Folha de S. Paulo


Justiça de SP absolve PMs acusados de empurrar jovem de telhado e matá-lo

Reprodução/TV Globo
PMs comemoram absolvição em caso de jovem morto com tiros após ser empurrado do telhado
PMs comemoram absolvição em caso de jovem morto com tiros após ser empurrado do telhado

Depois de dois dias de julgamento, a Justiça de São Paulo absolveu os três policiais militares acusados de empurrar Fernando Henrique da Silva, 23, e, depois, matá-lo, após um assalto na região do Butantã, na zona oeste da cidade, em 7 de setembro de 2015.

Os PMs Flavio Lapiana de Lima, Fabio Gambale da Silva e Samuel Paes foram absolvidos pelo 5º Tribunal do Júri na noite desta terça-feira (28) no Fórum Criminal da Barra Funda, na zona oeste de São Paulo. Os policiais, que estavam presos no presídio militar Romão Gomes, no Tremembé (zona norte), devem ser soltos nos próximos dias.

Os policiais eram acusados de homicídio triplamente qualificado e dois deles também de falsidade ideológica e fraude processual.

O promotor de acusação Rogério Leão Zagallo lamentou que seu assistente de acusação, o advogado Richard Bernardes Martins Silva, tenha pedido a absolvição de um dos réus durante a fase de debates, ocorrida nesta terça (28). Para o promotor, o advogado, que foi contratado pela família da vítima, atuou em favor dos réus.

"Essa absolvição tem que ser tributada ao advogado contratado pela família da vítima. Nunca vi um advogado da família da vítima, chamado tecnicamente de assistente de acusação, fazer a defesa e apologia da absolvição do réu. Isso enfraquece o discurso condenatório, que já era um discurso difícil pela ideia de que a gente estaria acusando policiais contra bandidos", disse o promotor.

A atuação do advogado, diz Zagallo, trouxe uma dificuldade a mais para o processo. "A sociedade, tão desassossegada com a questão da violência, vê na morte de uma pessoa como o Fernando, um inimigo. Até entendo essas pessoas. Mas isso se reflete no julgamento. E o policial militar é sim um herói para aqueles que tiraram de circulação os inimigos da sociedade".

O promotor de acusação afirmou que vai interpor recurso, buscando um novo julgamento. "Estou convicto e com a consciência tranquila de ter demonstrado que os acusados executaram [a vítima]. Não houve legítima defesa", disse Zagallo.

Em sua defesa, Richard Bernardes Martins Silva disse "estar com a consciência tranquila". "Tenho o maior respeito pelo promotor Rogério Leão Zagallo, mas não acredito nisso. Acho que é convicção. É muito difícil você chegar no plenário e atuar longe da sua convicção. Não é porque hoje sou assistente de acusação que vou mudar meus princípios, meu caráter e minha forma de atuar na advocacia. Hoje, após ver o vídeo 200 vezes, cheguei à conclusão de que o Samuel não teria intenção de matar. Ele simplesmente empurrou ou soltou a vítima, mas a decisão é soberana dos jurados e temos que respeitar", disse.

Silva confirmou ter sido contratado pela família e que a mãe da vítima, que acompanhou os debates no plenário do fórum, sabia que ele pediria a absolvição do policial. "Conversei com a dona Cleusa, expliquei para ela, e ela falou: 'Doutor, se o senhor tem essa convicção, sustente essa convicção'. Foi muito bem conversado com a dona Cleusa antes", disse.

Questionado por jornalistas se a decisão dos jurados o fez sair do fórum vitorioso ou derrotado, ele respondeu "um pouco triste". "A sentença tomou uma decisão e temos que respeitar", disse o advogado, que vai falar com a família para saber se ela pretende recorrer da sentença.

CASO

Imagens feitas por um cinegrafista amador mostram quando Fernando da Silva foi rendido por um policial no telhado de uma casa e, após levantar as mãos, foi dominado e empurrado pelo policial nos fundos do imóvel. Enquanto o policial desce do telhado é possível ouvir o barulho de ao menos dois tiros.

Veja vídeo

Na época, o policial Fábio Gambale da Silva relatou no boletim de ocorrência uma versão totalmente diferente do que as imagens mostram. Ele falou que entrou na casa, acompanhado de outro PM, após uma moradora avisar que um homem estava no local.

Gambale falou que eles foram surpreendidos pelo homem que pulou no quintal vindo de uma casa vizinha. Os policiais também disseram ao delegado que atiraram no suspeito porque ele reagiu à prisão.

Em depoimento prestado à Corregedoria da PM no dia 15 de setembro de 2015, o policial flagrado empurrando Fernando Henrique da Silva e seus colegas de corporação alegaram que o suspeito tentou lutar e, com isso, se desequilibrou. Eles afirmam que Silva tentou agredi-los e que acabou se desequilibrando sozinho "por não ter caminho para descer."

A Corregedoria da PM considerou a versão mentirosa, pelo fato de o vídeo gravado por um vizinho mostrar Silva sendo empurrado por um dos policiais em direção os fundos da casa, quando já estava algemado. A Corregedoria e a DHPP (Delegacia de Homicídios e Proteção à Pessoa) consideraram que os policiais mataram os jovens e tentaram forjar o tiroteio.

CONDENAÇÃO

A Justiça julgou nesse mesmo processo outros três PMs pela morte de Paulo Henrique Porto de Oliveira, 18, que teria participado com Fernando Henrique da Silva de uma tentativa de roubo a uma motocicleta no Butantã. As mortes jovens foram registradas por câmeras e mostram que as vítimas já estavam rendidas e desarmadas quando foram mortas pelos policiais.

Pela morte de Oliveira, a Justiça condenou o policial Tyson Oliveira Bastiane. Bastiane foi condenado a 12 anos, 5 meses e 17 dias de prisão, em regime fechado, por homicídio simples. Além disso, ele também cumprirá pena de 7 meses e 15 dias de detenção, em regime aberto, por fraude processual, além do pagamento de 35 dias-multa.

Já Silvano Clayton dos Reis foi absolvido da acusação de homicídio, mas condenado pelos crimes de falsidade ideológica e porte ilegal de arma a 4 anos, 11 meses e 17 dias de prisão no regime semiaberto. A juíza Giovana Christina Colares decidiu que o policial poderá recorrer em liberdade e expediu o alvará de soltura.

Reprodução/TV Globo
PMs durante julgamento no Fórum Criminal da Barra Funda, na zona oeste de São Paulo
PMs durante julgamento no Fórum Criminal da Barra Funda, na zona oeste de São Paulo

Segundo a denúncia, Bastiane foi o responsável por efetuar os tiros que matou o jovem de 18 anos. O advogado de Bastiane, que também representa o policial Reis, afirmou que irá recorrer da decisão sobre a condenação por homicídio.

"Reis foi absolvido da condenação de homicídio, e condenado nos demais crimes, exceto posse de arma, como havíamos sugerido. Por isso, nós vamos recorrer da decisão para que Bastiane também seja absolvido", afirmou Celso Vendramini.

O terceiro policial envolvido no caso, Silvio André Conceição, foi inocentado de todos os crimes. O julgamento dos policiais levou dois dias e ocorreu no Fórum Criminal da Barra Funda, na zona oeste.

Câmeras de segurança registraram quando Paulo Henrique Porto de Oliveira, que estava desarmado, se entregou aos policiais. Ele sentou no chão, ergueu os braços, foi imobilizado por um policial e algemado. Logo em seguida, os policiais retiraram as algemas e o levaram ao muro.

As imagens não mostram a morte de Oliveira. Depois dos tiros, um policial sem nada nas mãos foi até o carro da PM e, em seguida, esse mesmo policial apareceu com uma arma e voltou para onde estava o suspeito.

Veja vídeo


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