Folha de S. Paulo


Moradores da periferia de São Paulo embarcam na onda das bikes

Rivaldo Gomes/Folhapress
Morador do extremo leste, Paulo Saldanha, 30, pedala até o trabalho, em Pinheiros (zona oeste)

Pedalar 38 km até o serviço, gastar boa parte do salário em peças para a bicicleta ou viajar em duas rodas por aí, com apoio e segurança, são coisas que pessoas apaixonadas por bikes têm feito na periferia de São Paulo.

Não importa a distância até a região central da cidade, os paulistanos têm demonstrado no dia a dia carinho pelas "magrelas" de diversas formas, em meio à polêmica sobre a possível remoção de ciclovias distantes de bairros ricos.

O operador de logística Paulo Saldanha, 30, é um bom exemplo de quem introduziu a bike na vida e não a larga mais. Morador de Cidade Tiradentes (extremo da zona leste), ele vai de bicicleta para o serviço, em Pinheiros (zona oeste), ao menos duas vezes por semana. "Saio às 6h e entro no trabalho às 8h. São 38 km. Na volta, é bem relaxante vir pedalando até em casa", diz.

Segundo ele, tudo começou há cerca de quatro anos, quando voltou a pedalar. "No começo tinha uma bicicleta só para passear pelo bairro. Depois, fui aumentando as distâncias e comprei uma maior, aro 29."

Saldanha já foi entregador, usando bike, e acabou promovido na empresa. Segundo ele, ainda há muita diferença entre as ciclovias da região central e as da periferia, menos conservadas. "Você anda na da avenida Paulista e é um oásis. Na periferia, é um caos, precisa melhorar bastante", reclama.

Morador do Parque São Rafael, o ajudante-geral Geovane Gabriel Lemes Pinto, 21, pedala todo dia 15 km até o serviço, na Vila Ema, também na zona leste.

Apaixonado por bikes, ele tem duas. A preferida é uma modelo "speed", típica de corrida. Para deixar do jeito que gosta, chegou a gastar R$ 800 só nos trocadores de marchas. Com a bicicleta turbinada, vai rápido para o trabalho. "Levo meia hora e, se tivesse mais ciclovias, seria ainda mais prazeroso. De ônibus lotado é que eu não vou mesmo", diz.

As bicicletarias da periferia perceberam o aumento do interesse dos moradores pelas "magrelas". O investimento em peças e bicicletas modernas é grande, apesar da crise econômica e do aumento do desemprego.

O comerciante Jefferson Ortis da Costa, 39, é dono de uma bicicletaria em Sapopemba (zona leste) e vê no dia a dia pessoas interessadas em bikes de até R$ 4.000 que coloca à venda. "Já vi por aqui clientes com bicicletas de R$ 14 mil."

O bombeiro civil Willian Dantas, 32, morador da região e cliente de Costa, trocou de bike duas vezes em pouco mais de uma ano. A sua terceira bicicleta é uma aro 29 de cerca de R$ 1.800, com freio a disco, que usa para manter o físico. "Hoje, a bike é o meu hobby."

ZONA NORTE

Ciclistas que moram além das marginais Tietê e Pinheiros têm encontrado na estrada um jeito de fugir do trânsito carregado da capital e espairecer. São viagens em grupo que contam com carro de apoio, até cinco refeições por dia e, dependendo da distância, ônibus leito para o retorno à cidade.

Em abril, por exemplo, o grupo de ciclistas Pedal ZN organizou uma megapedalada até Aparecida (a 180 km da capital). Quem foi ao passeio contou com apoio mecânico, segurança e refeições ao longo das 12 horas de viagem.

"A popularização da bicicleta, que a gente vê no mundo inteiro, tem acontecido aqui também. A pessoa pode economizar no dia a dia com o transporte e investir na saúde", afirma o representante comercial Josimar Cavalcante, 51, um dos coordenadores do grupo, que tem uma página no Facebook com quase 11 mil seguidores.

Ao longo da semana, Cavalcante, conhecido como Old Gamma, também organiza os passeios ciclísticos pela capital. Há pedaladas para diversos níveis de preparo físico durante as noites paulistanas.

Para ele, é importante aperfeiçoar as ciclovias já existentes na cidade. "Não é uma bobagem, mas uma necessidade. Não tem como incentivar o ciclista sem oferecer um recurso", diz Cavalcante.

OUTRO LADO

Questionada sobre a possível remoção de ciclovias na periferia, a Secretaria Municipal de Mobilidade e Transportes, da gestão João Doria (PSDB), diz que iniciou plano de revitalização e revisão "com o objetivo de garantir a convivência, com segurança, entre bicicletas e os demais veículos em São Paulo".

Segundo a pasta, será organizado um debate com ciclistas, a comunidade local e representantes da prefeitura. "O resultado desse diálogo é o que definirá o projeto a ser adotado em cada ponto da cidade", afirmou em nota.

Em abril, Doria afirmou que ciclovias que atrapalham o comércio "deixarão de existir". "Na periferia há várias ciclovias que não têm ciclistas. E elas, na verdade, prejudicam o comércio varejista", disse na ocasião.


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