Folha de S. Paulo


Como Doria, João do Beco do Batman pinta muro, recua e libera novo grafite

Chello/FramePhoto/Folhapress
O aposentado João Batista da Silva pintou de cinza os grafites pintados em seu muro
O aposentado João Batista da Silva pintou os grafites em seu muro de cinza

"Jamais pensei que fosse dar essa repercussão. Mas, não me arrependo e não vou ficar sem o grafite. Gosto dele desde que não importune a gente", disse o aposentado João Batista da Silva, 70. Ele afirma que não proibiu grafites e que já falou com o artista Binho Ribeiro para que faça uma nova intervenção em sua parede.

O muro da discórdia integra a galeria de grafite a céu aberto –conhecida como Beco do Batman– na região da Vila Madalena, na zona oeste. Com a ajuda do filho, Silva pintou o muro de cinza chumbo para chamar a atenção dos problemas, como a falta de segurança, que os moradores do Beco sentem todos os dias.

"Aqui é um ponto turístico e é preciso que tenha ordem. Acho bonito o grafite, mas eles [os grafiteiros] devem respeitar o dono da casa. A casa é minha e ninguém tem nada a ver com isso. Não me arrependo. O muro é meu. Se pintasse de vermelho ia falar que era petista. Todo mundo tem direito de fazer o que quer em sua casa", desabafa o aposentado.

Beco do Batman sendo pintado

Logo depois de pintar o muro, Silva conta que ele foi pichado com dizeres, como "Existem coisas mais importantes que um muro cinza". "Minha família me ligou preocupada depois que viram algumas ameaças pela internet. Sou fã do grafite, mas não quero ser perturbado nem me sentir inseguro. Grafiteiro não tem direito adquirido sobre a minha parede."

A situação de Silva é semelhante ao que aconteceu com o prefeito de São Paulo, João Doria (PSDB), quando resolveu apagar os murais grafitados da avenida 23 de Maio, na zona sul de São Paulo. Na ocasião, o tucano preservou oito painéis, entre eles um de Eduardo Kobra. A cobertura dos desenhos por tinta cinza provocou protestos. No aniversário da cidade de São Paulo, houve vaias contra Doria e manifestantes o acusaram de fazer uma "política higienista".

Após sofrer uma série de críticas por pintar de cinza não só pichações, mas também grafites, João Doria criou o programa MAR (Museu de Arte de Rua), no qual o tucano pagará até R$ 40 mil a projetos de grafiteiros para áreas públicas da cidade –inicialmente, serão selecionados oito projetos que ocuparão diferentes regiões.

INSEGURANÇA

Silva diz que gosta de Doria, mas que sua ação não tem nada a ver com a política do prefeito. Ele diz que nunca falou que ia proibir grafite e que a escolha da cor cinza foi casual. Até me chamaram de Joãozinho Doria, mas foi coincidência [a cor da pintura]. Fui até a loja e o vendedor me indicou o cinza chumbo para apagar os grafites. O cinza do Doria é mais claro", diz o aposentado.

Auxiliar de enfermagem aposentado, Silva fala que o problema é a falta de respeito de alguns grafiteiros, a falta de segurança no Beco, além da falta de limpeza do lixo que se acumula no local todos os dias. "A prefeitura precisa arrumar a rua direito, fazer a limpeza pública, esvaziar o lixo e aumentar o policiamento no local", disse Silva.

Ele lembra ainda que foi colocado um poste de luz no local, que fica ligado a noite inteira, sem que fosse feito uma consulta aos moradores. "Essa luz fica acessa a noite inteira e isso atrapalha, além de atrair muita gente que passa noite falando alto e, às vezes, com o som ligado. É fácil falar [referindo-se às pessoas que o xingaram] quando não se mora aqui."

Silva disse que conversou pela manhã com o prefeito regional de Pinheiros, Paulo Mathias, sobre os problemas do Beco do Batman e que eles ficaram de marcar uma reunião nos próximos dias.

NOVO PAINEL

Depois de conversar com Silva, o artista de rua Binho Ribeiro afirmou que fará um novo painel na próxima quinta-feira (13), em colaboração com outros grafiteiros. Binho disse ainda que entende totalmente o aborrecimento dele. "Mesmo eu tendo perdido a minha obra, eu compreendi totalmente o aborrecimento dele e posso colaborar."

Binho diz que é importante pensar nos artistas, mas também é preciso pensar no espaço e nos moradores, principalmente dos que estão no meio do coração do Beco do Batman.

"Isso não me deixou triste. É uma causa importante e legítima. Quero fazer um painel que possa abordar essas melhorias e que possa garantir a durabilidade do próprio espaço porque se não pensar nas pessoas que moram ali, eles podem ser rebelar", disse o artista.


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