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Após quase 5 décadas, líder de ONG consegue seu Castelinho em São Paulo

Danilo Verpa/Folhapress
Maria Eulina Hilsenbeck, 66, fundadora da ONG que assumirá famoso Castelinho no centro de São Paulo
Maria Eulina Hilsenbeck, 66, fundadora da ONG que assumirá famoso Castelinho no centro de São Paulo

Maria Eulina Hilsenbeck tinha 19 anos quando chegou em São Paulo, vinda do Maranhão, na década de 70, com quase nenhum dinheiro e algumas joias, que serviram para pagar por uns poucos dias em um pensionato.

Sem conseguir um emprego, não teve outra escolha a não ser sobreviver pelas ruas do centro. Tinha medo da cidade e não conseguia dormir à noite, então caminhava a madrugada inteira e só descansava quando amanhecia.

Os raros momentos de sono durante a noite aconteciam quando o porteiro do famoso Castelinho na esquina da rua Apa com a avenida São João, em Campos Elíseos, região central da cidade, deixava a porta da guarita aberta quando ia tomar um café.

Era ali, dentro do Castelinho, que Maria Eulina se abrigava. "Eu falava com Deus, dizia que aquele prédio ia ser meu e eu faria uma obra social para atender as pessoas, como um compromisso meu com o universo", diz.

Danilo Verpa/Folhapress
O Castelinho da rua Apa, no centro de SP, será inaugurado nesta quinta-feira (6), após restauro
O Castelinho da rua Apa, no centro de SP, será inaugurado nesta quinta-feira (6), após restauro

Quase cinco décadas de tentativas depois, ela consegue realizar seu sonho. Nesta quinta-feira (6), o Castelinho é inaugurado como sede da ONG Clube de Mães do Brasil, que ela criou em 1993 para assistir pessoas em situações de vulnerabilidade social.

A inauguração começa às 10h, com apresentação de uma peça musical do Theatro São Pedro. O evento é aberto.

Os dois andares recém-restaurados vão abrigar oficinas profissionalizantes para todos os tipos de público. A cozinha industrial receberá alunos de escolas municipais, que vão aprender sobre alimentação saudável, além de um projeto que pretende ceder o espaço para que refugiados resgatem sua cultura por meio de comida e integração.

Aos 66 anos, finalmente Maria Eulina é dona de seu castelo.

CAMINHO

Quando conseguiu sair das ruas a jovem de 21 anos começou a realizar trabalhos sociais e fez seu primeiro pedido à União para obter a posse do imóvel. "Fui atendendo as necessidades das pessoas, fazendo o que eu podia em termos de políticas públicas, dando o meu máximo", conta.

À medida que Maria Eulina se recuperava ajudando quem precisava, o Castelinho se deteriorava.

O imóvel centenário, abandonado desde a trágica morte de seus donos originais (os dois irmãos Reis e a mãe foram encontrados mortos na casa, em 1937), passou por disputas de herança, ocupação por moradores de rua e chegou a ser feito de ferro velho.

A concessão só veio em 1997, seguida de um pedido de tombamento pelo Conpresp (órgão de preservação municipal) e do restauro do prédio. Todo o dinheiro necessário veio de recursos públicos conseguidos por Maria Eulina. A essa altura, a ONG já ocupava o prédio anexo e tocava seus trabalhos.

Vinte anos separam a concessão do imóvel para o projeto de Maria Eulina do evento desta quinta e nem o tempo foi suficiente para que ela começasse a acreditar que seus planos deram certo.

"A minha ficha não caiu ainda. É maior do que ganhar na loteria, vai além de qualquer coisa. Porque ele não é só meu, é nosso, da cidade, de todo mundo", afirma.

Ela comemora que a construção abandonada por tanto tempo vai ganhar vida como uma conquista da cidade. "Esse Castelinho nem vai precisar mais da Maria Eulina", ela diz. "Agora, todo mundo vai tomar conta".


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