Folha de S. Paulo


Pontual e moderno, sistema de ônibus de Goiânia sofre com veículos velhos

Num painel com 24 TVs de 60 polegadas, pontinhos vermelhos, amarelos e verdes vão se movimentando num mapa da região metropolitana de Goiânia (GO), onde vivem 2,3 milhões de pessoas.

São quase mil pontinhos, a depender do horário. Verde significa que o ônibus passará no horário previsto; vermelho, que está mais de três minutos atrasado; amarelo, mais de dois adiantado. Ao todo, são 6.000 paradas no mapa.

Para motoristas apressados, uma mensagem é enviada para uma tela de 11 polegadas que fica sobre o volante do ônibus, informando que ele está adiantado.

"Nada é pior que passageiro chegar no ponto e o ônibus ter passado", diz Leomar Avelino, diretor do consórcio de empresas de ônibus da região metropolitana de Goiânia.

A preocupação de Leomar, que gerencia o sistema, é porque os 600 mil passageiros que o usam por dia podem ver, em um aplicativo gratuito para celular, em quantos minutos seu veículo chegará.

De cada quatro horários previstos de parada, três são cumpridos na cidade. São 18 milhões de horários/mês.

A precisão em alguns trechos é tal que Laura Silva, 23, vendedora, dispensa o aplicativo: "Passa sempre na hora, nem precisa gastar internet".

Desde 2008, a união de 18 prefeituras, do governo estadual e de seis empresas numa só organização levou para a Grande Goiânia uma tecnologia presente em cidades europeias e da América do Norte.

Os R$ 55 milhões investidos auxiliam para que a área seja a única do país a ter tarifa única para todas as linhas.

Sem subsídios, os R$ 3,70 pagos nas passagens financiam ainda a manutenção de 21 terminais, cujas baias têm telas de informação iguais às de metrôs, e gratuidade para um de cada três passageiros.

O que era para ser modelo, porém, funciona com ônibus ultrapassados, desconfortáveis e cheios, em geral parados em engarrafamentos.

O resultado é que 40% dos usuários da região avaliam o sistema como ruim ou péssimo, apesar da pontualidade.

Pior: empresas responsáveis pela operação começam a dar sinais de problemas financeiros. Uma das seis companhias está em recuperação judicial, repetindo situação que se espalha pelo país.

O software de planejamento de linhas, canadense, e o de gerenciamento de tráfego e informação ao público, vindo da Suécia, deveriam ajudar as empresas a terem maior produtividade pelo uso mais racional dos veículos.

Com a precisão do sistema é possível saber por quantos segundos um ônibus ficou com a porta aberta em cada parada. Se o tempo é maior que a média, há mais gente entrando e é necessário reduzir o intervalo entre os ônibus. Mudanças na programação são feitas semanalmente.

Mas a alta tecnologia pouco pode fazer diante da política nacional de priorização do transporte individual, com subsídios estatais à compra de veículos e combustível.

Obras de metrôs, VLTs e corredores exclusivos andam a passos lentos, e milhões de novos carros e motos tiram o espaço dos ônibus. Com isso, a velocidade dos veículos coletivos caiu na região de 19 km/h em média para 14 km/h nos últimos cinco anos.

Essa queda criou um círculo vicioso: aumento de custos (ônibus mais lentos consomem mais), necessidade de mais investimentos (é preciso mais veículos para cumprir o número de viagens) e passageiros que deixam de usar os coletivos (a região perdeu 25% dos usuários em cinco anos).

O valor da passagem já está num nível elevado para a renda dos brasileiros e, para distâncias curtas, é mais barato usar moto ou carro.

A atendente Gabriela Dourado estava em um ponto na área central da capital, numa manhã de quinta-feira, sem saber que ônibus pegar para o trabalho. Nem conhecia o aplicativo. "É que eu não uso mais ônibus. É mais barato vir de carro", diz ela, que faz um trajeto de dez quilômetros.

A esperança das empresas do setor é que a construção de corredores de ônibus eleve o número de pontos verdes na supertela e, com isso, pessoas como Gabriela voltem ao transporte público.


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