizado todo o procedimento médico e cirúrgico para a remoção da tatuagem.

O prefeito da cidade, Orlando Morando (PSDB), entrou em contato com a mãe do adolescente para oferecer apoio da prefeitura.

Segundo o órgão municipal, a vítima fez tratamento no Caps (Centro de Atenção de Psicossocial) até setembro do ano passado. De acordo com os familiares, ele é usuário de drogas.

O tio do adolescente, Vando Aparecido Rocha, 33, disse que a família está feliz com todo apoio que estão recebendo. "Outra clínica também veio oferecer ajuda. Graças a Deus tem muita gente de bom coração", disse.

Segundo a polícia, o adolescente cometeu quatro atos infracionais, todos furtos, entre 2012 e 2017.

VAQUINHA

Duas contas foram abertas para arrecadar dinheiro na internet e ajudar os familiares do tatuador Maycon Wesley Carvalho dos Reis e do pedreiro Ronildo Moreira, presos suspeitos de torturar o adolescente, a pagar advogados e ajudar nas despesas de seus parentes. Eles foram transferidos nesta segunda para o CDP (Centro de Detenção Provisória) de São Bernardo do Campo.

As duas páginas já arrecadaram R$ 3.455 e tiveram 333 comentários. A maioria defendendo a atitude dos dois acusados. O tatuador e pedreiro estão sendo assistidos por defensores públicos. A reportagem não conseguiu contato com eles.

Também foi aberta vaquinha na internet para ajudar na remoção da tatuagem do adolescente –até nesta segunda, já tinha conseguido R$ 18 mil. Parte será entregue para o dono da bicicleta, prometem organizadores.

ACUSADO DE ROUBO

O pedreiro Ronildo Moreira de Araújo, 29, acusado de filmar a tortura ao jovem de 17 anos, foi preso em flagrante por roubo em 2008. No dia 22 de novembro daquele ano, ele roubou a bolsa de uma corretora de imóveis, segundo a polícia.

De acordo com o boletim de ocorrência, o pedreiro e um comparsa estavam em um carro quando abordaram a vítima, no Rio Pequeno (zona oeste). Após o roubo, a corretora de imóveis conseguiu anotar a placa do veículo e a dupla foi presa.


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